Dos 31 vereadores de São Luís, apenas 14 chegaram a participar ou marcaram presença nas seis audiências públicas convocadas pela própria Câmara Municipal para debater a proposta de revisão do Plano Diretor.
Compareceram até agora Honorato Fernandes, Pavão Filho, Umbelino Junior, Bárbara Soeiro, Marcial Lima, Cezar Bombeiro, Concita Pinto, Osmar Filho, Edson Gaguinho, Dr Gutemberg, Estevão Assunção, Sá Marques, Genival Alves e Raimundo Penha.
A presença dos vereadores nas audiências varia e chega a ser esporádica em alguns casos; ou seja, alguns parlamentares compareceram eventualmente.
Infelizmente ignorada pela maioria da Câmara Municipal, a revisão de uma parte da legislação urbanística vai mexer na vida de todos os moradores, independente do bairro.
A temperatura e o clima da cidade, os níveis de violência, a qualidade do ar, a mobilidade, a oferta de alimentos sem veneno, o fornecimento de água potável, a agricultura familiar como fonte de renda e sobrevivência, a pesca e o extrativismo, o turismo e tantos outros componentes da vida cotidiana serão direta ou indiretamente afetados pela decisão dos vereadores sobre a proposta da Prefeitura de São Luís para a revisão do Plano Diretor.
Entre os recortes mais graves da proposta está a redução de 41% da zona rural, com o objetivo de atender aos interesses do mercado de terras para a especulação imobiliária, investimentos portuários, mínero-metalúrgicos e a ampliação da planta industrial da cidade.
Os impactos
serão sentidos a médio e longo prazo. É certo que a temperatura de São Luís vai
aumentar e teremos poluição em níveis ainda mais drásticos que os atuais.
Outras consequências mais violentas virão depois.
A zona rural
funciona como um cinturão de proteção da cidade. É um território de sobrevivência
para milhares de famílias, sendo fundamental para a qualidade de vida em toda a
chamada grande São Luís.
Considerando a complexidade dos recursos hídricos, a zona rural cumpre um papel estratégico na absorção das chuvas, abastecendo os lençóis freáticos indispensáveis para a recarga de aquíferos e das reservas de água potável na cidade.
De tudo que
já foi dito, escrito e atestado sobre a proposta da revisão do Plano Diretor,
há um consenso de que a população está à margem das informações.
A Prefeitura
de São Luís não proporcionou as condições para a divulgação das audiências
públicas exigidas pela legislação.
E as
audiências convocadas pela Câmara Municipal também não foram suficientemente
publicizadas.
No geral, a
população sequer tem conhecimentos básicos sobre o conteúdo das mudanças
sugeridas no Plano Diretor.
As fortunas
gastas em propaganda sobre os feitos do prefeito deveriam ser investidas também
na ampla divulgação das audiências públicas que vêm debatendo as mudanças
drásticas na vida dos moradores.
Há uma
gigantesca falta de conhecimento sobre o tema (Plano Diretor) tão impactante
para o presente e o futuro de mais de 1 milhão de pessoas.
A Câmara dos Vereadores precisa ter sensibilidade para pensar na gravidade da situação e adiar a votação da proposta de revisão da legislação urbanística.
Está nas
mãos dos parlamentares a chance e o poder de agir com a devida responsabilidade
conferida a eles pelos ludovicenses, através do voto.
É certo que
haverá pressão da Prefeitura sobre os vereadores para que a proposta seja
aprovada.
Se os parlamentares cederem sem debate, aceitando as imposições da Prefeitura, a Câmara de Vereadores será lembrada como exemplo de submissão.
Além disso,
os vereadores serão fiscalizados e cobrados pelas suas atitudes e decisões.
Aprovar mudanças tão complexas na legislação urbanística terá consequências,
inclusive nas eleições de 2020, quando quase todos os edis tentarão a
reeleição.
Os
movimentos sociais e a população da zona rural estão atentos à movimentação dos
vereadores.
E a cidade espera que eles atuem com prudência, tomando a decisão acertada – adiar a votação para que a população possa tomar amplo conhecimento da proposta de revisão do Plano Diretor, debater e tomar as decisões mais adequadas para o desenvolvimento de São Luís.
12 de agosto de 2019 foi um dia mais violento para os moradores do Cajueiro, área cobiçada para a implantação de um novo porto em São Luís, empreendimento bilionário liderado pela CCCC (China Communications Construction Company) com a participação da WPR-São Luís Gestão de Portos e Terminais, braço do grupo WTorre. Atual TUP (Terminal de Uso Privado) Porto São Luís S/A, o investimento inicial é de R$ 800 milhões do total de R$ 2 bilhões previstos para o total da obra.
Naquela
segunda-feira tensa, o Batalhão de Choque da Polícia Militar amanheceu na zona
rural de São Luís dando proteção para o cumprimento da reintegração de posse expedida
pelo Tribunal de Justiça do Maranhão em favor da WPR. Enquanto os tratores
derrubavam casas e arrancavam árvores, a força policial reprimia os moradores e
lideranças dos movimentos sociais que resistiam a mais uma etapa de expansão
dos empreendimentos portuários na capital do Maranhão.
Os
moradores despejados pela manhã, apoiados por ativistas, acamparam à noite na
porta do Palácio dos Leões, sede do governo do Maranhão, e de lá foram expulsos
pelo Batalhão de Choque que usou os mesmos métodos aplicados em Cajueiro:
bombas de efeito moral, spray de pimenta, balas de borracha e gás lacrimogêneo.
