Categorias
notícia

Base de Alcântara: ameaçados de expulsão, quilombolas querem ficar em casa, no Maranhão

Reportagem publicada originalmente no Uol

Ed Wilson Araújo

Colaboração para Ecoa, em São Luís

04/04/2020 04h00

O visual tranquilo da praia de Mamuna, no município onde vive a maior população quilombola do país, tem um vizinho incômodo. Do alto das dunas e de frente para o mar é possível ver, do lado direito, a cobiçada plataforma do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão.

Mamuna e as outras povoações do Território Quilombola de Alcântara foram surpreendidas na semana passada com a resolução federal publicada no Diário Oficial da União em 27 de março. Assinada pelo general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República e coordenador do Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro (CDPEB), a Resolução nº11 ordena “providenciar, por meio do Comando da Aeronáutica, a execução das mudanças das famílias realocadas, a partir do local onde hoje residem e até o local de suas novas habitações, incluindo o transporte de pessoas e semoventes [animais domésticos]”. Na prática, a medida pode expulsar de seus lares 300 famílias.

Nenhuma ação oficial sobre a remoção de quilombolas havia sido anunciada até então, embora a liberação do uso comercial da base de Alcântara por meio do Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST), em vigor desde dezembro e firmado entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos em março, já inquietasse há tempos a população local.

Torre do Centro de Lançamento de Âlcantara, no Maranhão (14/09/2018) - Evaristo Sá / AFP
Torre do Centro de Lançamento de Âlcantara, no Maranhão (14/09/2018)Imagem: Evaristo Sá / AFP

Recebida em meio a preocupações sobre o impacto do novo coronavírus nas comunidades, a notícia provocou alvoroço entre os moradores. A resolução determina ações de nove ministérios para efetivar a mudança, mas não estipula prazo nem o número de famílias a serem removidas.

“Em um momento em que ninguém esperava, sai uma resolução dessa e as pessoas ficam aflitas, nervosas, chegando até a adoecer – Dorinete Serejo, moradora da comunidade Canelatíua e coordenadora do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (Mabe)”

Caberá ao Ministério da Agricultura, por meio do Incra, apontar “frações do terreno compatíveis com os reassentamentos de cada comunidade quilombola, considerando, para fins de planejamento, que a área de consolidação do Centro Espacial de Alcântara será desocupada”, detalha o documento.

Quilombolas não foram consultados

Representantes de várias organizações quilombolas contestaram a resolução, argumentando que a remoção só pode ser feita após consulta às comunidades, seguindo as determinações da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“Quando não for possível obter o seu consentimento, o translado e o reassentamento só poderão ser realizados após a conclusão de procedimentos adequados estabelecidos pela legislação nacional, inclusive enquetes públicas, quando for apropriado, nas quais os povos interessados tenham a possibilidade de estar efetivamente representados”, diz o artigo.

Durante o trâmite do acordo para o uso comercial da base espacial de Alcântara, em fevereiro, houve pouco diálogo junto aos moradores. Mas a remoção dos quilombolas não havia sido, ainda, mencionada pelos interlocutores do governo federal.

“Tentamos de todas as formas negociar com as autoridades federais, o governador [Flávio Dino, PCdoB], a bancada maranhense e o presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (Democratas). Antes de votar a AST, nós queríamos que as comunidades fossem consultadas para a gente colocar dispositivos de proteção ao território”, diz o antropólogo Davi Pereira Junior. Nascido em Itamatatíua, uma das comunidades mais antigas do Maranhão, ele assessora os territórios quilombolas da região.

Dorinete Serejo, moradora da comunidade Canelatíua e coordenadora do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (Mabe) - Arquivo Pessoal
Dorinete Serejo, moradora da comunidade Canelatíua e coordenadora do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (Mabe)Imagem: Arquivo Pessoal

A coordenadora do Mabe, Dorinete Serejo, acompanha a relação conflituosa entre os interesses do programa espacial e os das comunidades descendentes de matriz africana há 40 anos. “Nunca tivemos de bater frente a frente, mas se enfrentando pelos caminhos legais, com audiências, reuniões, conscientizando e levando esclarecimento para as comunidades.”

Nessa peleja, organizações locais sistematizaram o Protocolo Comunitário sobre Consulta Prévia, Livre e Informada das Comunidades, um documento com o objetivo de subsidiar e orientar as tratativas com o Estado acerca do Território Quilombola de Alcântara. Assinado por 197 comunidades, o protocolo trata como cláusula “pétrea” o procedimento de consulta, estabelecido na Convenção da OIT e assegurado pela lei brasileira.

Por que a localização interessa

Estrutura do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão (14/09/2018) - Pedro Ladeira / Folhapress
Estrutura do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão (14/09/2018)Imagem: Pedro Ladeira / Folhapress

O Centro de Lançamento de Alcântara é cobiçado pela engenharia aeroespacial pela localização geográfica próxima à linha do Equador, proporcionando economia de combustível do foguete, pelas boas condições climáticas, pela estabilidade geológica e pelo suporte logístico com acesso a São Luís.

Analistas políticos veem ainda a motivação dos Estados Unidos para controlar uma base espacial de posição estratégica na América do Sul, com o acordo comercial firmado entre os países e o consequente apoio dos EUA para a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Entre os 18 integrantes da Câmara Federal e os três senadores do Maranhão consultados para o acordo, apenas o deputado Bira do Pindaré (PSB) votou contra. Presidente da Frente em Defesa das Comunidades Quilombolas, o parlamentar ingressou com um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) visando sustar os efeitos da Resolução nº 11, e diz que vai acionar medidas judiciais para assegurar os direitos das famílias ameaçadas de remoção.

“Não havia nenhuma garantia diante daquela decisão da Câmara Federal [com o AST] de que as pessoas teriam a preservação dos seus territórios – Bira do Pindaré, deputado federal (PSB-MA)”

Embora a bancada federal tenha avalizado o acordo, o Governo do Maranhão, por meio da Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular, divulgou no dia seguinte à publicação da resolução, 28 de março uma nota repudiando o remanejamento.

“É inaceitável repetir equívocos do passado recente, em eventual novo remanejamento, quando sequer foram solucionados os passivos de implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA). Instamos o Governo Federal a reconhecer e respeitar o direito das comunidades quilombolas ao seu território, investindo em tecnologias que permitam a convivência pacífica, colaborativa e contributiva entre os quilombolas e o Programa Aeroespacial Brasileiro”, assinou o secretário Francisco Gonçalves da Conceição.

Famílias e culturas em risco

A remoção pode alcançar 30 comunidades com aproximadamente 300 famílias, totalizando cerca de 1 mil pessoas — o município todo tem 22 mil habitantes. Quem afirma é o antropólogo Davi Pereira Junior. Nascido em Itamatatíua, uma das comunidades mais antigas do Maranhão, ele assessora os territórios quilombolas da região. No levantamento feito junto às organizações locais, o antropólogo estima o impacto total sobre 800 famílias, considerando a tendência de assentar os removidos em áreas já povoadas por outras comunidades no município.

