Se a poluição visual da Estátua da Liberdade é cafona, imagine aquela chaminé da termelétrica movida a carvão mineral lá na zona rural da cidade. A gente nem percebe, mas tem muita poluição no ar da Ilha do Amor
É muito proveitoso o debate sobre a instalação de uma réplica da Estátua da Liberdade prometida para São Luís na loja Havan, do empresário bolsonarista Luciano Hang.
A mobilização iniciada através de uma petição eletrônica contra o monumento ganhou a adesão de artistas, intelectuais e ativistas unidos no argumento de que a estátua é cafona e destoa das características arquitetônicas da cidade reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade.
Por outro lado, gerou uma forte reação do campo conservador identificado com o bolsonarismo, que vê a estátua e a Havan como símbolos do empreendedorismo, da geração de empregos e investimentos para São Luís.
Em síntese, a polêmica já é vitoriosa e serviu para demonstrar que é possível envolver diversos segmentos da população no debate sobre a cidade.
Nesta quarta-feira (22), às 11h, a Agência Tambor vai abordar a trágica situação dos moradores atingidos pela construção do Shopping da Ilha. Ali próximo tem um bairro, a Vila Cristalina, localizada entre o Maranhão Novo e o Vinhais.
As obras do shopping soterraram fontes riquíssimas de água doce na Vila Cristalina. E não foi só isso. As casas dos moradores sofreram rachaduras, foram invadidas pela lama e a maioria ficou sem aquilo que tinha em abundância – água!
Passados mais de 10 anos, nada de indenização para as pessoas que perderam parte do patrimônio.
Casos como esse pipocam toda semana em São Luís, uma cidade construída à base da violência do poder econômico massacrando os pobres.
Mas, a Vila Cristalina é só um detalhe sério. Mais grave é a revisão do Plano Diretor de São Luís, que vai mexer forte na legislação urbanística e pode transformar a cidade em um entreposto portuário e industrial.
Se a poluição visual da Estátua da Liberdade é cafona, imagine aquela chaminé da termelétrica movida a carvão mineral lá na zona rural da cidade. A gente nem percebe, mas tem muita poluição no ar da Ilha do Amor.
Algumas tentativas já foram realizadas para mudar na marra o Plano Diretor. E uma nova iniciativa já está por vir na Câmara Municipal. Seria uma ótima oportunidade para gerar um grande debate sobre a cidade que temos e o futuro de São Luís.
Que o embate da Estátua da Liberdade inspire novas batalhas.
Foto destacada / Claudio Castro / chaminé da Usina Termelétrica Itaqui, na zona rural de São Luís
Nascido na Vila Passos, região central de São Luís, com longa permanência também no bairro do Monte Castelo, o tradicional Boi de Pindaré, de sotaque da Baixada, com sede hoje no Bairro de Fátima, é o novo homenageado pelo Projeto “Amo, Poeta e Cantador: Murais da Memória pelo Maranhão”.
O amo, cantador e compositor João Câncio dos Santos, que fundou a brincadeira em 15 de maio de 1960, é a figura de destaque desse mais novo e grande mural, que será confeccionado pelo artista plástico e grafitteiro Gil Leros.
A imagem do mestre João Câncio será grafittada no muro da sede do Boi, no Bairro de Fátima, às margens da Avenida dos Africanos, que liga a Avenida dos Franceses à Avenida Senador Vitorino Freire, no bairro da Areinha.
Berço de outros tantos mestres do Bumba meu Boi do Maranhão, como ‘Coxinho’ e ‘Zé Olhinho’, o Boi de Pindaré conta atualmente com 85 brincantes, com destaque especial para as dezenas de crianças que abrilhantam as apresentações anuais da brincadeira – descendentes, filhos, netos e bisnetos, dos fundadores e brincantes mais antigos.
Segundo a atual presidente do Boi de Pindaré, Benedita Arouche, mais conhecida como ‘Dona Bita’ no meio cultural de São Luís, há brincantes, inclusive, da chamada primeira infância, que vai até os cinco anos. “Procuramos manter vivas as nossas tradições religiosas e culturais, e, nesse sentido, a família toda acaba se envolvendo. Temos crianças de até três anos dançando no Boi”, conta Dona Bita.
