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Corte de árvores em São Luís: o buraco é mais embaixo

As obras recentes no Centro Histórico da capital do Maranhão alcançaram a praça Deodoro, a rua Grande e o espaço contíguo da praça João Lisboa e Largo do Carmo, logradouros significativos para a Arquitetura, a Literatura e a História da cidade.

São requalificações importantes, sobretudo para a vida de todas as pessoas que transitam e sobrevivem desses locais nas suas diversas atividades econômicas e culturais.

Incluídas no PAC Cidades Históricas, as obras são realizadas no geral sem acompanhamento sistemático dos moradores, salvo as exceções, como a do cineasta Beto Matuck, que observou a derrubada de um velho e bonito tamboril no Largo do Carmo.

O corte de árvores na cidade é tão comum quanto o transbordamento dos esgotos ou a buraqueira generalizada. A cidade maltratada já é inclusive uma cena incorporada e naturalizada no cotidiano das pessoas.

Os maus tratos ocorrem tanto no coração do Centro Histórico quanto na Zona Rural, onde as violações ambientais e sentimentais são bem mais graves.

Assim, o tamboril decepado, que causou tanta comoção, serve para refletir sobre situações mais complexas como a revisão do Plano Diretor de São Luís e a construção de um porto privado na comunidade Cajueiro.

Do tamboril decepado no Largo do Carmo restou o tronco. Foto: Beto Matuck

Esses dois temas, umbilicalmente ligados, dizem respeito à destruição de milhares de árvores e arbustos, fontes de água doce, manguezais, espécies frutíferas em geral onde viviam e ainda resistem famílias já vitimadas por outras formas “antigas” de violência: discriminação, racismo estrutural e pobreza, apenas para ficar nesses exemplos.

Conforme já dito e repetido várias vezes neste blog, a revisão do Plano Diretor (PD) visa transformar São Luís em uma cidade portuária e industrial para atender aos interesses do capital internacional, da especulação imobiliária e da indústria predatória.

A Zona Rural é, na visão desses empreendimentos, um empecilho que a todo tempo está na mira para ser eliminada ou drasticamente reduzida.

A revisão do PD tem um alvo central: extinguir 41% da Zona Rural do município, justamente na área cobiçada para empreendimentos portuários e já sob influência da expansão dos negócios da Vale e da Alumar. Caso a revisão seja aprovada, serão subtraídos 8.643 hectares na zona rural do município, que passaria de 20.820 hectares para 12.177 hectares.

Uma parte da Zona Rural, Cajueiro e arredores, é pretendida para a construção do porto privado da CCCC (China Communications Construction Company) com a participação da WPR-São Luís Gestão de Portos e Terminais, braço do grupo WTorre. Leia mais aqui.

Há também outras formas de destruição da vida e poluição ambiental na Zona Rural de São Luís.

Vou citar apenas dois exemplos.

Crime ambiental no Gapara foi compensado
com a reforma da praça Gonçalves Dias

Em 2005 este blog reportou dois vazamentos de óleo provocados pela (então) Vale do Rio Doce na região do Gapara. O acidente ambiental foi compensado por um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) que resultou na reforma da praça Gonçalves Dias.

Quem anda e namora no Largo dos Amores talvez não saiba que a reforma do logradouro é fruto da destruição provocada pela Vale na área Itaqui-Bacanga, que eliminou plantações, açudes e criação de animais.

Durante a construção do malfadado VLT, na gestão do então prefeito João Castelo (PSDB), dezenas de árvores foram arrancadas a trator no Anel Viário para executar uma “obra” que todos sabem o desfecho (veja fotos abaixo).

Árvores decepadas para a construção do VLT…
… no Anel Viário, durante a eleição de 2012…..
… retiradas pelos tratores na gestão de João Castelo…
…. que não se reelegeu

Na próxima postagem vamos abordar o que está acontecendo na glamurosa praça das Árvores, no Cohatrac IV, alvo de uma reforma que atropela a vigilância do comitê gestor criado justamente para cuidar do logradouro.

Aguarde…

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A Vale e as tragédias ambientais no Maranhão

Justiça nos Trilhos divulga nota pública sobre navio carregado de minério da Vale encalhado próximo à costa maranhense

A Justiça nos Trilhos (JnT), associação de pessoas, comunidades, movimentos sociais, igrejas, sindicatos e grupos de pesquisa, que atuam em defesa dos direitos das comunidades que vivem nas áreas atravessadas pela Estrada de Ferro Carajás (EFC), nos estados do Pará e do Maranhão, se manifesta publicamente sobre a real ameaça de naufrágio do navio MV Stellar Banner carregado de minério da Vale e que encontra-se encalhado próximo à costa do Maranhão desde o início desta semana. Externamos nossa preocupação com o acidente, tanto pelo risco ambiental às águas e ecossistemas locais como em relação à integridade física e vida dos trabalhadores da cadeia de mineração e logística.