A história da base de Alcântara se prolonga desde a década de 1980, com uma série de episódios. Na foto, a família de José Silva e Margarida Raimunda de Araújo na agrovila do Cajueiro, em 2002. Em 1985, o governo transferiu os moradores de um quilombo na região para a instalação da base. Em 2002, os membros da comunidade relataram que as terras para onde foram transferidos eram improdutivas - Jorge Araújo/Folhapress
A história da base de Alcântara se prolonga desde a década de 1980, com uma série de episódios. Na foto, a família de José Silva e Margarida Raimunda de Araújo na agrovila do Cajueiro, em 2002. Em 1985, o governo transferiu os moradores de um quilombo na região para a instalação da base. Em 2002, os membros da comunidade relataram que as terras para onde foram transferidos eram improdutivasImagem: Jorge Araújo/Folhapress

Em Alcântara, a presença de comunidades negras rurais, formadas por descendentes de africanos escravizados, vem de ao menos dois séculos atrás. No início da década de 1980, ainda na ditadura militar, ocorreu a primeira remoção de comunidades tradicionais para a implantação do CLA. Naquele período houve a desapropriação de 52 mil hectares e o deslocamento de 312 famílias originárias de 23 povoados do litoral, transportadas para sete agrovilas construídas pela Aeronáutica, nas proximidades da sede do município.

Pautada em muito trabalho na pesca, na agricultura familiar, no extrativismo e na criação de animais, a sobrevivência de mulheres e homens do meio rural pobre está diretamente relacionada à quantidade e à qualidade dos recursos naturais. Quando uma família é deslocada do quilombo para a agrovila ocorrem várias mudanças no modo de viver, principalmente na aquisição dos alimentos, comprometendo a segurança alimentar.

Os deslocamentos compulsórios interferem ainda no desmantelamento dos laços familiares e das práticas culturais. Em várias comunidades quilombolas as religiões de matriz africana estão presentes em cultos e terreiros. A iyalorixa Jô Brandão, integrante do Fórum de Mulheres de Axé da Renafro (Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde), classifica Alcântara como terra de encantarias. A Pedra de Itacolomi, exemplifica, é um lugar de oferendas de tantos terreiros do Maranhão, principalmente o tambor de mina.

Nesse contexto, a remoção de uma comunidade envolve também relações com a natureza, os meios de produção, a religiosidade, as práticas e os saberes passados em gerações. “Se os humanos não estão sendo respeitados em dizer que não querem ser deslocados, imagine você escutar ancestrais que são invisíveis, sobrenaturais e respondem de forma diferente na relação com a espiritualidade, a natureza e as pessoas”, compara.

“Nos preocupa muito a resolução porque subentende que não haverá respeito aos templos nem às práticas religiosas das comunidades de terreiro nos quilombos – lyalorixa Jô Brandão, integrante do Fórum de Mulheres de Axé da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde”

Regularização fundiária parada

Enquanto a aprovação do acordo para liberação comercial ocorreu em tempo recorde, a regularização fundiária das áreas se arrasta em um processo judicial. O advogado especialista em direitos humanos Diogo Cabral menciona quatro décadas de conflito envolvendo os quilombolas e as sucessivas gestões na Presidência da República. Entre poucos avanços e muitos recuos, ele cita um progresso em 2008, quando o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) publicado pelo Incra assegurou ao Território Quilombola de Alcântara uma área de 78,1 mil hectares e reservou ao CLA 9,3 mil hectares.

Quando tudo parecia favorável ao andamento da titulação, em abril de 2010 a medida foi contestada pelo Ministério da Defesa e pela própria Aeronáutica. “Ambos requereram a instauração da Câmara de Conciliação da Arbitragem Federal da AGU (Advocacia Geral da União) e a suspensão do processo de titulação”, explica Cabral.

Segundo o advogado Eduardo Corrêa, membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, a regularização fundiária é um passo fundamental para assegurar a permanência das comunidades tradicionais nas suas áreas de origem. Apesar das sucessivas cobranças, judicialização e lutas políticas, a titulação está parada no tempo.

Paralisada também ficou a gigantesca obra da empresa binacional Alcântara Cyclone Space, uma parceria entre o Brasil e a Ucrânia com o propósito de comercializar e lançar satélites do CLA por meio do foguete espacial Cyclone-4, de tecnologia ucraniana. Criada em 2003, a empreitada consumiu R$ 483,9 milhões do Brasil, segundo auditoria do Tribunal de Contas da União, mas a obra não foi concluída e nenhum lançamento chegou a ser feito, rendendo ao foguete o apelido de “sucata espacial”. Em abril do ano passado, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (Democratas), promulgou lei extinguindo a empresa.

No mesmo ano de 2003, uma explosão no CLA matou 21 técnicos civis que trabalhavam na operação de lançamento do Veículo Lançador de Satélite (VLS-3).

Embora não determine o prazo para a remoção dos quilombolas, a Resolução nº 11 estabelece a próxima reunião plenária do Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro em 20 de agosto de 2020. Até lá, iniciativas judiciais e políticas dos movimentos sociais, no Congresso Nacional, no Ministério Público da União e de outras instituições devem ser tomadas para anular as medidas anunciadas pelo governo federal, garantindo a permanência das famílias.

Na quarta-feira (1), a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal pediu que o CDPED não desloque famílias quilombolas de Alcântara, sobretudo neste momento. Em acordo firmado na quinta-feira (2) entre representantes do GSI e do MPF, o governo se comprometeu a não fazer as remoções durante a pandemia.

Imagem destacada: Comunidade rural quilombola no Maranhão / Luís Henrique Wanderley / Agência de Notícia do Estado do MA

Categorias
notícia

Abraço mobiliza parlamentares para aprovar isenção da cobrança do Ecad nas rádios comunitárias

A Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço) e as entidades filiadas nos estados iniciaram uma campanha de sensibilização junto aos deputados federais e senadores para colocar em discussão a Medida Provisória nº 907/2019, incluindo a Emenda nº 17, que isenta as rádios comunitárias do pagamento da taxa mensal cobrada pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad).

Na sua descrição, a MP nº 907/2019 tem várias medidas, entre elas “instituir a Embratur – Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo, como serviço social autônomo, e extingue a Embratur – Instituto Brasileiro de Turismo”.

Sobre direitos autorais, a medida propõe “isentar da cobrança do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição-Ecad a execução de obras no interior de quartos de meios de hospedagem e de cabines de embarcações aquaviárias”.

Veja aqui a descrição completa da ementa da MP nº 907/201.

Várias modificações foram sugeridas à medida, entre elas a Emenda nº 17 apresentada pelo deputado Pedro Uczai (PT-SC), com o seguinte teor: “Não incidirá a arrecadação e a distribuição de direitos autorais a execução de composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas por emissoras do Serviço de Radiodifusão Comunitária.”