A escolha do Boi de Pindaré para ser homenageado pelo Projeto “Amo, Poeta e Cantador” chegou, segundo a presidente da brincadeira, como um presente para toda a diretoria e brincantes: ‘num momento tão difícil de pandemia e, já por dois anos consecutivos, sem os tradicionais e oficiais festejos de Bumba Boi nos meses de junho e julho’. Ela afirma que não tem sido fácil manter a brincadeira, que também realiza várias obras sociais, com tão poucos recursos e doações. “Nesse cenário, ficamos muito felizes e honrados com a escolha do Boi de Pindaré, selecionado entre tantos outros ‘Bumba Bois’ de sotaque da Baixada e até mesmo dos outros sotaques. O meu muito obrigada a todos do projeto”, disse Dona Bita.
A construção de uma loja da Havan, do empresário bolsonarista Luciano Hang, está causando polêmica em São Luís, capital do Maranhão.
Desde a semana passada uma petição eletrônica circula nas redes sociais repudiando a instalação da réplica da Estátua da Liberdade, uma das marcas arquitetônicas da Havan – junção das sílabas iniciais dos nomes dos dois sócios-fundadores da empresa: Luciano Hang e Vanderlei de Limas.
O texto intitulado “Impeça Luciano Hang de agredir capital maranhense com réplica da Estátua da Liberdade” começa questionando a estranheza do monumento frente aos traços culturais de São Luís e carimba a escultura de “cafonice”.
“A quem interessa a instalação de uma réplica da Estátua da Liberdade, de 35 metros de altura, em São Luís, cidade que tanto se orgulha de suas tradições culturais, de seu conjunto arquitetônico, de suas raízes históricas e de sua gente? Sem que a população da capital maranhense tenha sido consultada a respeito, a loja de varejo Havan, do empresário Luciano Hang, está erguendo esse monumento à cafonice, ao mau gosto, em plena avenida que leva o nome de Daniel de La Touche, o navegador que deu por inaugurada a França Equinocial no Brasil, em 1612.”, diz a petição.
São Luís é Patrimônio Cultural Mundial, título concedido pela Unesco, em 1997, “por aportar o testemunho de uma tradição cultural rica e diversificada, além de constituir um excepcional exemplo de cidade colonial portuguesa, com traçado preservado e conjunto arquitetônico representativo. Por se tratar de uma cidade histórica viva, pela sua própria natureza de capital, São Luís se expandiu, preservando a malha urbana do século XVII e seu conjunto arquitetônico original. Em toda a cidade, são cerca de quatro mil imóveis tombados: solares, sobrados, casas térreas e edificações com até quatro pavimentos”, segundo o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
A cidade também é conhecida por denominações informais criadas pelo gosto popular, tais como Ilha do Amor, Cidade dos Azulejos e Jamaica Brasileira.
Em outro trecho, a petição contra a Estátua da Liberdade cobra um posicionamento austero do Iphan sobre a implantação do monumento em uma cidade histórica:
“Alguém consegue imaginar uma Estátua da Liberdade em Olinda, Ouro Preto ou Diamantina? Não dá. A exemplo de São Luís, são cidades tombadas pela Unesco como Patrimônio da Humanidade. Em qualquer um desses sítios urbanos, instituições como o Iphan reagiriam com rigor”, enfatiza o texto.
Até o momento dessa postagem já havia 937 assinaturas na plataforma Avaaz. São Luís supera 1 milhão de habitantes (1.014.837), de acordo com o IBGE.
Luciano Hang é um dos mais caricatos entre os bolsonaristas. Costuma vestir roupas nas cores verde e amarela e fazer declarações grotescas em defesa do presidente Jair Bolsonaro.
Mas, ele não é só engraçado. Contra Luciano Hang pesam denúncias de enriquecimento ilícito, fruto de tenebrosas transações financeiras.
Diversas reportagens facilmente acessadas na web fazem referência aos indícios de corrupção no patrimônio do empresário, codinominado “Véio da Havan”. Veja no Correio Braziliense, Congresso em Foco, Uol e até mesmo na revista Veja.