Pelo
tamanho da violência se pode medir a dimensão do empreendimento. Os chineses
fincaram os pés no Maranhão pensando longe, na conexão entre os oceanos
Atlântico e Pacífico, passando pelo Canal do Panamá, para alcançar a Ásia.
Minério
e grãos em geral vão transitar nos grandes mercados internacionais pelo Arco
Norte, projeto conectado à expansão da logística portuária e aos modais de
transporte nos estados de Roraima, Amapá, Amazonas, Pará e Maranhão.
O
terminal localizado em Cajueiro vai integrar o Complexo Portuário de São Luís
(CPSL), onde já está instalado o porto público do Itaqui e os terminais
privados da Vale e da Alumar. Pela sua posição geográfica, a capital maranhense
tem condições de navegabilidade para os maiores navios cargueiros do mundo,
através da baía de São Marcos.
O gigante Arco Norte
Arco Norte visa conexão ao Canal do Panamá, que liga os oceanos Atlântico e Pacífico
A
edificação de complexos portuários na região Norte é um dos “pratos” do
indigesto cardápio oferecido às populações tradicionais na bandeja da agenda de
desenvolvimento do governo federal. Isto desde idos governos do PT. Vide Belo
Monte, na cidade de Altamira, no sudoeste do Pará.
Além dos portos, constam no menu estações de transbordo de cargas (ETCs), modais de transportes (rodovias, hidrovias e ferrovias), bem como a construção de grandes e pequenas hidroelétricas. “É um projeto de morte”, adverte a líder indígena do Baixo Amazonas, oeste paraense, Alessandra Munduruku, estudante do curso de Direito da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa).
Tais
projetos, marcados pela concentração de capitais sob o controle de grandes
corporações do mercado mundial, contam com as bênçãos do Banco Mundial e afins.
Os mesmos estão formatados a partir da Iniciativa de Integração Infraestrutura
Sul-Americana (IIRSA), que tem como rebatimento o Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC). Tudo desenhado a médio e longo prazo.
Produtores
de grãos do Mato Grosso – leia-se Grupo Amaggi – construtoras, megacorporações
do quilate da Bunge, Cargil e Dreyfus, empresas de consultoria ambiental e
mídia são alguns dos sujeitos interessados na pauta. Para não citar as mineradoras.
No caso, o papo já é o sobsolo.
Quando a Vale ainda era Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), o alto executivo Eliezer Batista, pai do big shot Eike Batista, foi o responsável pela consultoria do Arco Norte, que tinha como objetivo mapear as riquezas da região e sugerir as obras necessárias para acessá-las. Junte os pontos.
A
opção desenvolvimentista ratifica a região como mera exportadora de produtos
primários. No caso dos complexos portuários e modais de transporte, o objetivo
reside em reduzir drasticamente os custos no escoamento da produção de grãos do
Brasil Central, que em sua maioria converge para os portos de Santos, em São
Paulo; e de Paranaguá, no Paraná.
Neste mar de tubarões do capital agromineral, emerge o Arco Norte com a missão de consolidar essa região do Brasil, o Baixo Amazonas em particular, como um grande corredor de circulação de mercadorias (commodities). Trata-se da manutenção da condição colonial da Amazônia.
Desde
Cabral, e de forma sistemática a partir da ditadura civil-militar (1964-1985), as
experiências desenvolvimentistas têm cimentado rodovias de violações de
direitos humanos, indiferença às populações locais, destruição do meio
ambiente, trabalho escravo, execuções de lideranças de diversos campos e
genocídios na região.
É
o que os doutos chamam de expropriação ou a pré-história da produção
capitalista, que prima em: retirar das populações locais a terra e os recursos
naturais, casas e ferramentas de trabalho que garantem a sua reprodução
econômica, social, cultural e política, a exemplo de Cajueiro, na zona rural de
São Luís, e tantos outros casos que constam nos anais de mais de 30 anos do
Programa Grande Carajás. “Crescemos como rabo de cavalo”, ironiza o jornalista
Lúcio Flávio Pinto.
Entenda o Arco Norte
O
antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida classifica o contexto como
agroestratégias, onde o setor ruralista reivindica a remoção dos obstáculos
jurídico-formais e político-administrativos [desregulamentação], que reservam
áreas para fins de preservação ambiental ou para atender às reinvindicações de
povos e comunidades tradicionais.
Nesse
jogo de poder, o agronegócio tende a influenciar as políticas e planos do
governo na localização de empreendimentos e na conversão de grandes extensões
de terras à racionalidade da escala mundo de fluxos de mercadorias e capitais,
entre outros itens.
O
projeto Arco Norte representa o triunfo do agronegócio, com predominância para
a figura de Blairo Maggi e seus pares organizados a partir da Associação Nacional
de Exportadores de Cereais. A trupe visa incrementar uma nova logística
intermodal de transporte para cargas e insumos com a utilização dos portos ao
norte do Brasil, desde Porto Velho, em Rondônia, passando pelos estados do
Amazonas, Amapá e Pará, até o sistema portuário de São Luís.