O deputado Pedro Uczai, ao justificar a Emenda nº 17, argumenta que “as emissoras de radiodifusão comunitária foram instituídas pela Lei nº 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, com características bastante distintas das emissoras comerciais. Duas dessas características são extremamente relevantes para o contexto da Medida Provisória nº 907/2019, quais sejam: não ter fins lucrativos; e não poder transmitir propaganda ou publicidade comercial”.

Veja aqui a justificativa da emenda.

Com o objetivo de alcançar o apoio dos parlamentares, a Abraço Brasil e as suas associações filiadas (Abraço) nos estados estão distribuindo uma carta (veja abaixo) solicitando apoio de todas as bancadas federais do país com o objetivo de sensibilizá-los a votar favorável à Emenda nº 17 na Medida Provisória de nº 907/19.

A Abraço do Maranhão está distribuindo a carta por e_mail e nas redes sociais para os parlamentares. As rádios também estão divulgando a reivindicação nas suas programações.

Além de cobrar uma taxa mensal fixa de valor elevado para a situação financeira das rádios comunitárias, o Ecad vem ingressando com ações judiciais para obrigar as rádios a pagar pela execução de músicas. Veja abaixo:

Ecad ganha ação contra rádio comunitária de Santa Catarina

Por não pagar Ecad, Justiça proíbe rádio de tocar música

O coordenador executivo da Abraço Brasil, Geremias dos Santos, afirma que a entidade não é contra o pagamento dos direitos autorais, até porque o trabalho dos artistas deve ser valorizado. “Se o Ecad aplicasse uma taxa justa para as rádios comunitárias a gente topava pagar. O problema é que o Ecad quer cobrar valores abusivos das rádios comunitárias, sendo que nossas emissoras não têm fins lucrativos e não podem veicular publicidade como as rádios comerciais”, esclareceu.

Geremias dos Santos cita como exemplo os valores mensais aplicados pelo Ecad para rádio comunitária de R$ 485,52 enquanto para uma emissora comercial de 500 watts a taxa é de R$ 234,77 e em uma estação educativa de 500 watts a cobrança mensal é de R$ 134,16. “Apesar de ter uma variação de cobrança por região, a taxação das rádios comunitárias é muito alta para a realidade financeira nossa. A maioria das emissoras tem dificuldade até para pagar a conta de luz, imagine R$ 485,52 por mês ao Ecad ”, reclamou o coordenador da Abraço Brasil.

Ecad sob investigação

Austero na cobrança dos direitos autorais, o Ecad é acusado de arrecadar dinheiro (em rádios e outras plataformas de exibição de músicas), mas não repassar os valores devidos aos artistas autores das composições.

As sucessivas denúncias contra o Ecad desembocaram na criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

Durante a apuração das denúncias, a CPI levantou que o Ecad cometeu crimes de apropriação indébita de valores, formação de cartel, enriquecimento ilícito e fraude na realização de auditoria.

CPI do Ecad apontou irregularidades no setor de direitos autorais

CPI do Ecad: relatório final sugere 21 indiciamentos e propõe nova lei

Relatório final da CPI do Ecad chega à Câmara

Limites financeiros

As rádios comunitárias são emissoras de baixa potência (25 watts) disciplinadas pela Lei 9.612/98, que impede a veiculação de publicidade e propaganda, mesmo do comércio local de bairros ou vilas, onde as emissoras estejam instaladas. Elas também são proibidas pela legislação de receber verbas publicitárias dos governos federal, estadual e municipal.

A cobrança do Ecad vem sendo um ônus excessivo no orçamento restrito em quase todas as emissoras do país.

“A nossa luta para isentar a cobrança do Ecad visa dar o mínimo fôlego financeiro para as radcom, pois a realidade delas em todo o país é de muita limitação financeira”, reiterou Geremias dos Santos.

CARTA ABERTA AOS DEPUTADOS (AS) E SENADORES (AS)

Exmo. Sr(a). Deputado (a) e Senador (a),

Nós da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária – ABRAÇO Brasil, vimos muito respeitosamente perante Vossa Excelência solicitar seu empenho e o mais absoluto apoio em defesa das Rádios Comunitárias do nosso País.

Considerando a tramitação da Medida Provisória 907/19, de 26 de novembro de 2019 no Congresso Nacional, que trata da extinção da cobrança do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direito Autorais em relação a Quartos de Meios de Hospedagem e Cabines de Embarcações Aquaviárias e da instituição da Embratur – Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo e extinção da Embratur – Instituto Brasileiro de Turismo.

Considerando que através da edição da MP 907/19 o governo federal está extinguindo a cobrança da taxa do ECAD para a exploração de turismo nas embarcações aquaviárias.

Considerando que as rádios comunitárias são proibidas pela Lei 9.612/98 de acessar verbas públicas e privadas de mídia e por isso, passa por dificuldades financeiras. Considerando que somos quase 5 mil rádios comunitárias outorgadas em cerca de 4.100 municípios brasileiros.

Considerando que o Anexo da Lei do 9.610/98 foi revogado e desta forma o ECAD se auto regulamentou através de um dispositivo interno editado de forma unilateral.

Considerando que o Escritório de Arrecadação de Direitos Autorais – ECAD tem promovido ações milionárias na justiça comum contra as rádios comunitárias por falta de pagamento da taxa do ECAD.

Considerando que as taxas do ECAD são de valores altíssimos, o que não correspondem com a realidade das rádios comunitárias que vivem em estado de dificuldades financeiras.

Considerando que as rádios comunitárias não praticam o famoso “JABÁ”, ao contrário, promovem as obras musicais dos artistas locais.

Considerando que a maioria das emissoras comunitárias está nos municípios que tem uma população abaixo de 20 mil habitantes e que tem apenas um único meio de comunicação que são as rádios comunitárias que já provaram a sua eficiência na prestação de trabalho social e cultural perante a população.

Considerando a pandemia do coronavírus no mundo e no Brasil e desta forma, o comércio fechou as portas e a sobrevivência das rádios comunitárias está comprometida através dos apoios culturais.

Diante das considerações expostas acima e sabendo do seu compromisso social diante de nossa Nação, em especial, àqueles que tem mais dificuldade de sobrevivência, solicitamos de V. Sª, a aprovação da Emenda de nº 017, apresentada pelo Deputado Federal Pedro Uczai (PT-SC) que trata da isenção do pagamento do ECAD pelas rádios comunitárias.

Deputado (a) e Senador (a), salve as Rádios Comunitárias da situação financeira caótica que nos encontramos.

Atenciosamente,

Diretoria da ABRAÇO Brasil / Diretoria das Abraços Estaduais / Diretoria das Rádios Comunitárias

Categorias
notícia

Sistema drive-thru vacina quase 2 mil idosos em um só dia

Nesta quinta-feira (2), quarto dia de vacinação em sistema de drive-thru na área de provas práticas do Departamento Estadual de Trânsito do Maranhão (Detran-MA), no Castelinho, foi registrado o maior número de atendimentos diários da ação. Os profissionais de saúde aplicaram 1.954 doses de vacina contra Influenza e gripe H1N1.