A fortuna da rede estende seus tentáculos ao futebol. A marca Havan aparece em camisas de times de várias divisões, como Flamento (série A), Vasco (série B), Athletico Paranaense, Chapecoense, Brusque e Cascavel.
Na última sexta-feira, 9 de julho, o Núcleo Maranhão da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde – Renafro por meio de Mãe Nonata d’Oxum e Pai Paulo de Aruanda, respectivamente coordenador@s do Fórum de Mulheres de Axé e do Fórum de Homens de Axé do Maranhão visitaram o terreiro de Pai Lindomar, localizado no bairro do Anjo da Guarda, São Luís, Maranhão.
Após cerca de 2 meses de ataques em que a casa vem tendo seu telhado apedrejado, na manhã do último dia 8 houve uma invasão, com depredação de imagens e tentativa de incêndio de objetos de culto. A Renafro Maranhão vem prestando solidariedade ao sacerdote, além de cobrar providências por parte do poder público para apurar os vários casos recentes de racismo religioso ocorridos na região.
No dia 13 de junho, houve uma invasão da área do terreiro do pai João da Vila Nova, com a realização de um culto evangélico sem autorização. Esse caso vem passando por uma campanha caluniosa por parte da deputada estadual Mical Damasceno, que vem acusando a vítima de ser agressor, afirmando que ele ao defender seu direito de liberdade de culto estaria “com o demônio agredindo e ameaçando os irmãos da Assembleia de Deus”.
Racismo é crime definido por lei, e a Renafro estará vigilante no acompanhamento destes e dos demais casos de ataques aos espaços e aos integrantes das religiões de matriz africana que forem denunciados.
Exigimos o cumprimento das medidas judiciais cabíveis nesta situação, com o poder público venha cumprir seu papel:
. Imediata apuração deste e dos demais casos recentes de violações de direitos dos povos de matriz africana;
. Implantação do Protocolo de Atendimento dos Povos de Matriz Africana, apresentado ao governo do estado em 2018, coma integralidade das medidas que estão lá;
. Ingressar com medida judicial de reparação por parte do estado em razão do patrimônio violado (indenização por parte do estado);
. A partir do protocolo implantar a Patrulha Negro Cosme de fato e seja ela a atender as situações de emergência nos territórios dos povos de matriz africana.
Pai Paulo de Aruanda, Coordenador Estadual da Renafro – Maranhão
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o Instituto Alok e a Fundação Josué Montello, entrega hoje a primeira Estação de Lavagem de Mãos instalada em terreiros no Maranhão. Será no Terreiro Nossa Senhora da Vitória, de Mãe Nonata, no Cajupe. As estações fazem parte do programa nacional do Unicef de prevenção e resposta humanitária à pandemia da covid-19, promovendo a proteção de crianças e adolescentes, especialmente as mais vulneráveis.
Mãe Nonata é coordenadora da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileira e Saúde e seu Terreiro forma parceira com o Unicef há cerca de dois anos, através do projeto Empoderamento de Meninas, que tem trabalhado com meninas adolescentes e jovens da comunidade para fortalecer sua autoestima e autoconsciência. “Esta parceria só vem para agregar um esforço coletivo e preventivo de combate à Covid-19, fazendo com que crianças e jovens se sintam, valorizados e assistidos por meio destas ações. Que projetos como esse possam se tornar corriqueiros em nossos terreiros e comunidades menos assistidos do nosso estado, valorizando assim a comunidade de matriz africana”, enfatizou a mãe de santo Nonata.
Na continuidade da parceria, as estações de lavagem de mãos representam estratégias de sensibilização e mobilização de lideranças para o enfrentamento da pandemia e seus efeitos diretos e indiretos. O programa de implantação das estações começou no Maranhão no início de 2021 e entregará cerca de 75 estações. A primeira delas em terreiros teve início em junho, junto com a Fundação Josué Montello e o Instituto Alok. Outras estações similares também serão instaladas em escolas e comunidades quilombolas em Alcântara.
“Temos a satisfação de entregar a primeira estação de lavagem de mãos em um terreiro de São Luís, em parceria com Mãe Nonata e as lideranças da comunidade. O Unicef tem se articulado com os diferentes agentes mobilizadores para dar respostas humanitárias à pandemia. Esse é parte de nosso compromisso na garantia e na defesa de todo o respeito aos direitos de crianças e adolescentes afrodescendentes”, reforçou a chefe do escritório do Unicef em São Luís, Ofélia Silva.