Formalmente
a concepção do Arco Norte nasceu em 2016, sob a paternidade do Centro de
Estudos e Debates Estratégicos Consultoria Legislativa (Cedes), uma instituição
de assessoria do poder Legislativo federal. A relatoria coube ao ex-deputado
federal Lúcio Vale (PR/PA), eleito vice-governador do Pará em 2018 na chapa liderada
por Helder Barbalho (MDB). À época Flexa Ribeiro (PSDB/PA), parlamentar do
setor de construtoras, fez paz com a Vale na elaboração no projeto. Oxalá, não
foi reeleito ao Senado.
Logística do Corredor Arco Norte de Exportação
Fonte: Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental da Região de Integração do Baixo Amazonas. Fapespa, 2015
Os
complexos portuários só serão viáveis a partir da consolidação do modal de
transportes. O documento do projeto Arco Norte defende que é necessário
concluir a rodovia BR-163/PA (Cuiabá/MT-Santarém/PA), restaurar as rodovias
BR-155/PA (liga Redenção a Marabá, no sudeste do Pará) e BR-158/PA (sul do
Pará, região de Rio Maria). O sul e o sudeste paraense representam uma
fronteira agromineral. Lá estão os
maiores rebanhos de gado do país e a mina de Carajás. Na mesma proporção agrega
baixos indicadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), Índice de
Educação Básica (Ideb), e, é líder nacional em violência no campo, desmatamento
e trabalho escravo.
O
projeto de integração física advoga ainda intervenções de adequação de
capacidade na rodovia BR-364/RO (Porto Velho/RO-Comodoro/MT). Também é
importante viabilizar a chegada da Ferrovia Norte-Sul a Barcarena (PA). O
município situado ao norte do estado desde os anos 1980 conhece de perto todo
tipo de violência por conta de um complexo industrial de alumínio:
Albras/Alunorte, hoje sob o controle acionário da norueguesa Norsk Hidro, e
outras empresas, como a Imerys (francesa). Ambas são responsáveis por vários
crimes ambientais na região, que tem no portfólio o adernamento do navio de
gado com 5 mil cabeças e 600 mil litros de óleo, em outubro de 2015.
A
embarcação prestava serviço para a maior empresa exportadora de gado vivo do
país, a Minerva Foods, sediada em São Paulo, na cidade de Barretos. Os
principais destinos da carga são os mercados do Líbano, Venezuela e Egito. A
Samara Shipping é a proprietária do navio. Ela contratou a Mammoet Salvatage,
uma das principais empresas do setor no mercado mundial, para resgatar a
embarcação. O comércio de boi em pé, como se diz no jargão do negócio,
representa outro fator da nossa condição colonial. Ainda hoje os moradores de
Barcarena e circunvizinhança compartilham os prejuízos ambientais, econômicos e
sociais decorrentes do gado morto por afogamento e do óleo derramado.
Segue
o fluxo, a consolidação do Norte como corredor de mercadorias exige a
construção da ferrovia EF-170 (Ferrogrão). A China é o principal interessado. A ferrovia, se implementada, deverá ligar o
polo produtor do Mato Grosso aos terminais de Miritituba, na cidade de
Itaituba, no Baixo Amazonas. A cidade antes era celebrizada pela atividade do
garimpo.
Mapa do trecho deve ligar Lucas do Rio Verde/MT a Itaituba/PA
Fonte: Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil – MPAC
O
projeto Arco Norte prescreve também a derrocada do Pedral do Lourenço, na
região de Marabá, para viabilizar a navegação da bacia do Araguaia-Tocantins. O
Arco Norte pleiteia ainda viabilizar a construção dos terminais privados em
Miritituba e Vila do Conde/Barcarena/PA, além de dragar, balizar e sinalizar os
rios Madeira e Tapajós. Além disso, computa a retomada do projeto da BR-210,
que ligará Roraima, Pará e Amapá, viabilizando a integração comercial com as
Guianas, o Suriname e a Venezuela.
No caso de Miritituba, os terminais já estão em operação. Neste complexo tabuleiro de interesses somam inúmeros problemas que passam pela grilagem de terras, acirramento de conflitos, rompimento de laços de solidariedade nas comunidades após o anúncio do empreendimento, aprofundamento da condição colonial da região e não reconhecimento de impostos por conta da isenção assegurada pela Lei Kandir, instituída no governo Fernando Henrique Cardoso, na década de 1990. Para coroar o bolo, tem-se como principal financiador o BNDES, com juros bem abaixo do mercado. Traduzindo: a sociedade financia o saque.
Porto à vista no Lago do Maicá
Maicá
é uma região de várzea da cidade de Santarém, no Pará. Nele, a Colônia de
Pescadores Z-20 estima que trabalham pelo menos 1.500 pescadores artesanais.
Ele abriga ainda comunidades camponesas, indígenas e remanescentes de
quilombos. É justo no rico e belo lugar, estudado e registrado por naturalistas
ingleses há 200 anos, entre eles Henry Walter Bates – um naturalista no rio
Amazonas – que e a empresa Embraps pretende construir um complexo portuário.
O
conturbado projeto tem à frente o empreendedor Pedro Riva. A família dele opera
no Mato Grosso desde o século passado em projetos de colonização crivados de
acusação de grilagens de terra, como revelam pesquisas do professor Ariovaldo
Umbelino de Oliveira, da USP (Universidade de São Paulo). São notórios ainda
como políticos influentes de reputação duvidosa, a exemplo do ex-deputado José
Riva (PSD), acusado por desvio de R$ 2 milhões da Assembleia Legislativa.
