Ed Wilson Araújo
As indústrias do veneno e dos transgênicos têm várias formas de elogiar seus estragos. Uma delas é a ostensiva propaganda do agronegócio no horário nobre da televisão.
Não se trata de um simples anúncio. A peça publicitária propagandeia uma fórmula de sucesso para um ramo da economia muito influente nas decisões políticas – o latifundiário contemporâneo, pop.
Observe as conexões. Uma rede multinacional de sementes transgênicas e adubo tem relações intrínsecas com as usinas de veneno usado largamente no Brasil.
A televisão entra no circuito para ativar uma forma de ver o mundo pela lógica do capital e do lucro sem limites. É ideológico mesmo!
No filme publicitário está contida a intenção de levar a audiência a crer no milagre da lavoura, como se ela fosse algo tão presente na vida que a gente se torne refém dela, cativo.
A ideia de cativar o interlocutor visa reforçar nele algo que já era latente ou despertar no alienado alguma ideia, geralmente de prosperidade, sucesso, lucros, méritos, satisfação e…. nacionalismo. Aí está uma pista.
Com um forte apelo de amor à terra, culto ao campo, louvação do setor produtivo e tantos outros engenhos cinematográficos, o filme publicitário é uma elegia ao homem da terra abençoada.
É mais ou menos uma adaptação da carta de Pero Vaz de Caminha aos interesses do agronegócio. Nessa terra, se plantando, tudo dá!. Acréscimo: desde que o governo ajude.
E ajude mais que o trabalhador rural comum, expropriado e agora ameaçado até de morrer à míngua, sem amparo do Estado na velhice, como promete a reforma da Previdência.
Por outro lado, no agronegócio prepondera o empresário liberal que odeia o Estado, mas é useiro e vezeiro dos empréstimos dos bancos públicos para financiar a produção. Quando é para defender seus interesses privados usufruindo do erário, essa gente supostamente detesta benefícios oriundos da veia estatal.
A hipocrisia consiste em uma dualidade: só o investimento privado é capaz de salvar a humanidade, contanto que seja financiado pelo BNDES.
Embora seja um nacionalismo de fachada, o “agro é pop” chega ao imaginário do povo pela tela da TV. E a gente nem percebe direito o que se diz quase sem querer.
O agronegócio é a versão high tec das formas arcaicas do Brasil colonial naquilo que tem de essencial – concentrador de riquezas e destruidor do meio ambiente. Nos dias de hoje, essa indústria rural, de perfil excessivamente conservador, constituiu uma parte da base política do bolsonarismo.
As bandeiras do agronegócio, em nome do lucro a qualquer custo, são: destruição das leis ambientais, facilitação do veneno e um imperioso apelo à monocultura como fórmula de sucesso para manter o superávit da balança comercial.
Não é à toa que o governo Bolsonaro tem vigor nas bancadas do boi e da bala, setor onde as bandeiras como a liberação de compra e venda de armas prospera no Congresso Nacional.
Essa agenda em parte justifica a onda de ódio desencadeado no país contra o MST, agricultores familiares, quilombolas, indígenas, ambientalistas, povos e comunidades tradicionais, direitos humanos e afins.
No geral, este campo político passou a ser tratado como inimigo do Brasil porque prega a agricultura sustentável, a repartição das terras, o controle do veneno e a produção com limites à predação.
Trata-se de uma demonstração concreta de que divisão da terra, a cultura em pequena e média escalas, a agricultura familiar e a preservação das áreas ambientais, estas sim, são ações ativas e concretas de um sentido equilibrado de desenvolvimento.
O leitor com discernimento entende que esse artigo não é um ativismo. Países de inspiração socialista como a gigante China não cuidam do meio ambiente como deveriam. Assim, não se trata de uma oposição ao agronegócio por ser um empreendimento do capitalismo. E também estou longe de uma associação imediata à ideia de que o rural é atraso e a vida urbana, progresso. Faço essas observações para seguir adiante nos meus argumentos.
Assim, a primazia da monocultura para computar no superávit da balança comercial tem um custo algo para o Brasil. Basta ver o exemplo correlato da mineração. As tragédias provocadas pela Vale em Mariana e Brumadinho estão comprovando a necessidade urgente de limites à exploração dos recursos naturais.
Armas, veneno, mineração descontrolada e lucro a qualquer custo não têm outro nome – é a ideologia da reprodução do capital.
Em outras palavras, a celebração da violência em todos os sentidos.
Imagem capturada neste site