No total, o programa do Unicef de apoio à resposta humanitária à covid19 implantará as 75 estações de lavagem de mãos desta fase, em São Luís e no município de Alcântara, nas escolas municipais e nas áreas de uso comum de comunidades quilombolas, numa parceria local com as Secretarias Municipais de Educação de São Luís e de Alcântara, Cesjo e Fundação Josué Montello.
“A parceria da Fundação junto com o Unicef vem de longas datas e é motivo de honra participar da grandeza desse projeto. Lavar as mãos se tornou uma ação fundamental na luta contra a Covid-19 e ajudar a tornar esse comportamento uma prática é muito importante para nós. Estamos deixando uma marca construída entre o Unicef e a Fundação e isso nos deixa muito felizes”, comemorou a Presidente da Fundação Josué Montello, Maria de Jesus Jorge Torres.
Atividades formativas com jovens líderes, rodas de conversa nas comunidades, debates sobre saúde e higiene menstrual, entrega de material educativo e kits de higiene para famílias prioritárias serão realizadas para fortalecer as práticas de autocuidado nas comunidades.
Na entrega da estação do Terreiro da Mãe Nonata, na manhã deste sábado, será realizada oficina de Saúde Menstrual e uma celebração à Oxum, a Senhora das Águas, pelas Mães de Santo do Terreiro.
Materiais da arquitetura portuguesa aplicados nas ruas, praças e em parte das edificações do Centro Histórico de São Luís têm referência na vigência da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e do Maranhão, na gestão do Marquês de Pombal, nos fins século XVIII e início do XIX.
Baseada em farta mão de obra escrava, a elite portuguesa concentrava dinheiro e poder. A pujança dos negócios favorecia a adaptação de São Luís a alguns parâmetros da arquitetura de Lisboa. Na época, a capital lusitana estava sendo reconstruída após ser devastada por um terremoto, em 1775.
A elite lusitana, formada por latifundiários e comerciantes instalados em São Luís, adaptava alguns padrões de construção de Lisboa para a capital maranhense. Entre os materiais utilizados na arquitetura estavam as pedras de cantaria, que vinham de Portugal transportadas nos lastros dos navios.
No artigo “São Luís: uma urbstranscolonial”(publicado no livro “São Luís 400 anos: (con)tradições de uma cidade histórica”, o pesquisador Josenildo de Jesus Pereira contextualiza o uso das pedras de cantaria nas adequações do espaço urbano de uma cidade marcada pela cultura escravocrata.
Entre as mudanças ocorridas na Província no início e meados do século XIX, Josenildo Pereira aponta: a acentuada presença inglesa; a independência política; o lento processo de interiorização da Metrópole; a abdicação do Imperador; as reformas políticas na Corte do Rio de Janeiro; as lutas sociais no campo, como a Balaiada; as fugas de escravos e os quilombos.
Nas páginas 136 e 137, escreve Josenildo Pereira:
“Dada a maior presença do poder público no cotidiano da cidade, o seu perfil urbano foi sendo modificado por meio de pressões de uma série de posturas. Os passeios públicos em geral passaram a ser calçados com pedras de cantaria vindas de Portugal como lastro dos navios. Essas pedras eram lavradas em blocos retangulares de aproximadamente 80cm de comprimento por 50cm de largura. Com o tempo e o passar contínuo dos transeuntes, ficavam lisas, polidas, escorregadias. Por essa razão foi aprovada a Lei de nº 08, que em seu artigo 220, determinava que:
Os proprietários que tiverem os passeios de suas casas calçadas com pedras de cantaria são obrigados a picá-las de três em três anos, nos meses de dezembro e janeiro sob pena de multa de 20$ reis e de ser feito esse trabalho pela Intendência por conta do Infrator.
Advertimos, entretanto, que todo esse esmero para com a cidade realizava-se, em grande parte, graças ao trabalho de escravos e, também, aos recursos econômicos advindos da agroexportação pautada, sobretudo, na cultura algodão, ao comércio importador e exortador de suas casas comerciais, dinamizadas com a presença inglesa.