No
processo de revisão do Plano Diretor a assembleia consultiva definiu pela não
construção do complexo na região de lago. Decisão que a Câmara Legislativa, ao
apagar das luzes do ano de 2018, em flagrante desrespeito ao processo público, atendendo
ao setor do agronegócio, decidiu em favor do grande capital. Para entornar o
caldo de vez, o prefeito de Santarém, Nélio Aguiar (DEM), sancionou a infâmia.
Por
estas e outras causas que anuviam o processo, o mesmo está judicializado. Neste
mês a Justiça manteve o embargo da obra. Mesmo assim, um grupo desmatou a
região com vistas a iniciar a construção ainda em 2019. A prática segue o mesmo
modus operandi da Cargil, que nos anos de 2000 ergueu na frente da cidade o seu
porto sem realizar o Eia-Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de
Impacto Ambiental).
Cajueiro é Amazônia
Batalhão de Choque da PM expulsa manifestantes na porta do Palácio dos Leões
Os
métodos de grilagem de terras, expulsão de comunidades tradicionais,
atropelamento dos ritos processuais e uso da força policial para varrer os
territórios e entregá-los aos novos conquistadores são comuns em todas as
situações onde estejam em jogo os portos e os modais de transporte de minério,
grãos e similares para atender à expansão capitalista.
Em
Cajueiro, tanto a concessão de licenças ambientais quanto a suposta venda do
terreno para a construção do Porto São Luís S/A são investigados pelo
Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Maranhão. Procuradores
e promotores seguem o rastro de uma denúncia sobre um suposto esquema de
grilagem para tomar ilegalmente as terras das comunidades tradicionais e dos
antigos moradores do território.
Na
década de 1980, a implantação da Vale e a Alumar em São Luís também foi marcada
por conflitos com antigos moradores e deslocamentos compulsórios, gerando concentração
de renda e exclusão social. Essa lógica de expansão capitalista reúne a maioria
dos governos, prefeituras, tribunais de justiça, lobistas e parlamentos das
três instâncias (municipal, estadual e federal) celebrando um consenso,
mediante o discurso do desenvolvimento, da geração de empregos e do crescimento
econômico.
Os
resultados, no entanto, são adversos. Basta observar a cena da pobreza visível.
No entorno da grande região portuária de São Luís, a área Itaqui-Bacanga, que
reúne aproximadamente 60 bairros periféricos, a pobreza da maioria da população
é vizinha das fortunas transportadas pelos navios em nome do superávit da
balança comercial. Além desse desencontro, há o vertiginoso processo de
poluição ambiental provocado pelos empreendimentos agregados à logística
portuária e à Vale.
O
atropelo das práticas republicanas no Lago do Maicá, em Santarém, segue a
lógica do Brasil clientelista e fisiológico aplicado no Cajueiro. A violência
perpetrada em 12 de agosto de 2019 pode ter outros episódios futuros. Em São
Luís, a Câmara dos Vereadores está prestes a votar a proposta de revisão do
Plano Diretor elaborado pela administração municipal.
A
revisão do plano tem um alvo central: eliminar 41% da zona rural do município,
justamente na área cobiçada para empreendimentos portuários e já sob influência
da expansão dos negócios da Vale e da Alumar. Caso a revisão seja aprovada,
serão subtraídos 8.643 hectares na zona rural do município, que passaria de
20.820 hectares para 12.177 hectares.
O
território Cajueiro é composto por cinco pequenos núcleos: Parnauaçu,
Andirobal, Guarimanduba, Morro do Egito e Cajueiro. Significa dizer que novos
espaços podem ser cobiçados no plano de expansão portuária e industrial da
capital do Maranhão.
* Professor Adjunto I do Curso de Licenciatura em Ciências Humanas da UFMA, Campus Pinheiro. Doutorando em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia pela UFC.
Desde o dia 17 de janeiro, a Prefeitura Municipal de São
Luís, vem organizando audiências públicas para revisão da Lei 4.669/06 que
dispõe sobre o Plano Diretor. Ao todo são 9 sessões, que terminarão no próximo
dia 2 de fevereiro. O Capítulo III, do Art. 40, §4º, I, do Estatuto da Cidade
(Lei nº 10.257/2001), determina que, para elaborar o plano diretor e fiscalizar
sua implantação, os municípios devem realizar “audiências públicas e debates
com a participação da população e de associações representativas dos vários
segmentos da comunidade”.
O Plano Diretor é um diagnóstico científico da realidade
territorial socioeconômica e política do município, segundo Flávio Villaça,
“apresenta um conjunto de propostas para o futuro desenvolvimento dos usos do
solo urbano, das redes de infra-estrutura e de elementos fundamentais da
estrutura urbana”. Portanto, é indiscutível a relevância desta
legislação.
O processo de revisão do Plano Diretor de São Luís foi
proposto em 2015 por órgãos da prefeitura com o intuito de fazer apenas alguns
ajustes no texto sobre o Macrozoneamento Ambiental, estratégia que visava a
discussão e aprovação da legislação de zoneamento, parcelamento, uso e ocupação
do solo, uma lei que complementa o Plano Diretor e estabelece índices e usos urbanísticos,
dividindo a cidade em zonas. O processo previa 8 audiências, o Ministério
Público Estadual e a sociedade civil pediram um número maior e mais divulgação
à época, a prefeitura acatou e estabeleceu 15 audiências, destas, 13 foram
realizadas e o processo foi cancelado pelo MP Estadual que determinou que se
discutisse, de maneira mais ampla, o Plano Diretor.
