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Como a reforma administrativa de Paulo Guedes favorece a corrupção

Luis Ricardo Miranda, servidor concursado do Ministério da Saúde, tem um papel fundamental na investigação sobre as irregularidades nas tratativas para compra de vacinas no governo Jair Bolsonaro.

Concursado e amparado pela estabilidade no serviço público, o servidor não se submeteu às pressões e assédios que vinha sofrendo para atender aos interesses escusos no processo de aquisição dos imunizantes.

A condição de servidor concursado e assegurado pela estabilidade no serviço público é um dispositivo fundamental para o empregado desempenhar suas funções de acordo com os critérios da probidade.

Mas, veja o que está ocorrendo na reforma administrativa…

O governo Jair Bolsonaro está chegando ao fim mergulhado na lama da corrupção, mas de bem com o mercado.

Uma boa parte da agenda ultra liberal já foi cumprida com a aprovação das reformas previdenciária e trabalhista. Para terminar o “serviço”, o ministro Paulo Guedes tenta enfiar na boiada a reforma administrativa.

Sob o argumento de que precisa “modernizar” a máquina pública, a meta é eliminar o concurso público e a estabilidade dos servidores federais.

Essas medidas, entre outras, têm o objetivo de lotear a administração pública com cargos indicados pelos métodos da velha política.

Sem o concurso público e a estabilidade, o servidor fica vulnerável às pressões e coações dos chefes imediatos e superiores, estes indicados pelo carcomido esquema do clientelismo e do fisiologismo.

Dessa forma os trabalhadores perderão segurança e autonomia conquistados pelo mérito e esforço dedicados ao estudo para serem aprovados em concurso.

As conseqüências da reforma administrativa são desastrosas para a administração pública porque podem favorecer a corrupção.

Imagem destacada / ilustração capturada aqui

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A Literatura Maranhense no século XXI: ainda o marasmo?

Dino Cavalcante

Desde o fim do século XIX, por volta de 1890, que no Maranhão, sobretudo na capital, ecoa, em seus jornais, em suas ruas, praças, becos, cafés, bibliotecas, salas de aulas, etc., um triste fim de sua mais nobre arte: a literatura. Os arautos do passado, saudosistas dos grandes nomes de nosso “Pantheon”, como simbolizaria Antônio Henriques Leal, escreviam e gritavam aos quatro cantos a situação de extrema penúria a que estavam condenadas as letras maranhenses.

Após a vinda de Coelho Neto, em 1899,os discursos mudaram e passaram a engrandecer o novo grupo que se destacava, batizado por Antonio Lobo de os Novos Atenienses. Houve uma produção relevante em São Luís, com grande destaque na poesia e nos contos. Mas, depois, da morte trágica de Antonio Lobo, o marasmo passou a impor sua marca. A própria Academia entrou numa espécie de hibernação por décadas, sem grandes projetos, produções literárias, etc.

No fim dos Anos 40, dois movimentos deram um grande impulso à cultura do Estado. Primeiro: a chegada de Bandeira Tribuzi, vindo de Portugal. A sua presença do meio literário fez uma geração de escritores olhar para o horizonte e descobrir novos rumos para a poesia, ainda presa ao século XIX. Segundo: A ampliação das cadeiras da Academia Maranhense de Letras para 40, como havia sido previsto desde a sua fundação, em 1908, com a entrada das duas primeiras mulheres: Laura Rosa e Mariana Luz.

No final dos anos de 1970, com a morte de Bandeira Tribuzi, novamente se acende uma luz amarela no meio intelectual. Nos jornais e nas salas de aula, sobretudo do Curso de Letras da ainda jovem Universidade Federal do Maranhão, muitas vozes se dirigem ao que se denomina de marasmo cultural. Alguns chegam até a afirmar, com muita dose de pessimismo que “era uma vez a Literatura Maranhense”.

Quando os anos 80 surgem no horizonte, a Secretaria de Cultura do Estado do Maranhão e o SIOGE, Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado, que já faziam um bom trabalho de publicação de obras literárias desde a década anterior, passam a comandar todo esse processo de edição. Livros que estavam há décadas fora de circulação no meio cultural ganharam novas e modernas edições. Além disso, os concursos literários deram oportunidade a muitos jovens escritores e poetas para que se lançassem no seleto grupo dos autores maranhenses com livros na praça. 

Os anos 90 conhecem uma infinidade de novos poetas e prosadores, numa prova viva de que a literatura entre nós estava em franca evolução. Novos ritmos, novas formas poéticas e novos gêneros foram produzidos.