Foi nesse meio urbano da cidade de São Luís, particularmente, na área demarcada pelas Praias Grande e do Desterro e Fonte do Ribeirão, lugares onde eram praticadas as atividades financeiras, comerciais, portuárias e onde vivia parte da elite econômica em seus sobrados e casarões, que a escravidão urbana se desenvolve. E, desse modo, os trabalhadores escravos ficaram envolvidos em uma rede de várias atividades: ofícios, comércio e serviços domésticos.”
Fonte de pesquisa
São Luís 400 anos: (con)tradições de uma cidade histórica. Organizadores: Alan Kardec Gomes Pacheco Filho, Helidacy Maria Muniz Corrêa, Josenildo de Jesus Pereira. São Luís: Café & Lápis; Ed. UEMA, 2014. 341p.
Imagem destacada / calçadas na rua Portugal, Centro Histórico de São Luís / capturada aqui
O calor excessivo nas duas últimas semanas em São Luís tem uma explicação científica do Núcleo de Meteorologia da Universidade Estadual do Maranhão (Uema). Trata-se de um fenômeno denominado veranico, caracterizado por um período de estiagem dentro da estação chuvosa, quando ocorre alta incidência de radiação solar e pouca nebulosidade.
Embora o calor exagerado decorrente do veranico tenha fundamento na Meteorologia, as temperaturas elevadas em São Luís são perceptíveis em outras épocas do ano.
Nesse contexto, é importante observar as mudanças projetadas na legislação urbanística. Recentemente o vereador Astro de Ogum (PCdoB) anunciou que vai retomar o processo de revisão do Plano Diretor de São Luís.
O núcleo duro da proposta, concebida nos dois mandatos do prefeito Edivaldo Holanda Junior (2012-2020), é converter a cidade em um formato portuário e industrial. Para alcançar esse objetivo uma das metas visa eliminar 40% da zona rural de São Luís.
As consequências imediatas da redução desse território serão a eliminação da cobertura vegetal, redução da área de absorção das águas das chuvas e deslocamento dos moradores para outros bairros.
Toda a ilha de São Luís será afetada por essas mudanças, que terão impacto no fornecimento de água potável e nas temperaturas: menos vegetação, mais calor e diminuição das áreas de recarga de aquíferos.
O sítio Santa Eulália e as dunas também podem ser afetados. “Dentre as principais alterações propostas estão a redução de 8.643 hectares na zona rural do município, que passaria de 20.820 hectares para 12.177 hectares, a redução de 11,5 hectares da área de dunas, a diminuição das áreas de recarga de aquíferos e a redução parcial da área protegida no Sítio Santa Eulália”, pontua o advogado Guilherme Zagallo, em artigo publicado neste blog.
A revisão se arrasta desde 2016 e foi adiada por força da mobilização dos movimentos sociais que demandaram o Ministério Público, a Câmara dos Vereadores e a Prefeitura de São Luís para incluir na alteração da legislação urbanística alguns componentes fundamentais – a participação da população nas audiências públicas, ampla divulgação e transparência nas etapas.
Vamos aguardar e conferir a nova tentativa de mudar a legislação urbanística de São Luís.
Se você perdeu, ainda pode ouvir na rádio Senado uma entrevista antológica do compositor Fausto Nilo, autor de letras clássicas da Música Popular Brasileira (MPB), celebrizadas por diversos intérpretes em versos cravados na nossa memória fonográfica (veja abaixo):
Três meninas do Brasil, três corações democratas / Tem moderna arquitetura ou simpatia mulata”
Fausto Nilo é um dos nomes marcantes do movimento cultural denominado “O pessoal do Ceará”, formado por Ednardo, Amelinha, Belchior, Fagner e outros artistas e intelectuais emergentes a partir da década de 1960 na cena musical nacional.
Fortaleza 2040
Em plena atividade, Nilo tem na bagagem mais de 300 músicas compostas em quatro décadas de carreira e comemora seus sucessos tocados diariamente nas emissoras de rádio de todo o Brasil, além das exibições nos meios digitais.
