Logo bem cedo a população de Primeira Cruz é acordada pelos anúncios da venda de carne, peixe, ovos, juçara, farinha e a divulgação dos acontecimentos gerais da cidade, até mesmo avisos de falecimento. As informações são locutadas todos os dias pelo serviço de alto-falante “Voz da Liberdade”, um dos meios de comunicação do município localizado à margem direita do rio Periá, no Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses.
A emissora completa 33 anos em 2021 e faz parte da cena cultural na pequena e charmosa Primeira Cruz, cidade fundada em 1947, com população de aproximadamente 15 mil habitantes, segundo o IBGE.
Ao longo de mais de três décadas o serviço de alto-falante guarda muitas histórias, contadas neste vídeo pelo casal Nilber Santos e Meiricely Santos, gestores e locutores da “Voz da Liberdade”.
Meiricely e Nilber contam as memórias e o cotidiano do serviço de alto-falante
A dupla de locutores revela boas lembranças da era gloriosa da “Voz da Liberdade”, quando a emissora fazia a cobertura jornalística dos principais eventos realizados na cidade. Atualmente o foco é a divulgação dos anúncios publicitários e as campanhas de solidariedade para ajudar pessoas necessitadas.
Primeira Cruz é parcialmente isolada porque ainda não tem ligação rodoviária pavimentada com os municípios vizinhos (a estrada MA-302 está em fase de construção). Mesmo nessas condições, a cidade consegue superar o chamado “deserto de notícias” porque tem produção local de informações veiculadas em três meios de comunicação da própria cidade.
Além da “Voz da Liberdade”, funcionam a emissora via cabo Studio 90º (ouvida nas caixas de som localizadas nos postes da cidade) e a rádio web Studio 90º (acessada pela Internet). Ambas são administradas pelo radialista Orlando Brandão (veja abaixo).
Comparando as grades de programação, a “Voz da Liberdade” prioriza informes publicitários e utilidade pública, enquanto as emissoras Studio 90º veiculam música, anúncios e noticiário esparso ao longo da programação.
Na cidade já chegou a funcionar uma emissora comunitária – Oceânica FM – mas foi desativada.
Primeira Cruz na História
Entre tantas singularidades, Primeira Cruz esteve na rota da disputa entre Portugal e França pelo domínio do Brasil. No início do século XVII, o território serviu de acampamento para as tropas portuguesas chefiadas por Jerônimo de Albuquerque, à época no encalço do francês Daniel de La Touche.
O conflito final entre as duas forças pelo controle do território brasileiro foi a famosa Batalha de Guaxenduba, travada no município de Icatu (veja abaixo).
A opção mais viável é o transporte rodoviário (carro particular, van ou ônibus) até o município de Humberto de Campos (HC), localizado a 182 km de São Luís. Chegando em HC vá até o porto e tome uma embarcação para Primeira Cruz. O deslocamento mais ágil entre os dois municípios é oferecido pelas “lanchas voadeiras” que funcionam como “taxi aquático”. A viagem é rápida (aproximadamente 15 min).
Outra opção é acessar o município de Santo Amaro (a 240 km de São Luís) pela rodovia MA-402 (totalmente asfaltada). Chegando em Santo Amaro, siga para o destino Primeira Cruz pela MA-302. Observação: a estrada MA-302 está em fase de construção e recomendamos o tráfego somente por veículos com tração 4 x 4.
Em Primeira Cruz existem duas pousadas limpas e agradáveis com café da manhã e serviço de restaurante.
Pousada da Cristina: (98) 98721-3818
O Governo do Maranhão está construindo a rodovia MA-320 ligando Primeira Cruz e Santo Amaro – segundo município de maior referência (depois de Barreirinhas) no Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses.
O senador Roberto Rocha (PSDB) vai pensar duas vezes antes de tocar em frente o projeto (nº 465/2018) de alteração no Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM).
Na primeira tentativa de debater a proposição, em uma audiência pública realizada sexta-feira (1º de novembro), em Santo Amaro, o parlamentar sentiu o tamanho da rejeição popular.