No Século XXI, o acesso à edição e à divulgação dos livros publicados melhorou significativamente. As edições da FELIS, Feira do Livro de São Luís, do SALIMP, Salão do Livro de Imperatriz, do Festival GEIA de Literatura, em São José de Ribamar, para citar apenas esses três eventos, deram um amplo espaço para os autores consagrados pelo público, como Josué Montello, Ferreira Gullar, Nauro Machado, entre outros, e para os novos escritores. Além disso, novos espaços foram criados e abertos a todos os públicos leitores, como o espaço AMEI, centro difusor da cultura literária maranhense.

Mas, apesar de toda essa agitação cultural, ainda há vozes, inclusive no meio acadêmico, dando conta de uma possível falência da Literatura Maranhense ou ainda de uma crise na leitura dos nossos autores, diante dos bestsellers, responsáveis pelo quase completo desinteresse dos jovens leitores por textos nacionais e regionais. Esses arautos vaticinam, como se videntes fossem, que ninguém mais lê obras de autores, como Maria Firmina dos Reis, Aluísio Azevedo, Arthur Azevedo, Humberto de Campos, Viriato Corrêa e tantos mais.

Com o intuito de refletir sobre o atual estágio dos estudos de Literatura Maranhense e sua importância, sobretudo no meio acadêmico, destacamos algumas pesquisas realizadas nas duas primeiras décadas deste século – mais precisamente entre 2001 e 2021 – sobre autores e autoras da terra de João Francisco Lisboa. Iniciemos pelas Dissertações de Mestrado e Teses de Doutorado.

ATENIENSES E FLUMINENSES: A Invenção do Cânone Nacional –Ricardo André Ferreira Martins – Tese Unicamp.

O POEMA O GUESA DE SOUSÂNDRADE, à Luz da Hermenêutica de Paul Ricoeur. Rita de Cássia Oliveira. Tese PUC/SP

A ESCRAVIDÃO NO MARANHÃO: Maria Firmina dos Reis e as representações sobre escravidão e mulheres no Maranhão na segunda metade do século XIX. Régia Agostinho da Silva. Tese USP.

NO ALINHAVO DO TEMPO: O tecer da memória no romance Por onde Deus não Andou, de Godofredo Viana–KerllenMiryan Portela De Paiva Norato. Dissertação UFMA.

AS RELAÇÕES DE PODER EM UMA CIDADE EM RUÍNAS: O lugar dos excluídos no romance Vencidos e Degenerados – Paloma Veras Pereira. Dissertação UFMA

AS RELAÇÕES RELIGIOSAS EM OS DEGRAUS DO PARAÍSO, DE JOSUÉ MONTELLO– Thiago Victor Araújo dos Santos Nogueira. Dissertação UFMA

AS REPRESENTAÇÕES DA MORTE EM O MONSTRO E OUTROS CONTOS, HUMBERTO DE CAMPOS – Ivane Santos Diniz. Dissertação UFMA.

A CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA COLETIVA ALCANTARENSE: Do Esplendor Econômico à Decadência Social em Noite sobre Alcântara,de Josué Montello–Railson Costa Santos. Dissertação UFMA

O FANTÁSTICO EM ALUÍSIO AZEVEDO E COELHO NETO: Análise dos contos Demônios e A Bola – Lívia Fernanda Diniz Gomes. Dissertação UFMA.

A ARQUEOLGIA DA PROTOFICÇÃO CIENTÍFICA E A CONTRIBUIÇÃO DA LITERATURA MARANHENSE – Thalita Ruth Sousa. Dissertação UFMA.

PORTUGAL E BRASIL EM DIÁLOGO: um estudo da poesia simbolista de Camilo Pessanha e Maranhão Sobrinho à luz da literatura comparada. Samara Santos Araújo. Dissertação UFMA.

QUANDO A DOENÇA TORNA A VIDA UM FARDO: a trajetória de Humberto de Campos (1928-1934) – Giscard F. Agra. Tese UFPE.

Citamos alguns livros publicados no mesmo período acerca do tema em questão. Lembrando que são apenas alguns exemplos. Foram publicadas centenas de obras literárias e sobre a arte de Maria de Firmina dos Reis.

TÁBUA DE PAPEL: Estudos de Literatura Maranhense. José Neres (Org.). São Luís: Café & Lápis, 2010.

A ATHENAS EQUINOPCIAL: A Literatura e a Fundação de um Maranhão no Império Brasileiro. Henrique Borralho. São Luís: FUNC, 2011.

OS ATENIENSES: A Invenção do Cânone Nacional. Ricardo Leão. São Luís: Instituto Geia, 2013.