Além de compositor, ele é arquiteto e participa ativamente do “Planejamento Estratégico e Participativo Fortaleza 2040”, lançado em 2014, reunindo setores representativos da capital cearense para pensar o futuro da cidade.
Fausto Nilo é um dos principais difusores do “Fortaleza 2040”, juntamente com outros artistas, profissionais de urbanismo, setores público e privado, intelectuais, grupos organizados dos mais variados segmentos e os parlamentos estadual e municipal.
A ideia geral é integrar o crescimento econômico aos patamares civilizatórios do planejamento urbano, que passa necessariamente pela qualidade de vida dos moradores da cidade.
O projeto é desenvolvido através de convênio entre a Prefeitura de Fortaleza e a Universidade Federal do Ceará (UFC), sob a coordenação da Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura da UFC e acompanhado pelo Conselho da Cidade. A proposta vai incorporar iniciativas já elaboradas, como o Plano Diretor Participativo do Município de Fortaleza (PDPFor), Planefor e o Pacto de Fortaleza.
Na entrevista à rádio Senado, Fausto Nilo falou com entusiasmo da sua condição de cidadão, urbanista e artista integrado a um projeto fundamental para planejar Fortaleza menos desumana até 2040. Ele, na condição de ícone musical, é um dos promotores e incentivadores do sonho de outra cidade, no rol de outros tantos artistas, urbanistas e intelectuais fortalezenses.
O Ceará é fruto de uma cultura política autoritária, igual ao Maranhão, mas existem diferenças abissais entre os dois estados.
Olhando para nossa “vizinha” Fortaleza planejando o futuro, fico aqui pensando no enorme atraso político e cultural de São Luís, uma cidade provinciana e retrógrada que passou os últimos 30 anos sob domínio do mesmo grupo político e não conseguiu sequer colocar asfalto decente nas principais avenidas da cidade.
E o mais grave: São Luís transformou o Plano Diretor em um objeto de lobby dos empresários da construção civil e do setor industrial, sem a participação da população.
A entrevista de Fausto Nilo, além de ser uma antologia da MPB, é uma referência para comparar o enorme atraso de São Luís em relação às outras capitais do Nordeste.
Enquanto Fortaleza planeja para daqui a duas décadas, a nossa velha cultura política provinciana ludovicense está a eleger prefeitos em campanhas marcadas por inauguração de praças, operações tapa-buracos, capina de matagal e pintura de meios-fios.
Vivemos mesmo no fim do mundo.
Imagem destacada: Fausto Nilo posa ao lado de gramofone / Imagem capturada no site da rádio Senado
O bairro do Apeadouro, um dos mais tradicionais de São Luís, perdeu hoje o aposentado José Braga Cantanhede, o popular “Caju” ou “Seu Braga”, aos 87 anos de idade.
Morador da rua Sousândade, era um assíduo leitor de jornal impresso e ouvinte de rádio AM, flamenguista roxo e torcedor do Maranhão Atlético Clube, o MAC, em São Luís.
“Seu Braga” trabalhou durante muito tempo na Oleama (Oleaginosas Maranhense SA). Deixa filhos, esposa, netos e uma saudade imensa.
Um dos seus assuntos prediletos era a política. Antes da pandemia, foi entrevistado pelo repórter Thiago Bastos, do jornal O Estado do Maranhão, para a produção de uma das suas belas reportagens especiais sobre memórias de São Luís.
A família Braga é muito querida no Apeadouro, território afetivo de São Luís, visitado em 2020 para uma das produções do teatro multimídia “Pão com Ovo”. Durante o bate-papo com os moradores, os artistas conheceram “Seu Braga” ou “Caju” e o primogênito José Braga Cantanhede Filho, o também popular “Braga” ou “Braguinha”.
A pandemia covid19 já fez várias vítimas no bairro. No primeiro semestre do ano passado faleceram, na mesma rua Sousândrade, o querido casal Norberto Guimarães (89 anos) e Maria da Conceição Ferreira Guimarães (89 anos), muito conhecidos, respectivamente, como ‘O Bala” e “Dona Cocota”, moradores lendários que deixam filhos e netos com raízes no Apeadouro.
Perdemos também Terezinha de Jesus Coutinho, aos 82 anos, uma das moradoras igualmente querida e antiga, ainda com familiares morando na mesma rua.