A vacinação com atendimento drive-thru começou na segunda-feira (30) e, ao longo destes quatro primeiros dias da ação, foram vacinados 6.054 idosos, fazendo uma média de aproximadamente 1.510 vacinações por dia. A iniciativa faz parte da campanha de vacinação promovida pela Secretaria Municipal de Saúde (Semus) e Secretaria de Estado da Saúde (SES), com apoio do Detran-MA, Corpo de Bombeiros Militar do Maranhão (CBMMA) e Batalhão da Polícia Militar Rodoviária (BPRv).

O Detran-MA está fornecendo a estrutura e a logística para que seja realizada a vacinação utilizando o sistema drive-thru. Além disso, servidores do órgão também estão no local auxiliando na organização do atendimento.

A vacinação prossegue nesta sexta-feira (3), no horário das 8h às 16h, quando serão atendidos somente idosos com nome iniciado pelas letras C e D, de acordo com o cronograma elaborado pela Semus e SES.

Categorias
notícia

Procon do Maranhão alerta para golpes virtuais durante a pandemia do coronavírus

A notícia de que o governo federal sancionou lei que cria o auxílio mensal de R$ 600 para trabalhadores informais é verdadeira, mas criminosos aproveitaram essa informação e a crise causada pelo novo coronavírus para aplicar golpes prometendo o auxílio e, então, roubar dados pessoais das vítimas.

Além de páginas falsas na Internet, uma das formas encontradas pelos criminosos é o uso de aplicativos como o WhatsApp. Nele, os usuários recebem uma mensagem sobre o auxílio e são direcionados para sites espiões, que solicitam o preenchimento de um formulário com seus dados pessoais para ter direito ao saque. 

A dona Lúcia Maria, 53 anos, quase foi vítima do golpe. “Eu recebi a mensagem em um grupo no WhatsApp. Como eu já tinha visto a notícia sobre o auxílio na televisão, achei que fosse verdade e cliquei no link, mas desconfiei quando vi que teria que preencher com meus dados para obter o benefício”, relata a autônoma.

De forma espontânea ou devido ao vírus que pode se instalar no celular, muitas pessoas compartilham a mesma mensagem para outros usuários do aplicativo, levando amigos ou parentes a caírem na fraude também. Por isso, o Procon/MA orienta que, ao receber esse tipo de mensagem, o usuário verifique a veracidade das informações. 

“Infelizmente, existem pessoas que aproveitam o momento de fragilidade para enganar aqueles que estão mais vulneráveis. Recomendamos que as pessoas evitem clicar em links suspeitos e não compartilhem as mensagens sem antes consultar a autenticidade das informações em fontes confiáveis”, reforça a presidente do Procon/MA, Adaltina Queiroga.

Categorias
notícia

Keynes e a OMS têm razão: crítica ao falso dilema

*Marcellus Ribeiro Alves

A crise do coronavírus atingiu o Brasil numa situação econômica já bastante debilitada. Recordemos que em 2019, conforme o IBGE, o PIB brasileiro cresceu apenas 1,1%. A Pandemia, portanto, apenas agudizará uma situação que já era ruim.

Soma-se a isso uma desvalorização brutal do real frente ao dólar, uma natural retração do comércio internacional e uma mega redução do preço do barril de petróleo (que abalarão as finanças dos entes subnacionais).

Para completar o prato indigesto, a absoluta incapacidade do Presidente da República em conduzir ações de enfrentamento da crise de saúde e econômica, impondo a todos um falso debate, sempre centrado na dicotomia Proteção à Saúde ou Proteção à Economia. Assim, para ele, se optarmos pelo isolamento social, teremos uma crise econômica que, igualmente, ceifaria vidas.

O debate é mentiroso e só interessa àqueles que possuem os instrumentos de política macroeconômica (moeda, juros, endividamento e câmbio) e não os adotam. Nenhuma das medidas a seguir propostas significa abdicar das ações de combate à propagação do vírus.

Vejo, absolutamente incrédulo, propostas de enfrentamento da situação surgindo de tristes e carcomidos manuais de economia, abandonados até por seus autores.

Em regra, as sugestões – sob argumento de equilíbrio fiscal- reduzem ainda mais o gasto do governo federal e serão bastante eficientes para gerar um nefasto e impiedoso efeito cíclico, aumentando a recessão que se avizinha.

Não nos esqueçamos que vivemos épocas de guerra e que a teoria econômica de manuais em nada se aplica. Equilíbrio fiscal é importante, mas, neste tempo extraordinário, diminuir o gasto público significa dolosamente matar parte da população de fome (pois reduz a renda agregada, a demanda, o consumo e o investimento e a oportunidade de emprego) ou à míngua, sem assistência do Estado, privando-os de serviços públicos essenciais.

Lord Keynes ensinou ao mundo como superar a crise de 1929: “O Estado devia contratar trabalhadores para enterrar garrafas de dia e desenterrar à noite”. O Governo Federal deve, portanto, aumentar o gasto público e não o reduzir, para minimizar os efeitos da retração econômica.

Uma boa linha de ação foi adotada pela Grã-Bretanha, cujo Estado suporta 80% dos salários dos trabalhadores, com o propósito de evitar demissões. Até Trump já abandonou a cartilha e anunciou um pacote inédito de 2 trilhões de dólares (13 % do PIB) para combater o coronavírus e seus efeitos econômicos.  Na Grã Bretanha e Espanha, a expansão do gasto público é da ordem de 17% do PIB; Na Alemanha, de aproximadamente 20% do seu PIB. No Brasil, não passa de 2% e se pensa em reduzir ainda mais…

Diz a convencional Teoria Quantitativa da Moeda que emiti-la sem lastro leva à inflação. Ainda que fosse realmente válida, ela não funcionaria em situação de guerra, como a que ora enfrentamos. O isolamento das pessoas tem forte efeito sobre a redução da demanda. Aliado a isso, produz, à reboque, uma diminuição na velocidade de circulação da moeda, uma vez que, em razão das incertezas futuras, as pessoas preferem entesourar, guardar seu dinheiro a gastá-lo. É intuitivo o que se afirma: basta olhar o que acontece com o nosso comércio hoje.

Assim, é possível e recomendável ao Governo Federal emitir moeda, sem que isso gere inflação de demanda, pois a procura é quase inexistente e as pessoas estão tendentes a poupar seus recursos.

Neste cenário, as medidas recentemente adotadas pelo Banco Central (como a redução da alíquota do compulsório para bancos de 31% para 25%) são importantes, mas insuficientes para enfrentar uma crise desta dimensão.

Além de emissão de moeda, também é possível reduzir ainda mais a taxa de juros, até o limite percentual da elevação do PIB, sem que isso gere inflação. Como temos um quadro de recessão, é possível chegar com a taxa de juros próxima a zero, a exemplo da medida adotada pelo FED (Banco Central americano).