UM LIVRO DE CRÍTICA – Frederico José Correa. Bruno Azevedo (Org.). São Luís: Frias, 1878 – São Luís: Pitomba, 2015.

O SÉCULO XX E A LITERATURA MARANHENSE: Reflexões sobre a narrativa em prosa. José Neres e Dino Cavalcante (Orgs.). São Luís: EDUFMA, 2016.

ENTRE A FACE E O DORSO: Diálogos com a Poética de Ferreira Gullar. Silvana Maria Pantoja dos Santos, José Dino Costa Cavalcante (Orgs.). São Luís: EDUEMA, 2017.

“Da Literatura Maranhense: ORomancedo Século XX”. Dinacy Mendonça Correa. São Luís: EDUEMA, 2017.

JOSUÉ MONTELLO: entre Memória, Ficção e Cultura. Silvana Maria Pantoja dos Santos, José Dino Costa Cavalcante, Joseane Souza (Orgs.). São Luís: EDUFMA, 2018.

OS CANHÕES DE TROIA – Ensaios sobre Nauro Machado e José Chagas. Rafael Campos Quevedoe Wandeilson Silva de Miranda (Orgs.). São Luís: Imprece, 2019.

MARANHÃO SOBRINHO: O poeta maldito de Atenas. Kissyan Castro. Guaratinguetá: Penalux, 2019

A CASCA DA CANELEIRA: por uma boa Dúzia de “esperanças”. Carlos Augusto de Melo (Org.).   São Paulo: Paco Editorial, 2019.

EXPERIÊNCIAS DA MEMÓRIA E DO ESPAÇO EM JOSUÉ MONTELLO: Leituras da Geograficidade. Márcia Manir Miguel Feitosa (Org.) São Luís: Café & Lápis/EDUFMA, 2021.

MARIANA LUZ: Murmúrios e Outros Poemas. Gabriela Santana (Estabelecimento de texto e introdução).  São Luís: AML, 2021.

Some-me a toda essa pesquisa e produção, mais uma centena de artigos em periódicos, em anais de eventos acadêmicos e capítulos de livros sobre a Literatura Maranhense no período em questão. Mais ainda: uma centena de monografias versando sobre o tema referido, orientadas e concluídas nos Cursos de Letras da Universidade Federal do Maranhão, da Universidade Estadual do Maranhão, da Faculdade Atenas Maranhense, do Pitágoras, Facam, entre outras.

E ainda: mais de uma centena de blogs e sites voltados exclusivamente para a produção literária maranhense, a exemplo do site da Universidade Federal de Santa Catarina – Biblioteca Digital da Literatura Maranhense –, com um bom acervo de obras digitalizadas, disponíveis ao público. Nos últimos vinte anos, dezenas de Academias de Letras foram criadas em cidades do Estado que, aparentemente, tinham pouca produção literária.  O que vemos é um tema cada vez mais atrativo para as pesquisas.

Longe de uma crise, temos um objeto que atrai cada vez mais pesquisadores do Maranhão, de outros Estados e até de outros países, da África, da Europa e da América. Por exemplo: só em 2021, dois livros do poeta Salgado Maranhão foram traduzidos e lançados nos Estados Unidos, com grande aceitação por parte da crítica.

Para um bom observador, a Literatura Maranhense ao contrário de um marasmo ou de uma crise, está despontando, nos últimos vinte anos, com um vigor jamais experimentado ao longo de seus quase dois séculos de história (se considerarmos o início em 1832, com publicação do poema Hino à Tarde, de Odorico Mendes).

Por fim, precisamos de uma política não só acadêmica, mas sobretudo governamental (tanto do Governo Estadual como das prefeituras municipais) para que possamos valorizar ainda mais nossa literatura. É inconcebível que alunos de uma cidade como Codó passem três anos no Ensino Médio e sequer ouçam falar do seu conterrâneo Godofredo Viana, autor do romance por Onde Deus não Andou, ambientado nessa cidade. Como disse Castro Alves, em seu poema O Livro e a América: “Oh! Bendito o que semeia/ Livros… livros à mão cheia…/E manda o povo pensar!”, a literatura precisa chegar a todos os cantos do Estado, seja através de concursos literários promovidos pelos órgãos institucionais, seja nas salas de aula, com professores e alunos lendo e discutindo os nossos autores.

A Literatura Maranhense é um dos nossos maiores patrimônios culturais, mas cabe à sociedade, às universidades e aos governos, valorizar e torná-la viva para que continue dando muito orgulho não só ao Maranhão, mas a todo o Brasil.