O Plano Diretor de fato foi rediscutido por órgãos e membros
da prefeitura e de outros setores da sociedade em reuniões técnicas no Conselho
da Cidade. Houve alterações que chamam atenção do ponto de vista quantitativo,
como a inclusão de 59 artigos, exclusão de outros 19 e algumas inclusões
textuais. Mas no geral, do ponto de vista qualitativo, não há diferenças
substanciais em relação a lei vigente.
Algumas propostas estão recebendo duras críticas da
sociedade civil, a exemplo da escandalosa supressão da Zona Rural sem a devida
apresentação de estudos técnicos consistentes, utilizando uma metodologia
frágil, baseada principalmente em imagens de satélite e fotografias aéreas de
2009, e sem uma análise empírica do território passível de ser transformado em
zona urbana, que por sua vez apresenta características de ocupação espontânea
recente, sem o mínimo de infraestrutura. Outra questão a ser destacada são as
respostas do Instituto da Cidade (INCID) por meio de seu presidente José
Marcelo do Espírito Santo, quando das indagações, elas em muitas ocasiões são
vagas, às vezes em linguagem não adequada à população leiga e frequentemente
não satisfazem os que levantam as questões, o que faz das audiências um grande
teatro.
Pelo que há na proposta, a ampliação da zona urbana,
sobretudo na porção oeste e sudoeste do território – chamado no Macrozoneamento
Urbano de “zona em consolidação 2” – favorecerá a instalação de um porto
privado ao sul da baía de São Marcos, objeto da sanha do capital financeiro
chinês, que possui previsão de investimentos em São Luís com o aval do governo
estadual. Os próprios representantes da prefeitura defenderam essa posição nas
audiências, o discurso é velho conhecido: tais empreendimentos proporcionarão
emprego, renda e desenvolvimento ao município. Curiosamente, apenas setores
empresariais da construção civil estão batendo palmas. Além disso, tal
ampliação comprime um território da zona rural na bacia do rio dos Cachorros,
onde estão comunidades como Taim, Colier, Juçaral, Santa Cruz, que sofrerão em
pouco tempo com a investida de empresários para comprar suas terras e destruir
seus modos de vida caso a proposta vá para frente.
É digno de nota ainda, a omissão dos funcionários do alto
escalão da gestão Edivaldo Holanda Junior em não propor neste Plano Diretor a
delimitação de novas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) no município,
principalmente em territórios da porção norte de São Luís e na área do
Itaqui-Bacanga, onde há grande adensamento e milhares de ocupações precárias.
As ZEIS ou ZIS (Zonas de Interesse Social) como é chamada na legislação vigente
nunca foram regulamentadas enquanto instrumento de política urbana, apesar de
existirem desde 1992, um absurdo, já que elas abrem possibilidades de garantia
de fixação via regularização fundiária aos habitantes pobres em diversos
bairros da cidade.
O que a prefeitura tem feito, de forma irresponsável, é
criar ZIS em lugares distantes na zona rural via Programas como o Minha Casa,
Minha Vida – a exemplo do elefante branco na comunidade Mato Grosso –
favorecendo o lucro de construtores, promovendo uma segregação
institucionalizada ao deixar milhares de pessoas sem o mínimo de dignidade,
usurpando-as do direito de ter saneamento básico, transporte público adequado,
rede de água potável, acesso à serviços e equipamentos urbanos como escolas,
creches, hospitais, dentre outros.
Outro ponto que merece destaque e que tem sido objeto de
polêmica nas audiências é o descaso com o Mapa de Vulnerabilidade
Socioambiental, que vem sendo prometido pela prefeitura e pelo INCID há mais de
uma década, o que configura um total desrespeito à população da cidade. Tal
mapa seria de extrema importância para diagnosticar problemas ambientais e
sociais em muitos territórios do município. Na lei vigente de 2006 a prefeitura
tinha um prazo de 90 dias a partir da data de promulgação do Plano Diretor para
elaborar o mapa de vulnerabilidade socioambiental, até hoje nunca se viu tal
mapa. Na proposta atual o prazo para elaboração é de 150 dias, o que é um
acinte se formos levar em consideração um atraso de 12 anos.
Pelo exposto, ainda é preciso dizer que o planejamento
urbano em São Luís tem sido uma lástima nos últimos 30 anos, só para falar de
um período mais recente. A pobreza e a desigualdade têm aumentado na cidade,
assentamentos informais se proliferam, o transporte público é caótico e caro,
não há acessibilidade digna, ruas e avenidas padecem por falta de pavimentação
– aliás essa cidade é dos carros – faltam espaços públicos de lazer, não por
acaso os shoppings estão abarrotados de gente.
A impressão que dá é que os planejadores deste município – que são os mesmos há três décadas! – ainda não saíram de seus gabinetes refrigerados, não conhecem a totalidade da cidade concreta e os problemas reais de seus habitantes, conhecem no máximo a cidade legal e/ou a cidade pelos mapas e estão a serviço dos poderosos. Aliás, as legislações urbanísticas representam as ideologias das elites, funcionando como marco delimitador de fronteiras de poder, como bem pode ser observado no processo de revisão do Plano Diretor atual. O planejamento urbano deve ser feito com a participação ativa da população no cotidiano e não apenas em poucas audiências públicas em intervalos de anos, como diria Jane Jacobs o planejamento urbano tem como “objetivo alcançar uma vitalidade urbana”, levando em conta as relações de proximidade, afinal nunca é demais lembrar a lição deixada por Milton Santos nos limites da sua psicosfera: “o planejamento urbano, antes de tudo, supõe uma mudança de comportamento nos habitantes da cidade”, o que a gestão municipal, definitivamente, não leva em consideração.