Todos os óbitos mencionados acima foram por covid19 de moradores da mesma rua Sousândrade.
Em janeiro de 2020 foi a óbito a minha mãe, Terezinha Ferreira Araújo, aos 89 anos. Ela não foi vítima de covid19, mas era uma das residentes mais antigas do bairro, na famosa Sousândade, juntamente com meu pai, Raimundo Nonato Araújo, falecido em 2002.
Em outras vias do bairro tivemos perdas muito sentidas. Nas ruas Astolfo Marques e Manoel da Nóbrega perdemos “Zé do Bar”, proprietário de um dos botecos mais frequentados no bairro e ainda hoje em funcionamento.
A pandemia covid19 tem sido devastadora no Apeadouro, ficando nas nossas lembranças os bons tempos da convivência que atravessaram a infância, juventude, maturidade e as atualidades tristes.
Vamos rezar pelos entes queridos perdidos e pedir mais proteção, saúde e esperança de reencontro para que possamos nos encontrar quando tudo isso passar.
Imagem destacada: turma do Apeadouro na porta da antiga quitanda do Bala. Na sequência da esquerda para a direita: Bala, Eduardo, Maria, Cocota, Neilma, Ernildo, Solange, dona Silvia, Apolo e Lady Laura. Ao fundo: Benigno, Gugu, Guimarães e Danilo.
Pouco tempo antes do estouro da pandemia covid19, em uma roda informal de conversa entre jornalistas e professores universitários, um atento observador da cena política local soltou esta frase emblemática: “quer saber como se movimentam os políticos do Maranhão(?), basta olhar as fotos no PH”.
A sentença foi dita no contexto das alianças e desavenças comuns à maioria dos partidos políticos turbinados pelo pragmatismo eleitoral, selando acordos e conchavos entre legendas supostamente divergentes.
O autor da “tese” remetia às páginas coloridas da maior expressão do colunismo social – Pergentino Holanda – cujas iniciais “PH” passaram a ser uma grife para designar “o poder” no Maranhão.
Embora aparentem intrigas nos palcos eleitorais, às vezes trocando acusações com adjetivos do futebol de várzea, as lideranças políticas tradicionais sempre aparecem sorridentes nos banquetes do PH, retratados nas páginas esparramadas em elogios mútuos traduzidos nas legendas das fotografias.
Os cientistas políticos deviam atentar para certos lances ainda presentes no caderno dominical mais glamuroso do jornal de José Sarney (O Estado do Maranhão), onde quase todos os gatos são pardos: políticos, empreiteiros, desembargadores, juízes, promotores, lobistas, socialites, profissionais liberais e negociantes em geral.
Para além disso, a coluna e o caderno especial do PH são recheados de textos literários valorosos e informações preciosas conectadas ao mundo real sobre os três poderes no Maranhão.
Já o povo, movido pelas paixões, nem sempre capta que as supostas disputas ferrenhas travadas no palco eleitoral dizem quase nada sobre divergências de fundo entre as elites que dominam os cofres no Maranhão em um frenético modelo clientelista desde os tempos de Benedito Leite.
Mas, algumas coisas mudam e outras desaparecem. O colunismo social, no formato impresso, está prestes a entrar para o obituário da comunicação. As versões digitais dos jornais não cumprem a mesma função mercadológica, política e estética do produto impresso para efeito do glamour.
Os famosos, nome novo para designar socialites ou emergentes, têm a sua própria coluna social (perfil) nas redes digitais. Um(a) influencer, sem derrubar um pé de eucalipto, vale mais que a tiragem de muitos jornais de papel somados.
Houve mudança não só na forma – do impresso para o digital – mas também no conteúdo e na visibilidade dos(as) atores(as).
Colunismo social era uma seção de jornal até então pertinente aos endinheirados e/ou vinculada aos círculos do poder formal. Com o advento das plataformas digitais, surgiram novas iniciativas com enfoques diferenciados remodelando o conceito de visibilidade na comunicação outrora associado apenas aos ricos.
No Maranhão cabe mencionar duas ações promissoras, não exatamente conexas à perspectiva de colunismo social como forma de glamourização do chamado poder oficial.