Imagem destacada / bustos de escritores representando o Pantheon Maranhense, no largo contíguo à praça Deodoro, no Centro de São Luís

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ABJD apresentará superpedido de impeachment contra Jair Bolsonaro

Elaborado por um grupo de advogados da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) o superpedido de impeachment contra Jair Bolsonaro será apresentado à Câmara dos Deputados na próxima quarta-feira, 30, às 14h, por partidos, parlamentares de esquerda, centro, direita, entidades, movimentos sociais e pessoas físicas.

A decisão foi tomada quinta-feira, 24, em reunião virtual ampliada. A peça inclui o conjunto de crimes cometidos pelo atual presidente da República desde que tomou posse em 2019, sendo a maioria os crimes cometidos durante a pandemia, que resultaram na morte de mais de 500 mil brasileiros.

O protocolo do pedido será acompanhado de ato político com participação das lideranças políticas e sociais e aberto à participação popular. Os responsáveis pela apresentação do pedido concederão entrevista coletiva após protocolar o documento.

Fonte: Associação Brasileira de Juristas pela Democracia / ABJD

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Entenda os conceitos da sigla GLBTQIA+

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Reflexões sobre Lázaro

Texto do filósofo Marco Rodrigues

Tendo percebido uma ampla confusão nesse debate, como filósofo resolvi me posicionar e apresentar algumas considerações e sutilezas. 

Ninguém precisa lamentar ou compadecer, tal disposição seria falsa, mas também nada faz sentido  de forma prazerosa a desgraça. Regozijar-se com o horror é um sintoma de corrosão da alma. O assassínio, seja de quem for, é sempre um acontecimento brutal. Quando essa linha é cruzada, diminuímo-nos mesmo quando isso parece ser necessário.

Não estou dizendo com isso que não possa ser natural desejar o pior a alguém como Lázaro. Muito pelo contrário, considero até que devemos, numa primeira acepção, realmente sentir tais impulsos, e que seria estranho, e amplamente desumano, não sentir acometer-se por tais ímpetos de revolta. Talvez aí esteja, em crisálida, nosso senso primitivo de justiça. Porém, olhando-se no espelho, antes de levar a cabo tudo o que se sente genuinamente, não seria estranho enxergar em nós o rosto demoníaco de tudo o que odiamos?

Quero dizer com isso que a reprodução do horror não deixa de ser também o horror mesmo quando praticado pelo dito “bem”. Essa mesma imagem pode se ampliar para ideia de civilização, isto é, o que a diferiria da absoluta barbárie?

Eu também, confesso, desejei piamente a morte de Lázaro, pensando em todo sofrimento que foi capaz de causar a tantas pessoas.

Pensei que eu mesmo o mataria se o encontrasse, quiçá teria feito até mais. Quem sabe não tivesse me satisfeito com 125 tiros, não culpo os policiais. Como disse, eu poderia ter feito até pior. Mas posso falar apenas por mim. Quem sabe não o teria esquartejado e até coletado seu sangue para dar de beber aos vermes? Abriria seu crânio, arrancaria os miolos e arrastaria escrevendo no asfalto a palavra “assassino”… Não seria sublime?

Mas, isso seria a minha assinatura ou a dele? Ou ambos?

Tudo isso provavelmente eu faria… Sim, faria, estou sendo sincero… Você não? Mas, tornar-me-ia melhor que Lázaro por essa razão? Meus atos seriam menos atrozes, apesar de entender, de repente, que merecia ele tudo isso?

A descrição de tudo o que eu realmente faria, esquecendo por um momento quem eu sou, teria sido menos perverso que os homicídios, com requintes de crueldade, de Hannibal Lecter?

Então, não é o que sentimos em dado momento o que importa, mas o que podemos realizar para o nosso “tornar-se”. Depois de minha obra de brutalidade, tentaria encontrar alguma diferença não naquilo que sou ou acreditava ser, mas naquilo que fiz e descobriria com isso um semelhante desejo de sangue, dor e violência, mesmo que tudo isso se resumisse num único ato.

Com sangue nas mãos, ao sentar-me para almoçar com a minha família, eu ainda seria o mesmo?

Raramente paramos para pensar se o que sentimos e pensamos é o que realmente deveríamos sentir e pensar no calor do instante. Realizando um autoexame, por diversas vezes encontrei em mim iniquidades inimagináveis, monstros terríveis com incontáveis cabeças.

É, por essa razão, que a ideia de Justiça se torna indispensável. Não se trata do que queremos ou sentimos, mas do que pode nos colocar num patamar de humanidade compatível à ideia de civilização. Como pensara Thomas Hobbes, precisamos criar mecanismos melhores que nós mesmos. Do contrário, tudo estará perdido e tragado pelo vale das sombras do ódio.