Senador Roberto Rocha foi vaiado logo ao chegar na audiência pública
Roberto Rocha foi seguidamente vaiado na chegada, durante a audiência e até mesmo quando se retirava da cidade, tendo de entrar no seu carro com apoio de escolta da Polícia Militar.
Senador Roberto Rocha deixou Santo Amaro sob vaias e escolta da PM
Cartazes
e palavras de ordem com tons de rejeição ao projeto e ao senador deram o tom da
reunião. Havia tanta gente que o evento, iniciado na Casa de Artesanato, teve
de ser deslocado para Clube do Mota, a fim de comportar centenas de moradores
de Santo Amaro, Primeira Cruz e Barreirinhas, os três municípios com territórios
na área do PNLM.
Os moradores se deslocaram da Casa de Artesanato para o Clube do Mota em passeata, entoando cantos, palavras de ordem e até o hino nacional. “O parque é nosso, não queremos que transforme em negócio” foi frase mais incisiva.
População do PNLM foi às ruas se manifestar contra o projeto
Na
população transborda um forte sentimento de que o projeto do senador Roberto
Rocha tem o objetivo de beneficiar a especulação imobiliária, visto que o PNLM
é uma das regiões mais cobiçadas do Maranhão e está no caminho da Rota das
Emoções.
Moradores, ambientalistas, movimentos sociais, pesquisadores, organizações dos povos e comunidades tradicionais observam no projeto uma intenção de transformar a região em um negócio atrativo para a rede hoteleira e as suas ramificações no setor das empreiteiras, bancos e capital estrangeiro, onde só quem ganha são os ricos.
Combate à especulação imobiliária deu o tom das manifestações
Roberto
Rocha, fazendeiro na região sul do Maranhão, sabe o que diz.
Em
um de seus pronunciamentos durante a audiência, sinalizou uma certa intenção
especulativa no local. “Desci de helicóptero num lugar tão bonito que deu
vontade de comprar um terreno, além do que o que eu já tenho”, revelou o
senador. Mas, diante da repulsa do plenário, tentou contemporizar: “vou parar
porque acho que já falei até demais”.
Uma
leitura crítica do projeto visualiza as contradições. Na métrica amplia o
tamanho do PNLM, mas retira o chamado “filé”; ou seja, as áreas mais propícias
aos grandes empreendimentos imobiliários.
Nessa lógica serão excluídas do parque 23 comunidades do total de 60 povoações onde vivem aproximadamente 5 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais da agricultura familiar, extrativistas, marisqueiras, pescadores, artesãs e criadores de animais de pequeno e médio porte.
Comunidades querem reserva extrativista e não especulação imobiliária
Vivendo
em harmonia com os recursos naturais do PMLM, essas comunidades temem que o
projeto de alteração nos limites provoque uma explosão imobiliária e
consequentemente impactos sócio-ambientais nocivos à biodiversidade dos
territórios de Santo Amaro, Barreirinhas e Primeira Cruz.
Nesse
contexto, a repulsa ao PSL nº 465/2018 foi geral no evento de Santo Amaro.
A
audiência também foi esvaziada de uma prometida pompa da representação política
oficial. No release distribuído pela assessoria de Roberto Rocha estava
prevista a participação dos outros dois senadores do Maranhão: Weverton Rocha
(PDT) e Eliziane Gama (Cidadania, ex-PPS). Nenhum dos dois compareceu e nem
mesmo o relator do projeto no Senado, Elmano Férrer (Podemos), do Piauí
Deputados
estaduais e federais também não compareceram.
Sem apoio da bancada
maranhense e rejeitado pelo povo, Roberto Rocha caminha sozinho no parque e
pode até se perder na imensidão das dunas tocadas pelo vento, que sempre muda a
paisagem do lugar.
Cercado de dúvidas e conjecturas sobre o ambicioso mercado de terras, o projeto que revisa a delimitação do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM) será debatido nessa sexta-feira, 1º de novembro, em audiência pública no município de Santo Amaro, a partir das 10 horas, no Centro de Artesanato Casa Branca.