Refiro-me à ideia genérica de colunismo social para situar dois experimentos de Jornalismo fora da mídia de mercado, mas bem posicionadas no ambiente digital: o site Agenda Maranhão e a Agência Tambor.
Cada qual com a sua especificidade, eles põem para desfilar no palco do espaço público atores(as) sociais geralmente silenciados ou esquecidos no agendamento midiático.
Navegando no campo da comunicação alternativa, a Agência Tambor produz diariamente um jornal transmitido na web e protagonizado por fontes autorizadas geralmente excluídas dos critérios de noticiabilidade da maioria dos meios de comunicação.
Pelas redes sociais da Agência Tambor fluem a comunidade GLBTTI, quilombolas, quebradeiras de coco, indígenas, artistas e militantes dos movimentos sociais, gente das periferias, fazedores(as) de cultura, educadores(as), agitadores e agitadoras de muitas causas nobres, entre tantas outras personagens.
O “colunismo social” da mídia alternativa está materializado nos famosos cards que apresentam a fonte entrevistada do dia, fartamente distribuídos nas redes sociais. Quem não era visto nem lembrado nas grandes empresas de comunicação tem agora um tambor para tocar.
A panfletagem eletrônica dos cards da Agência Tambor, guardadas as devidas proporções, tem aproximações com um novo tipo de colunismo social, embora a força conceitual expressiva seja o Jornalismo.
Já no site Agenda Maranhão a personagem principal é o Centro Histórico de São Luís, dando visibilidade a um território da cidade com as suas personagens, arquitetura, fazeres e saberes. Trata-se de um site especializado em Jornalismo Cultural outrora marcante no impresso.
O teórico dos Estudos Culturais latino-americanos Martín-Barbero tem um ensinamento precioso sobre a relação entre a produção e o consumo de bens culturais que pode ser aplicado às duas experiências mencionadas: a fruição das audiências.
As entrevistas da Agência Tambor, feitas ao vivo, são posteriormente transformadas em podcast para ouvir a qualquer tempo, arquivadas em plataformas digitais. Esse sentido da memória está presente de outra forma no site Agenda Maranhão, em um percurso às vezes inverso, quando atualiza imagens antigas meticulosamente estudadas na perspectiva da História da Fotografia.
Assim são os arquivos. Servem para guardar e revelar, estando sempre vivos como pulsação de memória.
Os usos da tecnologia mobilizam sentidos e gerações distintas nas apropriações feitas por uma rádio web (Agência Tambor) e um site (Agenda Maranhão), este com expertise em imagens analógicas – fotos antigas – atualizadas no contemporâneo.
Através da memória, as publicações vão reconstituindo a cidade velha conectada às mudanças atuais do tecido urbano. Misto de Jornalismo e entretenimento, o site Agenda Maranhão conecta o seu público ao passado saudoso da São Luís que não existe mais, a não ser na lembrança atualizada pelas fotografias puxadas no tempo.
O Jornalismo Cultural do Agenda Maranhão abraça com sensibilidade as cenas da cidade: pessoas comuns, casarões, sobrados, ruas, becos, situações cotidianas, traços provincianos e universais do território Centro Histórico.
Cada qual a seu modo, as duas experiências reúnem as suas audiências mobilizadas na prática cultural do consumo (Martín-Barbero). Na pegada política do tambor rufando a tônica é o conflito, sem perder a ternura das pautas afetivas. Agenda Maranhão, por sua vez, mexe com os sentidos do seu público envolvido nos detalhes preciosos das fotos garimpadas no passado.
Vale sempre lembrar aquela alegoria da fênix associada ao Jornalismo. Segundo a mitologia egípcia, era uma ave que durava muitos séculos e, queimada, renascia das próprias cinzas.
Como forma de conhecimento da realidade, o Jornalismo costura os acontecimentos na linha do tempo. O que é notícia hoje, amanhã é História; e os fatos históricos, atualizados, são notícias contemporâneas.
Agenda Maranhão e Agência Tambor são palcos eletrônicos onde as pessoas se encontram. Está em curso um novo tipo de glamour, protagonizado por gente pobre e cidade velha pautados por memória, História e política.