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A fome como negócio e o roubo de alimentos

A indústria agroalimentar global se especializou em fazer negócios a partir da extração de mais valia do trabalho intergeracional de agricultores e dos recursos naturais. Achatam preços da produção para o agricultor, exploram trabalho análogo ao de escravo, capturam grandes extensões de terras, água, expropriam famílias e povos de suas casas e territórios, aplicam grandes volumes de agrotóxicos, muitos deles proibidos em seus países de origem na Europa. E ainda, a produção interna ofertada ao mercado nacional é mais cara que a soja, as carnes e as frutas e legumes que chegam à Europa e aos EUA.

Assista à primeira de uma série de lives que integram o especial Diálogos Inconvenientes.

Participam: João Pedro Stédile (MST), João Peres (Joio e o Trigo), Maria Emília (Fase/ANA)

Mediação: Bel Coelho (chef e ativista)

Link: https://www.youtube.com/watch?v=RaF_WrW4gDI

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Comunicação popular em pauta no Brasil

O seminário Tecendo a Comunicação Popular, organizado pelo Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) e pela Fundação Rosa Luxemburgo, irá reunir, nos dias 22, 23 e 24 de julho, professores, coletivos e organizações populares, do campo e da cidade, para dialogar sobre o cenário da comunicação popular e comunitária em todo o país.

O objetivo é construir um espaço formativo e humanizado para reflexões sobre as perspectivas da área diante do cenário desafiador que vivemos, debater temas, segmentos e linguagens do universo da comunicação popular, além de compartilhar experiências e estratégias de fortalecimento das iniciativas.

A ideia é fazermos um mergulho na teoria política, na história, na economia e na cultura do Rio de Janeiro.

Tudo começa com uma imersão de 3 dias em um seminário nacional de Comunicação Popular.

Veja aqui: https://nucleopiratininga.org.br/seminario-tecendo-a…/

Depois teremos aulas quinzenais aos sábados pela manhã.

A ideia é nos unirmos, nos fortalecermos, renovarmos laços, fazer fofoca, matar saudade. Para mais informações e inscrições, acesse:

https://nucleopiratininga.wixsite.com/seminariocompop

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Horror e esplendor nas caminhadas de Walt Whitman pela América

Para ler e ouvir. O poeta Celso Borges resenha e interpreta trechos da obra Dias exemplares, do escritor Walt Whitman, fundador da poesia moderna americana com Folhas de relva. Ao navegar na leitura de Dias exemplares, Borges encontra a catarse de WW nas páginas de um livro em que o autor relata os horrores da Guerra de Secessão e posteriormente as belezas naturais dos Estados Unidos

Veja abaixo a resenha e ouça os trechos de Dias exemplares

Celso Borges

Andei tateando esperança nos últimos dias e a encontrei depois de um café com afeto na casa do amigo Fernando Abreu. Ela estava num pequeno livro que ele me emprestou, Dias exemplares, reunindo os diários de Walt Whitman (1819-1892) sobre suas caminhadas pela América do Norte no século 19, entre 1863 e 1882. A radiografia telúrica dos passos do bardo libertário pelos Estados Unidos está numa linda edição numerada, de 2019, da editora Carambaia, com tradução e posfácio de Bruno Gambarotto.  

Na época em que esses diários foram lançados pela primeira vez, em 1882, eles foram recebidos como um volume gêmeo de Folhas de relva, obra fundadora da poesia moderna americana, que Walt Whitman praticamente reescreveu durante toda a vida. Publicado inicialmente em 1855, Folhas de relva teve outras seis edições, a última delas em 1881.

Dias exemplares começa em 1863 como um projeto de narrativa sobre a Guerra da Secessão (1861-1865), que aboliu a escravatura nos Estados Unidos, mas matou milhões de americanos. Naquele momento, Whitman é, nas palavras de Bruno Gambarotto, “o enfermeiro (wound-dresser), bardo instalado no coração do país dilacerado para cuidar de suas chagas, que substitui o poeta provocador de 1855, o sábio de 1856 e o dândi desiludido de 1861”.

Livro traduz guerra e paz na escrita de Walt Whitman

A guerra devastou o país. Whitman percorre acampamentos, hospitais e enfermarias, de norte a sul, visitando e conversando com os soldados, muitos deles próximos da morte. Quase toda a primeira parte do livro relata esses dias dolorosos e posso, por isso, chamá-los de Diários de Guerra. A forma como o poeta trata e acompanha os americanos feridos é comovente. Whitman fala com ternura com alguns deles, leva-lhes conforto, às vezes um pedaço de biscoito, uma flor, frutas, doces. Outras vezes escreve para os parentes dos soldados. Todo esse sentimento se transfere para a prosa demasiadamente humana, que percorre as páginas do diário.