A audiência é convocada pelo senador Roberto Rocha (PSDB-MA), autor do projeto nº 465/2018, prevendo modificações no Decreto nº 86.060, de 2 de junho de 1981, que criou o PNLM, uma unidade de conservação com área de 156.608,16 hectares nos municípios de Santo Amaro, Barreirinhas e Primeira Cruz, no Maranhão.
Estão convocados para a audiência a população de
Santo Amaro, associações, representantes de órgãos ambientais, pesquisadores, movimentos
sociais, prefeitos, parlamentares e o relator do projeto no Senado, Elmano
Férrer (Podemos), do Piauí.
Segundo Roberto Rocha, o projeto tem o objetivo de
promover o turismo sustentável na região, sob o argumento de que na área do
PNLM não é permitida a construção de escolas, unidades de saúde, igrejas e
empreendimentos hoteleiros e de lazer.
De acordo com o projeto do senador, na época da criação do parque, em 1981, foram inseridas na área de proteção “diversas comunidades e núcleos urbanos que tiveram o seu desenvolvimento comprometido devido ao fato de terem sido incluídos em uma unidade de conservação cujas regras de utilização do espaço físico são extremamente restritivas.”
O texto do projeto cita as comunidades de Travosa,
Betânia, Espigão e Vai-Quem-Quer, localizadas em Santo Amaro. “Segundo dados do
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia que
administra o Parque, há 2.654 pessoas morando em locais que oficialmente fazem
parte da unidade de conservação, o que não deveria ocorrer nos termos da
legislação que rege os parques nacionais”, justifica a proposição do senador.
Roberto Rocha propõe a revisão dos limites do PNLM para retirar as áreas onde vivem as comunidades tradicionais. Segundo o argumento do senador, essas povoações foram indevidamente incluídas na área da unidade de conservação quando ela foi criada no início da década de 1980.
Especulação imobiliária no cenário
Entidades representativas dos trabalhadores e
trabalhadoras rurais, ambientalistas e pesquisadores analisam com cautela e
apreensão o projeto. Elas argumentam que a iniciativa do senador visa excluir as
comunidades tradicionais do parque para permitir a especulação imobiliária em
uma região cobiçada pelo denominado mercado de terras.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais e Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) repudiou o projeto. De acordo com a entidade, a proposta atende aos interesses da especulação imobiliária e, se aprovado, deve excluir 23 comunidades que integram a unidade de conservação ambiental.
Segundo a confederação, na área dos três municípios do PNLM vivem 60 comunidades com aproximadamente 5 mil mulheres e homens que sobrevivem da agricultura familiar. Para a Contag, um dos objetivos da revisão dos limites visa beneficiar a especulação imobiliária provocando o deslocamento compulsório dos moradores sem garantir medidas protetivas para as comunidades tradicionais.
Um artista da região compôs até música ensejando críticas à iniciativa do senador.
Música pede a retirada do projeto do senador Roberto Rocha
Pesquisadores ouvidos pela Agência Tambor questionam vários aspectos do projeto quanto aos impactos sociais e ambientais. Ouça aqui e neste link as entrevistas com Benedito Souza Filho e Maristela de Paula Andrade.
Segundo o antropólogo e professor da Universidade Federal do Maranhão, Benedito Souza Filho, as comunidades tradicionais já viviam na região antes da demarcação do parque na década de 1980; portanto, não foram incluídas indevidamente na área delimitada. “Estamos falando de pessoas que habitavam e sobreviviam ali desde o século 19”, esclareceu o antropólogo.
O Ministério Público Federal (MPF) cobra a realização de estudos técnicos com a participação da população para dialogar sobre os impactos ambientais e antropológicos nas áreas onde pode haver modificações de limites, a fim de garantir a proteção do meio ambiente e da diversidade cultural na região.
Pode ser até coincidência, mas a revisão nos limites proposta por Roberto Rocha acontece no curso de outra iniciativa – a inclusão do parque no Programa Nacional de Desestatização. Traduzindo: o governo Jair Bolsonaro quer privatizar a gestão do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses.
O projeto de Roberto Rocha está em análise na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR) do Senado.