As campanhas eleitorais sempre trazem novidades, mesmo que sejam retrógradas e antigas, mas recauchutadas. Uma delas é a presença dos pobres na TV e no rádio. Talvez seja esta, a propaganda eletrônica, o único momento de protagonismo dos excluídos.
Vez por outra vejo na TV, na retórica(!) do candidato ao governo Roberto Rocha (PSDB), um lavrador falando da sua condição e dificuldades da labuta da terra.
No começo da campanha eletrônica, o candidato a senador Sarney Filho (PV) colocou no seu programa uma estrela das quebradeiras de babaçu… dona Nice do PT, referência na luta dos oprimidos.
Não condenemos Dona Nice. Ela não tem culpa. É duplamente massacrada pelo capitalismo excludente e pelo assédio no tempo em que vaca desconhece bezerro – a eleição!
Nunca nesta vida, e nem nas outras passadas, o filho de José Sarney foi aliado das mulheres que labutam no coco e no machado, na luta pela preservação das riquezas naturais. Apenas na TV, falsamente.
A televisão tem esse poder de estimular a sociedade do espetáculo, segundo o filósofo francês Guy Debord, traduzindo a ideia de que o povo no geral aparece, mas não participa. E, quando aparece, é sempre na condição de oprimido ou plateia.
Há controvérsias sobre as teses de Debord. Eu gosto das ideias dele, mas tenho simpatia por Martín-Barbero. E não considero deus nenhum dos dois, porque para mim teoria não é religião!
A condição de plateia é um dos argumentos de Debord para criticar a democracia burguesa. O povo, no geral, vota, mas não participa. Tem uma aparência de efetividade na política, mas está na dependência de um líder, guia, guru ou operador, sob o manto do poder econômico. Segundo Debord, o povo é sempre plateia no palco espetacularizado da eleição.
Eis o sentido do espetáculo no qual o próprio oprimido participa da opressão, sob o manto da democracia.
Isso faz todo sentido quando observamos a narrativa da operação Lava Jato, estruturada em capítulos, como série ou telenovela, colocando o povo à espera do novo preso e do espetáculo da operação da Polícia Federal na TV.
A judicialização da política, combinada e articulada à mídia (Rede Globo), é o ápice da construção do espetáculo nas manchetes dos telejornais.
Esta narrativa sempre teve como vilão o PT e “principal criminoso”, “o bandido”, “Lula”, em contraponto ao mocinho “Sergio Moro”. A mídia, em parte, combinada à Lava Jato, construiu esse consenso facilmente adaptável ao senso comum: o mocinho “Sergio Moro” e o bandido “Lula”. É novela, ou não é!?
O pedreiro quando chega a casa, após um dia cansativo de trabalho na obra, assiste ao Jornal Nacional e tende a aceitar a narrativa majoritária. Ou não! Pode refutá-la! Por isso não gosto de igrejas teóricas no âmbito das Teorias da Comunicação.
A arquitetura jurídico-midiática-parlamentar ajudou a construir (ou fortalecer) uma figura singular, no âmbito do fascismo: “o pobre de direita”, eleitor de Jair Bolsonaro. Não devemos condenar essas pessoas, apenas entender a dinâmica da política e as origens do totalitarismo, que estão na mobilização do capitalismo para se adaptar às novas circunstâncias ultraliberais – o mercado é a única narrativa capaz de “salvar” a humanidade.
O inominável, embora seja produto da onda fascista, cresce fora dos meios convencionais de comunicação, pelas redes sociais, mas o debate da TV aberta (TV Globo) será o momento decisivo. A Globo vai aderir à onda ultraliberal?
Veja você como a democracia no Brasil ainda precisa de aperfeiçoamento.
As regras da propaganda eleitoral na democracia contemporânea elaboram o discurso da participação, mas reduzem os excluídos às pequenas aparições caricatas da pobreza e eliminam os partidos menores do horário na TV. Que democracia é essa que impede o PSTU de falar na TV?
Os pobres, quando aparecem reclamando da ausência de políticas públicas nos programas eleitorais dos partidos liberais, são colocados na posição de “inocentes úteis”, ensaiados nas estratégias dos marqueteiros, apenas como linha auxiliar dos poderosos.
Feito este preâmbulo, é fundamental afirmar!
Votamos no 13 sem pestanejar, contra o fascismo. Mas, não basta eleger Fernando Haddad (PT). Se for para repetir os erros de Lula, vale a pena (?!). É fundamental que o novo mandato petista seja o meio para a reconstrução da democracia no Brasil, em sentido pleno, que não será possível discorrer aqui.
No essencial, para fazer justiça ao título desse artigo, é fundamental atender os pobres além do assistencialismo, inclui-los de fato na produção, na economia, na estratégia. E não apenas nos programas eleitorais.
É uma tarefa difícil, porque significa uma declaração de guerra ao capitalismo, ato de afronta à ordem internacional.
Participação, no sentido pleno da democracia, foi reduzida a pequenas aparições dos pobres nos programas eleitorais, reclamando da ausência de políticas públicas, vez por outra colocados na posição de “inocentes úteis” nas estratégias dos marqueteiros.
A democracia é um horizonte; Vamos de Haddad, buscando o caminho, sabendo que será difícil.