Deste modo a redução da taxa de juros teria um efeito positivo sobre as contas do governo (reduzindo o valor dos serviços da dívida) e incentivaria o crédito, o investimento, o consumo, ampliando a demanda agregada e aquecendo a economia.

O efeito destas medidas seria ainda maior se viesse acompanhado de facilidades para a ampliação da dívida privada (acesso ao crédito), ainda que por meio da elevação da dívida pública, como fez recentemente a Alemanha. Isso possibilitaria o ingresso de dinheiro novo na economia, que poderia ser destinado a trabalhadores desempregados e para micro e pequenas empresas, salvando-as da falência, de quebrarem.

Em termos agregados, a elevação da dívida pública levaria a uma ampliação da demanda, do investimento e, por consequência, da própria renda, sem que isso significasse renunciar ao isolamento horizontal (ou seja, manter em quarentena todas as pessoas, exceto os profissionais dos serviços essenciais) até aqui o procedimento mais eficiente para combater a propagação do vírus. Em uma situação como a que estamos vivendo, de grave retração econômica, são mínimos os riscos de que um aumento na oferta de crédito possa causar inflação.

Nem mesmo quem devotadamente crê nos manuais de Chicago acredita que isto traria inflação. Evidente também que “o mercado” não veria com desconfiança estas medidas, pois sabe que é a única forma de salvá-lo. É por isso, igualmente, que economistas ortodoxos liberais defendem sem cerimônias algumas destas ideias.

Medidas de proteção à economia e de combate à pandemia não são opções mutuamente excludentes, mas sistemicamente complementares e que, portanto, não devem ser analisados de forma estanque, com desprezo à ciência e com o uso de vocabulário escatológico.

Até este momento – como apropriadamente comparou o Presidente da França -, estamos numa guerra em que o Capitão, por medo, negligência ou ignorância, não quer lutar.   

Felizes as nações que têm, neste momento, um líder sereno e combativo.

* Marcellus Ribeiro Alves é Bacharel em Economia e Direito. Especialista em Direito Tributário. Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil e atualmente Secretário de Estado da Fazenda do Maranhão.

Imagem destacada capturada no site da BBC News

Categorias
notícia

É pior que o coronavírus!

Por Emilio Azevedo*

Publicado originalmente na Agência Tambor em 27/03/2020

O assunto aqui tem relação direta com a ameaça de morte que paira sobre a cabeça de todos nós.

Recebi ontem (26/03/20) uma “notícia” aparentemente boba, veiculada em uma rede social, dando conta que os governadores Ronaldo Caiado (Goiás) e João Doria (São Paulo) “se aliam à ditadura do Partido Comunista Chinês contra Bolsonaro”.

Essa “notícia” poderia ser encarada apenas como uma bobagem ou piadinha inofensiva. Mas ela faz parte de uma rede de mentiras, de uma poderosa máquina de comunicação e desinformação, que vem fazendo grandes estragos no Brasil.

Essa rede faz com que pessoas sigam apoiando, incondicionalmente, Jair Bolsonaro, mesmo após ele falar absurdos e agir agressivamente contra as medidas de prevenção ao coronavirus, definidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Foi a partir dessa máquina de mentiras que Jair Bolsonaro foi eleito presidente, surfando em fábulas como a ameaça de proliferação de “mamadeiras de piroca”. Essa propaganda articulou uma base social que acreditou numa tal “nova política”, viabilizando eleitoralmente uma figura abjeta e caricata, como sendo a única alternativa para combater um “inimigo comum”.

Trata-se de uma máquina milionária, com conexões internacionais, com atuação muito forte em todas as redes sociais, inclusive com a utilização de robôs. Por conta dela, ainda hoje, existem brasileiros que não entendem as ameaças do coronavirus, mas é possível que sigam acreditando nas ditas mamadeiras penianas…

É uma pandemia de ignorância! E se o vírus pode estar do seu lado, essa máquina de estupidez e falácias pode passear rotineiramente no seu celular.

Na opinião desses camicases, que seguem de modo fanático essa engrenagem de mentiras, o mundo inteiro está errado em relação ao novo coronavirus.

Hoje, um bilhão e 300 milhões de pessoas estão em isolamento social na Índia. No Brasil, todos os governadores, de todos os 26 estados, assinaram um documento público informando que estão em total sintonia com a OMS, para evitar o colapso do nosso sistema de saúde. Mas nada disso tem eco nesse universo paralelo, rebocado por forças quase medievais, para quem a Terra pode até ser plana.

E assim, nesse mundo de infindáveis mentiras, um megaempresário como João Doria e um coronel da pecuária como Ronaldo Caiado tornam-se, de súbito, aliados de um “perigoso partido marxista”. E tudo sendo parte de uma conspiração contra um dito“messias”, um “mito”.

O Coronavirus é um problema gravíssimo! E Bolsonaro também é, tendo que ser retirado da presidência do Brasil, por evidentes e sucessivos crimes de responsabilidade.

No entanto, outro problema brasileiro é essa máquina de mentiras, essa proliferação da desinformação, que hoje vem impedindo a união do país, impossibilitando que todos estejam mobilizados em uma só direção, em favor da luta pela vida, a partir da orientação da OMS.

A humanidade precisa vencer o coronavirus e nós estamos dentro dessa guerra terrível. Mas ela vai acabar! E mesmo após todo esse transtorno de hoje, os brasileiros seguirão tendo pela frente este combate fundamental contra a milícia do fake news, que vem atuando no Brasil ao longo dos últimos anos. É um processo que indicará o tipo de sociedade que nós, os brasileiros, teremos no futuro.

Vamos ter que priorizar o combate a esta máquina endinheirada, que promove e potencializa a estupidez,juntando um nacionalismo barato, um capitalismo estrábico, poderosas máfias religiosas, milícias assassinas, somados a muito ódio, preconceitos históricos, muita ignorância e, principalmente, muita, muita, mentira. Juntos, eles mentem sobre o passado, mentem sobre o presente e ameaçam o nosso futuro.

Lembrando que ontem (26/03), Carlos, um dos filhos de Bolsonaro, o mesmo que faria parte do chamado “gabinete do ódio”, se filiou ao partido de Edir Macedo, dono da Igreja Universal do  Reino de Deus. É o mesmo partido de Marcelo Crivella, bispo da Universal, sobrinho de Edir e atual prefeito do Rio de Janeiro. Trata-se da mesma Universal que trabalha contra o isolamento social…

Após a segunda guerra mundial, o mundo se uniu contra o nazismo. Após o drama do coronavirus, o Brasil vai precisar de uma articulação que também priorize o combate a essa máquina mortífera, que se alimenta da desinformação. Falo de uma onda que criminalizou um educador do nível de Paulo Freire e fez de um notório perverso, como Jair Bolsonaro – um sujeito que idolatra torturadores – o presidente do nosso país. Isso é gravíssimo e não pode ser banalizado. É muito sério, gente!