Imagem / Reprodução / TV Mirante: caminho da roça no Calhau, na área nobre de São Luís, onde deveria ser uma calçada.
Após a repercussão sobre as condições de segurança das lagoas de resíduos de bauxita da Alumar, os vereadores de São Luís decidiram montar uma comissão para inspecionar as instalações da multinacional, nesta quinta-feira (31), às 14 horas.
Em nota, a empresa antecipou o discurso, afirmando que as ARBs (Áreas de Resíduos de Bauxita) não oferecem riscos de vazamento.
A iniciativa da Câmara Municipal só está ocorrendo porque o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho mobiliza a opinião pública sobre outros potenciais poluidores Brasil afora.
Com as devidas exceções, os nossos edis têm algumas dívidas com a cidade. A Câmara, por exemplo, se mobiliza para discutir projeto similar ao “Escola Sem Partido”, mas não tem o mesmo empenho para fiscalizar algumas escolas da rede municipal de São Luís que correm o risco de desabar sobre as crianças e os professores.
A Alumar e a Vale são irmãs siamesas filhas da poluição, mas em raras ocasiões foram objeto da atenção dos vereadores, deputados ou senadores do Maranhão.
Justiça seja feita ao vereador Sá Marques, ex-funcionário da Alumar, que se manifestou com preocupação e conhecimento técnico sobre as condições de segurança das rumorosas lagoas de lama vermelha, onde estão armazenados os resíduos de bauxita resultantes do processo de produção de alumina.
Na Assembleia Legislativa apenas o deputado Wellington do Curso vem se posicionando sobre a urgência de fiscalizar as empresas como Vale e Alumar.
É preciso, portanto, muita atenção à qualidade da visita dos edis a uma multinacional tão poderosa. Se for apenas uma inspeção protocolar, para ouvir a direção da Alumar, fazer self e divulgar nas redes sociais, não Vale!
A inspeção dos vereadores precisa ter consequências. Eles têm todas as condições de mobilizar a cidade para cobrar transparência da Alumar, mediante a apresentação de relatórios circunstanciados, analisados por especialistas e pesquisadores independentes, capazes de traduzir os termos técnicos e torná-los acessíveis à maioria da população.
Os vereadores devem também convocar audiências públicas e obrigar a Alumar a comparecer e prestar contas sobre as reais condições de armazenamento dos resíduos da bauxita.
As audiências públicas devem ser realizadas tanto na Câmara Municipal quanto nos bairros de São Luís, com ampla divulgação, transmissões ao vivo pelas redes sociais, acompanhadas de material didático acessível aos moradores.
A Alumar e a Vale estão no centro do debate atual da cidade, visto que a Prefeitura de São Luís está fazendo a revisão do Plano Diretor e, na proposta, prevê a redução da zona rural em 41%.
Serão suprimidos mais de 8 mil hectares e, obviamente, este território deve ser pleiteado para expandir a zona industrial. É aí que mora o perigo.
Portanto, há um jogo muito poderoso de interesses na revisão do Plano Diretor, onde atuam como lobistas as empreiteiras e a Federação das Indústrias do Maranhão (Fiema), esta a principal interessada na redução da zona rural para expandir as plantas industriais dos empreendimentos mínero-metalúrgicos e outros tão agressivos quanto.
Em São Luís já funciona uma usina termelétrica à base de carvão mineral, da Eneva. Outros empreendimentos podem estar de olho na revisão do Plano Diretor, que ao final passará pelo aval de quem?
Justamente ela, a Câmara Municipal.
Como se vê, a inspeção dos vereadores na Alumar não é algo tão simples.
A Prefeitura de São Luís está submetendo à população, por
intermédio de nove audiências públicas, proposta de revisão do Plano Diretor –
Lei nº 4.669/06, que reduz em 41% a zona rural do município.
O Plano Diretor é a lei urbanística mais importante de um
município. É a partir dela que todas as outras leis que tratam da questão
urbana são editadas, como lei de zoneamento, uso e ocupação do solo, lei de
toponímia, dentre outras.
A atual lei do Plano Diretor de São Luís é do ano 2006, e,
deveria ter sido revisada até 2016, conforme determina o Estatuto das Cidades –
lei federal nº 10.257/2001, que também obriga que esse processo tenha
participação da população, na forma de audiências públicas.
A Prefeitura chegou a iniciar o processo de revisão do Plano
Diretor em 2015, mas por falhas graves no processo de revisão tais como
divulgação precária das audiências e revisão simultânea da lei de zoneamento, uso
e ocupação do solo, houve uma recomendação do Ministério Público Estadual para
que o processo fosse reiniciado, com a revisão exclusiva do Plano Diretor, que
foi transformada num Termo de Ajuste de Conduta.
Com base nesse Termo de Ajuste de Conduta, o Município de
São Luís, através do seu Conselho da Cidade, que tem representantes do poder
público e da sociedade civil, elaborou uma minuta de alteração da Lei nº
4.669/06, propondo uma grande revisão, com a inclusão de 59 artigos, alteração
de outros 63 artigos e exclusão de 19 artigos, além da substituição dos 3 mapas
anexos à lei, sendo que estes foram elaborados com base em imagens aéreas
realizadas em 2009.