A verdadeira guerra nunca entrará nos livros, anuncia o poeta na página 139:

Os anos do futuro jamais conhecerão o inferno fervilhante o negrume do pano de fundo infernal das incontáveis cenas menores e interiores da Guerra da Secessão; e é melhor que não o conheçam – a guerra real nunca entrará nos livros. Nas influências piegas dos tempos atuais, também, a atmosfera nervosa e os eventos típicos daqueles anos correm o risco de ser totalmente esquecidos. Passei noites em vigília ao lado de um homem doente no hospital, alguém que não sobreviveria muitas horas. Vi seus olhos brilharem e arderem enquanto se levantava e recobrava as crueldades infligidas ao seu irmão rendido e as mutilações do cadáver depois…….

Essa foi a guerra. Não foi uma quadrille em um salão de baile….

Whitman adoece durante a secessão, tem crises de fraqueza, tontura. Isso se intensifica nos anos seguintes, culminando com um derrame cerebral, em 1873, que o deixa coxo. 1874 e 1875 são dois anos difíceis, de recuperação lenta, mas que traz bons resultados. O poeta passa semanas a fio, meses inteiro no campo, num local recluso e rural ao longo do riacho Timber, afluente do rio Delaware. Ali fica na casa dos amigos Stafford, entre o riacho, campos e trilhas próximas.

Do horror ao esplendor

Whitman não voltará a se locomover como antes, mas retoma, em 1876, suas caminhadas e, com ela, a segunda parte dos Dias exemplares, que nomeio como Diários da Natureza. Neles, saúda a exuberância da paisagem americana, viajando e passeando nos seis anos seguintes, entre lagos, montanhas, vales e pradarias. A pé, de barco ou de trem, atravessa a América com seus rios volumosos, entre eles o Mississipi e o Delaware, sob o manto de estrelas cintilantes em meio às constelações de Orion, Ursa maior, Escorpião, Touro, a Aurora Boreal, a rubra Aldebarã e outros quadrantes de luz.

Walt Whitman pousa o corpo e os olhos na América rural. No contato com a natureza, busca recuperar o vigor perdido nos anos anteriores. O que tem à frente durante os longos passeios é o espetáculo maior da mãe terra com suas revelações de luz, brisas de setembro roçando as copas das arvores. Ora ouve um passarinho cantando ao longe embalado pelo silêncio ao redor, ora vê deslumbrado um arco-íris se levantando no fundo do céu quando o vento mudou de direção e as nuvens rapidamente se abriram como cortinas.

Tudo parece divino nesses dias exemplares. Deslumbrado, o poeta é capaz de ouvir grilos e gafanhotos a 200 pés de distância, enquanto se veste de sombras entre álamos, nogueiras e carvalhos no exercício de sua prosa diária. Toma banhos nus e solitários e enumera listas de flora e fauna, que ouve e vê no corpo colorido e libertador da natureza que o cerca. Na página 214 saúda as flores silvestres:

… oceanos delas dão contornos às estradas através dos bosques, demarcam os limites dos cursos d’água, crescem ao longo das antigas cercas e espalham-se em profusão sobre os campos. É muito comum ver uma flor de oito pétalas amarelo-ouro, clara e brilhante, com um tufo marrom no centro, quase tão grande quanto um meio dólar de prata; ontem em um longo percurso, observei que elas ocupavam densamente as margens dos riachos por toda a parte. Há também um lindo mato coberto de flores azuis (o azul das velhas xícaras chinesas bastante estimadas por nossas tias-avós), que sempre paro para admirar… Deixe-me dar os nomes de algumas dessas flores perenes e ervas amigáveis que conheci por aqui em uma ou outra estação em minhas caminhadas:

Azaléia silvestre, madressilva silvestre, rosas silvestres, varas-de-ouro, erva piolheira, açafrão da floresta, lírio do charco, trombeta, manjerona cheirosa, ageratina, selo-de-salomão, erva cidreira, hortelã, gerânio silvestre, heliotrópio silvestre, bardana, dentes-de-leão, feiterinha, coreópsis, ervilha silvestre, madressilva, sabugueiro, caruru-de-cacho, girassol, camomila, violetas, clemátis, sanguinária, magnólia, asclépia, margarida silvestre, crisântemo silvestre.