Segundo informações da imprensa, da mineradora Vale e da Capitania dos Portos do Maranhão, o navio Stellar Banner, operado pela empresa sul-coreana Polaris com destino a um comprador em Qingdao, na China, sofreu uma avaria na proa, apresentando “ao menos dois locais com entrada de água nos compartimentos de carga por volta das 21h30 desta terça (25) e começou a afundar no Oceano Atlântico”, a causa pode ter sido uma fissura no casco. A embarcação de 340 metros de comprimento com capacidade para 300 mil toneladas de minério de ferro, encontra-se encalhada em um banco de areia há cerca de 100 km de São Luís, após uma manobra do comandante afim de evitar o naufrágio.

A Marinha disse, em nota, que “instaurou um inquérito administrativo para apurar causas, circunstâncias e responsabilidades do incidente”. E informou que um gabinete de crise foi estabelecido “para tratar os possíveis danos ambientais advindos do encalhe da embarcação ‘Stellar Banner’ e dos planos de desencalhe e salvatagem para a retirada desta embarcação do local”.

Exigimos da empresa Vale e Marinha do Brasil que forneçam informações atualizadas sobre o plano de salvatagem e que sejam adotadas medidas rápidas e eficazes  para controle dos efeitos do vazamento de combustível já detectado e com imagens amplamente divulgadas na mídia. Exigimos informações atualizadas sobre as medidas tomadas pelo IBAMA sobre o caso.

O acidente na costa maranhense gera muita preocupação e questionamento quanto à segurança adotada no transporte de minério da Vale, uma vez que não é o primeiro caso envolvendo esse tipo de embarcação. Em 2011, também no Maranhão, o supercargueiro Vale Beijing, estaleiro sul coreano STX com capacidade para 400 mil toneladas de minério de ferro, também apresentou problemas e risco de afundar no litoral do Estado. No ano de 2017, um navio cargueiro com capacidade para mais de 260 mil toneladas de minério afundou com 24 tripulantes na costa do Uruguai, causando a morte de 22 pessoas. O navio era um Stellar Daisy, operado pela Polaris Shipping, da Coreia do Sul, que transportava minério de ferro carregado no terminal da Ilha Guaíba, da mineradora Vale, no Rio de Janeiro, com destino à África do sul. O jornalista R.T. Watson em reportagem de maio de 2017 para o site Bloomberg, relata que após o naufrágio fatal, navios que atendiam a Vale foram inspecionados e que pelo menos dois deles necessitaram de reparos. As embarcações em questão eram do tipo Stellar, chamados de VLOCs (Very Large Ore Carriers), que eram navios-petroleiros antes de serem convertidos.

O site Portos MA traz histórico dos maiores acidentes já registrados no Complexo Portuário do Estado do Maranhão, um deles causados pela Vale, em 1994, quando ainda era estatal. Em 11 de novembro, o navio Trade Daring partiu ao meio em pleno procedimento de carga, duas partes da embarcação afundaram parcialmente, bloqueando o píer I por mais de um mês. Foi necessária uma “mega operação para liberar o terminal que ficou completamente parado por exatos 35 dias”.

Vale lembrar também o naufrágio da Plataforma Sep Orion no canteiro de obras do Pier IV do Terminal Portuário Ponta da Madeira (TPPM/Vale), ocorrido no dia 30 de setembro de 2012. Esse componente da expansão do sistema Carajás foi construído para aumentar a capacidade de exportação de minério de ferro. Na ocasião, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP 0011645-58.2013.4.01.3700 8 ª Vara da Justiça Federal do Maranhão) contra a Vale S.A e Eusung O&C CO Ltda, na qual houve condenação da Vale a “retirar integralmente as estruturas” que se encontravam submersas na Baía de São Marcos e a recuperar o ambiente da área degradada. A ACP com pedido de liminar foi proposta pelo MPF, em abril de 2013, em “razão da demora na execução do plano de retirada do material submerso”. Havia se passado cinco meses do naufrágio e o material não havia sido removido, trazendo risco à segurança e ameaçando o equilíbrio e preservação do meio ambiente.

Até quando a empresa Vale vai continuar se envolvendo em tragédias ambientais? Como confiar numa empresa que está envolvida nos principais desastres ambientais do Brasil e detém o maior projeto de mineração do pais? Quando a prática empresarial da Vale irá de fato apresentar uma atuação sustentável como a apresentada em suas propagandas? Como o governo ainda permite que essa empresa envolvida em todos esses fatos atue sem uma fiscalização severa e sem ser responsabilizada pelas violações que provoca?

Nós, da Justiça nos Trilhos, seguimos atentos e atentas ao caso e consideramos imprescindível que seja realizado um amplo monitoramento da situação destes navios tanto pelo histórico de acidentes como pelo porte e a potencial capacidade de danos ambientais e humanos graves.

São Luís – MA, 27 de fevereiro de 2020