Enfim, acredito que alguns ingredientes óbvios, para as batalhas contra esse outro agente “infeccioso”, passam pela política, por organizações sociais voltadas para democracia e justiça social, por uma autêntica democratização da comunicação, por um investimento profundo em educação, aumentando bastante a aposta no conhecimento e na ciência. A educação precisa ser vista como um desafio social, como um direito de todas as pessoas, sendo pública e de muita qualidade.

Num médio e longo prazo, é o caminho que o brasileiro tem em favor da vida.  Do contrário, poderemos ser um povo dominado pelo mais absoluto obscurantismo, o mesmo que hoje já nos atrapalha na luta contra o coronavirus. Bolsonaro é a ponta do iceberg. E nós já estamos no Titanic.

*Emilio Azevedo é jornalista de São Luís (MA). Um dos fundadores do Jornal Vias de Fato, faz parta da coordenação da Agência Tambor.

**A ilustração que acompanha este texto é de Carlos Latuff, que autorizou sua utilização.

Categorias
notícia

Bolsonaro está em isolamento político

Em tempos de pandemia, existem dois tipos de seguidores de Bolsonaro: os fanáticos e os preocupados.

Os fanáticos irão com o “mito” até o cemitério ou crematório.

Os preocupados pensam nas suas famílias, nas crianças e nos idosos principalmente. Esse grupo, embora continue torcendo pelo sucesso do presidente, não vai embarcar nas irresponsabilidades do seu líder.

Hoje, nem os mais abnegados teriam coragem de mandar seus filhos para a escola.

Político inexpressivo e militar de carreira medíocre, Bolsonaro não tem sequer o senso mínimo de preservação do seu exército em campo de batalha.

Sem qualquer noção de estratégia, faz movimentos que colocam em risco os seus soldados e, simultaneamente, diverge dos próprios generais, entre eles o da linha de frente Henrique Mandetta (Saúde).

Nesse nível de irresponsabilidade, o presidente declarou guerra à Ciência, ao Jornalismo e à Política.

Ele não só contraria a própria equipe de governo como atira nas suas bases da direita e ultradireita.

Até mesmo os governadores da região mais conservadora do Brasil (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) estão seguindo as recomendações científicas.

O médico Ronaldo Caiado, bolsonarista de primeira linha e governador de Goiás, fez declaração pública de rompimento com o presidente.

Caiado não faria isso sem o aval do setor ruralista, sinal de que o segmento forte do agronegócio, onde Bolsonaro tem apoio, está insatisfeito.

A cobertura técnica da pandemia covid19, os sucessivos editoriais dos jornalões e o posicionamento das Organizações Globo, alinhados às recomendações das autoridades científicas, deixam o bolsonarismo raivoso ainda mais isolado.

Entre a indústria de fakenews e as recomendações médicas, a mãe bolsonarista da categoria dos preocupados prefere manter os seus filhos e os idosos vivos.

Basta observar que a “carreata da morte”, convocada para esta segunda-feira (30 de março), foi um retumbante fracasso.

Abrindo guerra contra os governadores, inclusive os seus aliados, o presidente só preserva um tipo de isolamento – o político.

Somados todos esses fatores às sequelas da pandemia na economia, Bolsonaro espera atravessar a crise radicalizando suas posições insanas. É um jogo arriscado.

Fato concreto é o seguinte: após a tempestade ele terá a seu favor os fanáticos raivosos capazes de um suicídio político coletivo.

Isso se ele atravessar a tempestade, pois as suas posições insanas criam um ambiente hostil dentro e fora do governo. As oposições já falam em apeá-lo da Presidência da República.

Mas, Bolsonaro caindo, não significa grandes abalos no conservadorismo. Quando a pandemia passar, os fanáticos e os ex-preocupados voltarão a se reagrupar, com ou sem o “mito” no comando. Vão apenas trocar o nome, mantendo o perfil de uma candidatura à direita ou ultradireita.

Pelo menos por enquanto, o bolsonarismo respira com a ajuda de aparelhos.

Imagem destacada capturada neste site

Categorias
notícia

Alcântara: entidades repudiam ameaça de remoção das comunidades quilombolas

NOTA DE REPÚDIO À AMEAÇA DE REMOÇÃO DAS COMUNIDADES QUILOMBOLAS DE ALCÂNTARA – MARANHÃO

O Sindicato dos Trabalhadores Agricultores e Agricultoras Familiares de Alcântara (STTR), o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Município de Alcântara (SINTRAF), a Associação do Território Quilombola de Alcântara (ATEQUILA), o Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Alcântara e o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (MABE) e as instituições abaixo subscritas, cientes da Resolução nº 11 de 20 de março de 2020 do Gabinete de Segurança Institucional a Presidência da República, publicada no Diário Oficial da União em 27.03.2020, vêm a público repudiar veementemente o teor da referida Resolução, que busca estabelecer, ao arrepio de leis nacionais e internacionais, as diretrizes para a expulsão das comunidades quilombolas de Alcântara de seus territórios.

Consideramos a medida arbitrária e totalmente ilegal, uma vez que afronta diversos dispositivos legais de proteção dos direitos das comunidades remanescentes de quilombo, bem como, tratados e convenções internacionais referidos aos direitos destas comunidades.

Denunciamos ao povo brasileiro que o governo Bolsonaro, submisso aos interesses do governo dos Estados Unidos, além de entregar nossa base de lançamentos, medida que inviabiliza o desenvolvimento de nosso conhecimento e tecnologia aeroespacial, também entrega de bandeja o povo quilombola que vive em seus territórios a centenas de anos.

Exigimos, em um só tempo, o respeito à soberania do povo quilombola sobre seus territórios e soberania do povo brasileiro sobre a base de Alcântara.

Por fim, não admitimos quaisquer possibilidades de deslocamentos e reafirmamos nossa irrestrita e ampla defesa das comunidades quilombolas de Alcântara no direito de permanecer no seu território tradicional na sua inteireza e plenitude. Acionaremos todos os meios e medidas possíveis para resguardá-las.

Os governos passam, mas o povo fica e será soberano sobre seu destino!