Enquanto lia as páginas desse Dias Exemplares, tentei de alguma forma me transportar para a exuberância daquela luz que aquece o corpo do poeta enquanto ele ouve os assovios que o circundam e o embalam e sente na pele os ventos americanos. A intensidade dessa percepção, tanto da guerra quanto da natureza, me levou a gravar algumas páginas desse diário, me aproximando mais uma vez do espírito poético desse artista que descobri no começo dos anos 1980, traduzido por Geir Campos, num pequeno volume da coleção Cantadas Literárias, da editora Brasiliense.

A partir desse encontro, WW tornou-se para mim uma referência cada vez mais libertadora do verso livre que ele inaugura e que se seria um instrumento importante e definitivo para a poesia que se espalhou pelo mundo no século 20.

Áudios do horror: Diários da Guerra

Um soldado de Nova York

A morte de um herói

Um soldado ianque

Áudios do esplendor: Diários da Natureza

Pequenas cenas de outono

O céu – dias e noites – felicidade

Dias e noites do verão maduro

Melhor vista das cataratas do Niágara

https://youtu.be/pTrHEPyr3jo

Calor em Nova York

Imagem destacada / divulgação / Walt Whitman / capturada neste site

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Globo & Bolsonaro: entre tapas e beijos

Ed Wilson Araújo

As Organizações Globo estão mesmo atritadas com Jair Bolsonaro?

Aparentemente, sim.

Mas, se você atentar bem, a rixa entre eles é limitada às questões morais e comportamentais do presidente em relação à pandemia covid19.

Afinal, uma dama fina da burguesia midiática não consegue conviver bem com um homem grosseiro, que despreza a vida, ignora a pandemia, agride jornalistas e chama de lixo a nossa senhora da tela brasileira.

Fora o atrito moral com o presidente, as Organizações Globo estão de paz e amor com a agenda econômica ultraliberal do bolsonarismo, tocada a ferro e fogo pela equipe econômica de Paulo Guedes, com apoio do velho Centrão no Congresso Nacional.

Veja, por exemplo, como o Jornal Nacional e os outros conteúdos noticiosos abordam as privatizações e as reformas previdenciária, trabalhista e administrativa?!

Durante todo o processo de tramitação da reforma da Previdência os telejornais globais trataram Paulo Guedes como o príncipe do capitalismo “moderno”. O ministro não era apenas exposto exageradamente nas matérias. Ele era louvado como um garoto propaganda dos banqueiros interessados em destruir a Previdência Pública e a Assistência Social para implantar o regime de capitalização.

“Precisamos economizar R$ 1 trilhão”, dizia o globalíssimo Paulo Guedes no famoso bordão sobre a reforma previdenciária, enquanto seu chefe Jair Bolsonaro tocava a boiada no parlamento.

Aquilo não era jornalismo e sim uma campanha publicitária contra a Previdência pública.

Na Globo News, todos os programas de análise política e econômica sincronizam o mesmo discurso: “é preciso reduzir o Estado”, “as reformas são urgentes e inadiáveis”, “o Brasil vai quebrar se não fizer as reformas” e por aí vai.

Miriam Leitão é a principal representante da catilinária ultraliberal de Paulo Guedes. Ela é a mesma jornalista que dinamitava a política econômica do PT. Você lembra?

Leia mais sobre Miriam Leitão em “Detalhes tão pequenos de nós três”

Então, é assim. As Organizações Globo implicam com Jair Bolsonaro porque ele não usa máscara de proteção, mas se lixam para a perda de proteção dos direitos trabalhistas e previdenciários do povo brasileiro.

Muita gente boa anda encantada com os editoriais do Jornal Nacional e aquelas interpretações sentimentais de William Bonner e Renata Vasconcelos nas rixas com o presidente.

Ele merece sim ser repudiado por todas as atrocidades cometidas desde a campanha eleitoral e até o presente momento da pandemia. Não há dúvidas de que Jair Bolsonaro é desumano e deve ser combatido.

Porém, não esqueçamos que o bolsonarismo é um subproduto do golpe contra a democracia orquestrado com a participação de uma parte do sistema de Justiça, do parlamento mercenário e das Organizações Globo liderando uma campanha contra o PT, as esquerdas em geral e as instituições.

É sempre bom lembrar que as peças jornalísticas globais movimentaram o xadrez político para criar uma corrente de opinião majoritária e avassaladora que acusou, julgou e condenou a democracia no Brasil.

As Organizações Globo integram o consenso hegemônico da elite econômica e política em todos os governos. Ela funciona como o partido único do capital. Se os interesses dessa casta forem afetados, haverá reação.

Sabemos que a hegemonia é um processo atravessado por contradições e a mídia de mercado opera na movimentação das forças políticas entre a dominação e a emancipação, sempre optando pelo lado da elite opressora.