Dentre as principais alterações propostas estão a redução de
8.643 hectares na zona rural do município, que passaria de 20.820 hectares para
12.177 hectares, a redução de 11,5 hectares da área de dunas, a diminuição das
áreas de recarga de aquíferos e a redução parcial da área protegida no Sítio
Santa Eulália.
Causam espanto as propostas apresentadas, pois terão graves
consequências sobre a produção rural do município, além de permitir a ampliação
da já elevada atividade industrial na Ilha de São Luís, que já emite quatro
vezes o volume poluição do Município de Cubatão, em São Paulo, e ultrapassa os
limites legais de emissões de três poluentes, segundo relatório produzido em
janeiro de 2017 pela Secretaria de Indústria e Comércio do Estado do Maranhão.
Além disso, afetará a produção de água potável em São Luís, uma vez que 40% da
água consumida é extraída do subsolo da ilha.
Todos esses pontos de preocupação quanto ao conteúdo da
proposta apresentada têm sido apontados, nas audiências públicas já realizadas,
por professores, líderes comunitários, pesquisadores e ambientalistas, que
também criticam a ausência de estudos técnicos a justificar cada uma dessas
alterações.
Espera-se que o Poder Executivo Municipal reavalie sua proposta, e que, antes de enviar o Projeto de Lei à Câmara de Vereadores, proceda os ajustes quanto aos problemas que estão sendo levantados nas audiências públicas.
A Prefeitura de São Luís dará início na terça-feira (15), no
auditório da Faculdade Pitágoras (Avenida S. Luís Rei de França, 32 – Turu),
das 19h às 22h, a uma série de audiências públicas para apresentação da
proposta de revisão do Plano Diretor da cidade. Com a realização de nove
audiências, será concluído processo de revisão do instrumento de política
urbana, coordenado pelo Conselho da Cidade (Concid), vinculado à
Secretaria Municipal de Planejamento e Desenvolvimento (Seplan).
Diversos movimentos sociais que atuam no segmento de reforma
urbana questionam vários procedimentos adotados pela Prefeitura de São Luís
para a revisão do Plano Diretor, tais como manobras jurídicas e burocráticas
para impedir a efetiva participação dos moradores da cidade no debate sobre a
revisão da legislação urbanística.
Segundo a gestão municipal, o Plano Diretor é o principal
instrumento normativo e orientador da política de desenvolvimento urbano e
rural da cidade. Com a realização das audiências em diferentes regiões da
cidade, o processo de revisão da lei segue preceitos estabelecidos pela Constituição
Federal de 1988, Lei Orgânica do Município e Estatuto da Cidade. Na
retomada do processo de revisão do Plano Diretor, a Prefeitura realizou, no mês
de dezembro de 2018, dois dias de oficinas para qualificar os participantes das
audiências.
Os movimentos sociais e ativistas pelo direito à cidade
questionam a obscuridade e os poucos espaços de debate sobre um tema tão
importante para o cotidiano da população. Tanto as oficinas quanto as
audiências têm pouca divulgação e geralmente ocorrem sem qualquer entusiasmo
dos moradores dos bairros e nos arredores dos locais onde as atividades são
realizadas.
A Prefeitura, por sua vez, rebate as críticas. “As
audiências públicas são parte do processo de revisão da legislação urbanística
do município. Nesse caso, serão vários momentos, configurando-se em audiências
para revisão do Plano Diretor de São Luís, cujo cronograma foi aprovado em
assembleia. É muito importante que a população participe desses momentos, pois
a efetividade das diretrizes da minuta do Plano Diretor que será apresentado a
Câmara deve ser de conhecimento de toda a população ludovicense”, pontua o
presidente da Fundação Municipal do Patrimônio Histórico (Fumph), Aquiles
Andrade, responsável por ministrar as oficinas de qualificação no final de
2018.
A posposta apresentada durante as audiências objetiva
modificar aspectos e atualiza o Plano Diretor, sob a lei nº 4.669, em vigor
desde 2006. O Conselho da Cidade de São Luís é órgão colegiado paritário
constituído por representantes da sociedade civil organizada e poder público. O
conselho tem caráter permanente, deliberativo, consultivo e fiscalizador.
De forma didática, o presidente da Fundação Municipal de Patrimônio
Histórico (Fumph), Aquiles Andrade, apresentou, durante as oficinas, uma visão
geral sobre o processo de implantação da política urbana nos municípios
brasileiros. Na ocasião, foi apresentado como se estrutura o principal
instrumento de política urbana.
A proposta que será apresentada nas audiências foi dividida
em 11 títulos, segundo deliberação do Conselho da Cidade. Cada tema foi
debatido durante o período de dezembro de 2017 e novembro de 2018 em reuniões
regulares ocorridas sempre às quartas-feiras na sede da Escola de Governo e
Gestão Municipal (EGGEM). Foram mais de 40 encontros realizados com objetivo de
verificar quais as ações e propostas foram efetivadas ao longo dos anos de
vigência do Plano Diretor.
Uma grande festa celebrou a inauguração do complexo de obras da praça Deodoro, até pouco tempo marcada por uma paisagem grotesca no principal logradouro de São Luís. O Centro da cidade está mais belo e vai ficar ainda melhor quando for concluída a reestruturação da rua Grande.