1 Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares de Alcântara (STTR)
2 Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Município de Alcântara (SINTRAF)
3 Associação do Território Quilombola de Alcântara (ATEQUILA)
4 Movimento de Mulheres
Trabalhadoras de Alcântara
5 Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (MABE)
6 ABRASCO
7 Acampamento Terra livre
8 Ação Educativa
9 Afrobase – SP
10 Agência Solano Trindade – SP
11 Agência Tambor
12 Agentes de Pastoral Negro do Maranhão
13 Amigos da Terra Brasil
14 Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
15 Associação Agroecológica Tijupá
16 Associação Brasileira de Reforma Agrária – ABRA
17 Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (Anpege)
18 Associação Protetora dos Desvalidos -BA
19 Balaios Livraria
20 Bijari – SP
21 Brigada do Congresso do Povo – MA
22 Casa Amarela de Cultura Coletiva – SP
23 Casadalapa – SP
24 CEBI BAHIA
25 Central de Movimentos Populares
26 Central Sindical e Popular CSP CONLUTAS
27 Centro de Assessoria e Apoio a
Iniciativas Sociais – CAIS
28 Centro de Ciências e Saberes Mãe Anica
29 Centro de Cultura Negra do Maranhão
30 Centro de Pesquisa e Extensão em Direito Socioambiental (CEPEDIS)
31 Coalizão Negra por Direitos
32 Coletivo Aparelhamento – SP
33 Coletivo Imargem – SP
34 Coletivo Madeirista – Porto Velho, RO
35 Coletivo Ocupeacidade – SP
36 Coletivo Política do impossível – SP
37 Coletivo Tralha – SP
38 Coletivo Transversos – DF / SP
39 Comissão Brasileira Justiça e Paz da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CBJP/CNBB)
40 Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo – CDHPF
41 Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e Povos e
Comunidades Costeiras e Marinha – CONFREM Brasil
42 Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e Povos e
Comunidades Costeiras e Marinha – CONFREM Maranhão
43 Comitê da América Latina e do Caribe pela Defesa dos Direitos das Mulheres (CLADEM- Brasil)
44 Condominio Cultural – SP
45 Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil Regional NE 5 – Maranhão
46 Conselho Nacional de Leigos do Brasil – Regional NE 5
47 Conselho Estadual da Política de Igualdade Étnico-Racial – CEIRMA
48 Conselho Pastoral dos Pescadores
49 Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ
50 Creative Commes – SP
51 Diocese de Brejo
52 Diocese de Pinheiro
53 Ecossistema Tropical – BR
54 Ecossistema Tropical – SP
55 Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão – FETAEMA
56 Feira Da Tralha – São Luís
57 FIAN Brasil
58 Fórum Carajás
59 Frente 3 de fevereiro – SP
60 Frente Campesina Americana
61 Frente Parlamentar Ambientalista
62 Frente Parlamentar Mista de Apoio aos Objetivos Desenvolvimentos Sustentável da ONU – ODS – coordenador Nilo Tatto
63 GECA – Grupo de Pesquisas em Geografia Agrária e Conservação da
Biodiversidade do Pantanal da Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT
64 GEDITE – Grupo de Estudos em Dinâmicas Territoriais da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA
65 Geledès – Instituto da Mulher Negra
66 GEOAGRÁRIA – Laboratório de Geografia Agrária da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS
67 GEOLUTAS – Laboratório de Geografia das Lutas no Campo e na Cidade da Universidade Estadual do Oeste do Paraná campus Marechal Candido Rondon – UNIOESTE
68 GERES – Grupo de Estudos Regionais Socioespaciais da Universidade Federal de
Alfenas
69 Gráfica Fábrica – SP
70 Grito dos Excluídos Brasil
71 Grupo de Estudos Rurais e Urbanos (GERUR/UFMA)
72 Grupo de Estudos, Pesquisa e Debates em Serviço Social (GSERMS) – UFMA
73 Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente da Universidade Federal do Maranhão (GEDMMA/UFMA)
74 Grupo de pesquisa Territorialidades e Imaginários na Amazônia-UNIR
75 Horacio Antunes de Sant’Ana Júnior
76 Instituto Maranhão Sustentável
77 Instituto Pacs – Políticas Alternativas para o Cone Sul
78 Instituto Polis
79 Instituto Socioambiental – ISA
80 Irmãs de Notre Dame de Namur
81 Jornal Vias de Fato
82 Jornalistas Livres
83 Justiça Global – JG
84 Justiça nos Trilhos
85 Laboratório de Estudos e Pesquisa sobre Espaço Agrário e Campesinato (LEPEC/UFPE)
86 LAGEA – Laboratório de Geografia Agrária da Universidade Federal de Uberlândia –UFU
87 LERASSP – Laboratório de Estudos Regionais e Agrários no Sul e Sudeste do Pará da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará – UNIFESSPA
88 MAM – Movimento Pela Soberania Popular na Mineração
89 Marcha das Margaridas
90 Marcha Mundial Das Mulheres
91 Marcha Mundial das Mulheres Maranhão
92 Movimento Baia Viva do Rio de Janeiro
93 Movimento de Defesa da Ilha – São Luís/MA
94 Movimento dos Pequenos Agricultores
95 Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terras do Maranhão – MST
96 Movimento Mulheres em Luta – MML
97 Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH Brasil
98 Movimento pela Saúde dos Povos – MSP Nacional
99 MSTC – Movimento dos Sem Teto do Centro
100 NEADEC – Núcleo de Estudos e Pesquisas Agrárias sobre Desenvolvimento,
Espaço e Conflitualidades da Universidade Federal do Pará – UFPA
101 NERA – Núcleo de Estudos, Projetos e Pesquisas de Reforma Agrária da Universidade Estadual Paulista – UNESP, campus Presidente Prudente
102 Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado
103 OCA Maranhão
104 Ocupeacidade – SP
105 Ong Arte-Mojó
106 Parquinho Gráfico – SP
107 Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado – PSTU
108 Pastorais Sociais
109 Pastoral Afro
110 Pastoral Carcerária Regional
111 Pastoral da Aids assina
112 Pastoral da Criança Regional
113 Pastoral da Juventude -PJ
114 Paulestinos – SP
115 Plataforma DHESCA
116 Política do Impossível – SP
117 Potira Floricultura – Florianópolis
118 Programa de Pós Graduação em Cartografia Social e Política da Amazônia
119 Publication Studio São Paulo
120 Quilombo Raça e Classe
121 Quilombo Urbano
122 Rádio Camponesa – Crateús/CE
123 RADIO CANAÃ FM – CE
124 Rede de Médicos Populares
125 Rede Jubileu Sul
126 Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
127 Reocupa
128 Residência Artística Jardim Aberto – JARA – Porto Alegre
129 Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal e MPU do Maranhão – Sintrajufe/MA
130 Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN)
131 SINTES-MA Sindicato dos Trabalhadores em Entidades Sindicais, Órgãos
Classistas, Entidades Não Governamentais e Partidos Políticos no Estado do Maranhão
132 Sociedade Maranhense de Direitos Humanos – SMDH
133 SP Terra Indígena
134 Treme Terra – SP
135 Uneafro Brasil
136 União de Moradores do Taim
137 União Estadual por Moradia
138 Via Campesina

Imagem destacada / Centro de Lançamento de Alcântara / capturada neste site

Categorias
notícia

Paixões, varíola e machismo em São Luís, na novela “Maria Arcângela”, de Erasmo Dias

Ed Wilson Araújo

Organizado pelo poeta Nauro Machado, o livro “Erasmo Dias e Noites” reúne artigos, crônicas, contos, poemas e uma novela, “Maria Arcângela”, ambientada nos desdobramentos da epidemia de varíola ou “bexiga”, nos meados do século 19, quando São Luís vivenciou o isolamento social, quarentena, pânico e morte.