O jornalismo global torcia o nariz até mesmo no cenário da política econômica do PT que privilegiava a burguesia e fazia algumas concessões aos pobres.

Então, quando a elite econômica percebeu que o PT ficaria uma longa temporada no poder e não dava sinais de radicalizar a política econômica no caminho ultraliberal, veio o golpe com a participação expressiva do espírito de Roberto Marinho.

Agora o cenário é ideal. Paulo Guedes é o garoto propaganda e o operador agressivo das privatizações, das reformas e de toda a agenda radical do bolsonarismo contra o Brasil.

É assim mesmo, passando o trator e a boiada. Afinal, o agro é pop, o agro é tech, o agro é tudo.

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Por que ‘picotavam’ as pedras de cantaria nas calçadas de São Luís?

Ed Wilson Araújo (jornalista e professor da UFMA)

Materiais da arquitetura portuguesa aplicados nas ruas, praças e em parte das edificações do Centro Histórico de São Luís têm referência na vigência da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e do Maranhão, na gestão do Marquês de Pombal, nos fins século XVIII e início do XIX.

Baseada em farta mão de obra escrava, a elite portuguesa concentrava dinheiro e poder. A pujança dos negócios favorecia a adaptação de São Luís a alguns parâmetros da arquitetura de Lisboa. Na época, a capital lusitana estava sendo reconstruída após ser devastada por um terremoto, em 1775.

A elite lusitana, formada por latifundiários e comerciantes instalados em São Luís, adaptava alguns padrões de construção de Lisboa para a capital maranhense. Entre os materiais utilizados na arquitetura estavam as pedras de cantaria, que vinham de Portugal transportadas nos lastros dos navios.

Detalhes das calçadas de São Luís em 2021. Foto: José Reinaldo Martins

No artigo “São Luís: uma urbstranscolonial”(publicado no livro “São Luís 400 anos: (con)tradições de uma cidade histórica”, o pesquisador Josenildo de Jesus Pereira contextualiza o uso das pedras de cantaria nas adequações do espaço urbano de uma cidade marcada pela cultura escravocrata.

Entre as mudanças ocorridas na Província no início e meados do século XIX, Josenildo Pereira aponta: a acentuada presença inglesa; a independência política; o lento processo de interiorização da Metrópole; a abdicação do Imperador; as reformas políticas na Corte do Rio de Janeiro; as lutas sociais no campo, como a Balaiada; as fugas de escravos e os quilombos.

Nas páginas 136 e 137, escreve Josenildo Pereira:

“Dada a maior presença do poder público no cotidiano da cidade, o seu perfil urbano foi sendo modificado por meio de pressões de uma série de posturas. Os passeios públicos em geral passaram a ser calçados com pedras de cantaria vindas de Portugal como lastro dos navios. Essas pedras eram lavradas em blocos retangulares de aproximadamente 80cm de comprimento por 50cm de largura. Com o tempo e o passar contínuo dos transeuntes, ficavam lisas, polidas, escorregadias. Por essa razão foi aprovada a Lei de nº 08, que em seu artigo 220, determinava que:

Os proprietários que tiverem os passeios de suas casas calçadas com pedras de cantaria são obrigados a picá-las de três em três anos, nos meses de dezembro e janeiro sob pena de multa de 20$ reis e de ser feito esse trabalho pela Intendência por conta do Infrator.

Advertimos, entretanto, que todo esse esmero para com a cidade realizava-se, em grande parte, graças ao trabalho de escravos e, também, aos recursos econômicos advindos da agroexportação pautada, sobretudo, na cultura algodão, ao comércio importador e exortador de suas casas comerciais, dinamizadas com a presença inglesa.

Foi nesse meio urbano da cidade de São Luís, particularmente, na área demarcada pelas Praias Grande e do Desterro e Fonte do Ribeirão, lugares onde eram praticadas as atividades financeiras, comerciais, portuárias e onde vivia parte da elite econômica em seus sobrados e casarões, que a escravidão urbana se desenvolve. E, desse modo, os trabalhadores escravos ficaram envolvidos em uma rede de várias atividades: ofícios, comércio e serviços domésticos.”

Fonte de pesquisa

São Luís 400 anos: (con)tradições de uma cidade histórica. Organizadores: Alan Kardec Gomes Pacheco Filho, Helidacy Maria Muniz Corrêa, Josenildo de Jesus Pereira. São Luís: Café & Lápis; Ed. UEMA, 2014. 341p.

Imagem destacada / calçadas na rua Portugal, Centro Histórico de São Luís / capturada aqui