A cidade respira um astral nunca antes visto nas últimas três décadas. Os ludovicenses apaixonados e os visitantes deslumbrados estão eufóricos. Basta observar o congestionamento dos moradores e turistas para apreciar as luzes de Natal no Palácio dos Leões e toda a ornamentação que se estende até a praça Benedito Leite.
O conjunto de obras é fundamental para revitalizar o comércio, a mobilidade, a habitação e o turismo em uma região da cidade por muito tempo negligenciada e agora valorizada no programa do governo federal (PAC Cidades Históricas), em parceria com a Prefeitura e o Governo do Estado.
A revitalização do complexo Deodoro é o coroamento de três décadas de uma sequência de gestões. Ufa! 2019 completa o ciclo de 30 anos de domínio e herança do mesmo grupo político, com algumas variações, na Prefeitura de São Luís.
Os muito apaixonados estão todos refastelados com este feito homérico, elogiando-se uns aos outros, nesta cidade ainda marcada por características provincianas, onde a crítica reverbera tons de medo, despeito ou repulsa.
Neste ambiente provinciano, a discordância é vista até como ato de má vontade, atribuído às pessoas mal intencionadas que sempre enxergam defeitos no sucesso dos gestores públicos.
Dito isso, vamos aos outros fatos que contrariam a euforia da praça Deodoro.
Esta cidade fantástica do Centro, quase um conto de fadas, destoa da São Luís profunda, onde os serviços públicos não alcançam a maioria da população ou chegam precariamente.
Em qualquer capital do Brasil pelo menos as avenidas principais têm asfalto decente. Em três décadas de repetição do mesmo grupo político, nem a pavimentação melhorou nos principais eixos rodoviários.
Quem sai do Anil percorrendo o antigo Caminho Grande para alcançar a praça Deodoro parece dirigir na mesma estrada carroçal de outrora, como se ainda vivêssemos no passado da engenharia asfáltica.
Asfalto é apenas um detalhe da complexa teia de equipamentos da mobilidade urbana, nesta cidade onde só há uma faixa de pedestre decente, na área nobre de São Luís, em frente ao Tropical Shopping, mesmo assim com a rampa lateral danificada.
Esses pequenos registros da paisagem são apenas detalhes de algo muito grave – o zoneamento de São Luís. A Prefeitura que torra milhões do dinheiro público em propaganda deveria divulgar amplamente as audiências públicas que vão alterar o Plano Diretor.
Uma gestão com o mínimo de transparência deveria convocar e esclarecer a população sobre as mudanças no uso e ocupação do solo urbano que muito breve irão impactar no cotidiano da população.
Se teremos mais poluição e calor na cidade, será fruto das mudanças no Plano Diretor, mas este debate é omitido pela Prefeitura.
Vivemos em São Luís uma versão da sociedade do espetáculo (Guy Debord), onde a população só é chamada para aplaudir as inaugurações das obras, sem de fato participar da gestão da cidade.
Por sua vez, a Câmara dos Vereadores, salvo as exceções de alguns edis, funciona como engrenagem de transmissão das vontades do Palácio La Ravardière, transformando o Legislativo em um poder submisso ao prefeito.
Esta Câmara, por exemplo, passou sessões intermináveis debatendo o projeto da Escola Sem Partido, muito preocupada com as questões morais da família, mas pouco se importa com as famílias maltratadas pelo abandono dos bairros sem saneamento.
Por falar nisso, temos de reconhecer: São Luís só é democrática em um quesito – a falta de saneamento. Em qualquer lugar da cidade, na área nobre ou na periferia, tem esgoto transbordando. Nesta cidade, a fedentina é ampla, geral e irrestrita.
Os vereadores, tão preocupados com a sexualidade das crianças, não fiscalizam as precárias condições das escolas municipais e os esquemas dos anexos na rede pública de ensino, onde prepondera o clientelismo e o fisiologismo para a manutenção dos micropoderes eleitorais.
Onde está a sensibilidade dos vereadores diante da situação das crianças encurraladas nos anexos da rede municipal de ensino?
A Câmara dos Vereadores negligencia sua função de fiscalizar o prefeito. Não há notícia de uma CPI para investigar a situação das escolas municipais e as comunitárias, a megalicitação do transporte público, os aluguéis dos prédios particulares pela Prefeitura, os índices de poluição na cidade, os Socorrões, os contratos com as empreiteiras e tantos outros temas de interesse público.
O sentido da cidade é a democracia. Sem participação e transparência não há gestão pública, no sentido rigoroso do termo. Aí predominam os interesses privados dos grupos econômicos que operam o orçamento.
Nesse contexto das alterações no zoneamento, a Prefeitura age como lobista dos interesses do capital para lotear a cidade ao sabor das empreiteiras, pouco importando se teremos menos áreas verdes, mais calor, menos espaço para os pedestres e mais poluição.
São Luís é uma virgem cobiçada pela especulação imobiliária e as mudanças no zoneamento estão a serviço de um casamento, cujo dote é o mercado das terras, direcionando a cidade histórica para uma configuração portuária e industrial.
É óbvio que todos estamos felizes com a revitalização da praça Deodoro. Não ponhamos fel no mel da notícia para não desagradar os apaixonados.
Mas também não vamos cegar a crítica. Sem ela, o jornalismo perde o sabor e o sentido.