“Foi quando a peste chegou. A última varíola que assolou São Luís. Interditaram parte do Codozinho, pois lá estava o Isolamento, hospital para onde iam os bexigosos.” (DIAS, 2016, p. 358)

A novela se passa na fronteira entre a Belira, o Codozinho e a Madre Deus, onde transbordam variadas paixões : o gosto pela tiquira, os encantamentos por homens boêmios, morte em decorrência da peste, religiosidade, preconceito e a rivalidade entre grupos de bumba-meu-boi.

Sapateiro famoso, Mestre Quirino e sua mulher Rita criavam a filha Maria Arcângela na simplicidade do casebre construído em uma nesga de terra do novo bairro criado após uma ocupação eleitoreira na cidade. Pairava no ar o receio da varíola:

“Tudo foi indo num ramerrão do comum que entedia. O Mestre batendo sola, Rita sempre triste, com medo da invasão, dizia: Maria Arcângela crescendo, bonita, gordinha, mistura racial de homem de cor e mulher brancarana, e já mudando os dentes de leite.

Foi quando a peste chegou. A última varíola que assolou São Luís. Interditaram parte do Codozinho, pois lá estava o Isolamento, hospital para onde iam os bexigosos.

O pânico tomou conta da cidade. A pavorosa passava sem sirene, que não as havia, batendo e retinindo a campainha: era um a mais que ia para o recolhimento do Lira. As escolas todas fecharam. O governo reagiu com uma vacinação domiciliar e compulsória. Foram proibidas as reuniões. Enquanto, porém, a autoridade decretava as suas medidas de salvação pública, o povo, independente e liberto como o é, reagia ao seu modo. Pouco importava que o rabecão, derramando desinfetante, passasse dez vezes por dia, na rua do Passeio, levando os mortos, recolhidos nas residências. Quando o guarda sanitário saída, após a vacinação, a dona da casa dizia: “Vamos passar limão nessa porcaria, que isso é só pus. Credo, a doença dá em quem tem de dar”. Com medo da vizinhança, as famílias escondiam os doentes, argumentando: “O Lira, sim, só quem não sabe, é um matadouro! Da outra vez, vovó se tratou em casa e está a mesminha”. (DIAS, 2016, p. 358)

Observadas as temporalidades, o drama de Erasmo Dias ocorre no contexto da ocupação espacial da cidade, sempre pautada no discurso de que São Luís seria “moderna”, empurrando a pobreza para a periferia.

(Leia aqui artigo sobre a gripe espanhola e o advento da luz elétrica na capital do Maranhão, alusiva à obra “Os degraus do paraíso”, de Josué Montello).

Àquela época as autoridades sanitárias tomaram providências para impedir os sepultamentos no interior das igrejas, onde a convivência misturava os fiéis vivos e os mortos, objetivando ainda inibir a condução dos defuntos em caixões abertos durante os cortejos fúnebres pelas ruas.

Capa do livro Erasmo Dias e Noites, organizado pelo poeta Nauro Machado

Nas áreas cotadas para fazer um cemitério estava a localidade Gavião, hoje um dos tradicionais lugares de sepultamento em São Luís (veja a foto destacada, de Gaudêncio Cunha).

Então, o cemitério passou a ser um equipamento incorporado à ideia de higiene social adequada às medidas sanitárias modernizadoras.

Os conflitos na novela se dão com a descoberta de que Maria Arcângela, até então tida como filha de Rita e Mestre Quirino, na verdade era rebenta do glamuroso cantador de bumba meu boi Edinho. Assim conta Erasmo Dias, nas palavras do cachaceiro (apreciador de tiquira) Romualdo:

“Seu doutô, a finada Rita – a quem Deus a tenha – era do chifre furado. Brancarana bonita e de xandanga, como nunca eu vi. Que o Mestre não me ouça, lá onde todos os dois já estão, mas a pequena, a Maria Arcângela, não era filha dele; era filha do Edinho, que cantava como ninguém e sabia bater um pinho de fazer chorar.

[…]

– Doutô, lhe digo, sobre aquela conversa que as vez a gente fala da falecida Rita, veja como as coisas são: quando ela pegou a lixa lá na Belira, no outro dia Edinho pegou a peste aqui neste Codozinho, que hoje é uma cidade. Todos dois morreram no mesmo dia e na mesma hora.” (DIAS, 2016, p. 359)

A novela se passa nos bairros tradicionais de São Luís: Belira, Codozinho e Madre Deus

Viúvo de Rita, Mestre Quirino criava Maria Arcângela sem saber desse fato. Até que um dia Maria Arcângela aparece grávida. Por coincidência, o pai da criança era outro cantador de boi pelo qual ela se apaixonara perdidamente: Luizinho.

Uma das cenas mais chocantes da novela é a sessão de espancamento verbal e físico protagonizada por Mestre Quirino em sua (até então) filha Maria Arcângela, ao tomar conhecimento de que ela estava grávida e seria mãe solteira, “falada” no bairro inteiro.

A surra só não levou a nocaute a menina porque a velha parteira Nhá Maria Teresa adentrou no barraco arrotando a pura tiquira e flagrou a balbúrdia. Tentando impedir a sessão de violência, durante a discussão com o irado Quirino, ela revelou aquilo que nos bastidores toda a vizinhança já sabia – Maria Arcângela era filha de outro homem, o boieiro Edinho.

Ao saber da traição, Mestre Quirino teve até uma congestão e morreu babando de ódio.

Além do machismo, a religiosidade e o misticismo compõem a trama, como o hábito de passar limão no local da vacina para evitar o pus, registrado nesse trecho:

“A peste se alastrava. Mestre Quirino se vacinou, vacinou a filha e a mulher.

Rita não acreditava, passou limão nas incisões do braço. Dias depois, o febrão, o delírio, a denúncia da vizinhança e dizem que ela morreu de bexiga-lixa, lá no Isolamento, cheia de tantas e dolorosas pústulas, que, nuazinha, rendeu a alma, posta sobre folhas verdes de bananeiras, já que plásticos em aqueles tempos não havia.” (DIAS, 2016, p. 358-359)

Se o limão não resolvesse, a fé ajudava. As procissões em honra a São Sebastião davam o tom do fanatismo religioso:

“A varíola declinou. Nas ruas do subúrbio, ainda que proibidas as reuniões, já não se encontravam os grupos de penitentes, com velas acessas e uma imagem pequenina do Santo, cantando medievalescamente, tomados de fé, as coplas que arrepiavam de um a todos:

Oh mártir de Cristo,
Meu Santo Varão,
Livrai-me da peste
Meu glorioso mártir
Meu São Sebastião”.

Toda a novela é cerzida pela representatividade da cultura popular enaltecida nas brincadeiras de bumba meu boi. Nesse folguedo, o destino de duas mulheres se encontra – a mãe Rita e a filha Maria Arcângela, tocadas pelo feitiço boêmio dos cantadores Edinho e Luizinho.

Parte da novela, nas entrelinhas, aborda as normas sanitárias impulsionadoras do progresso de São Luís. As periferias cresciam como uma espécie de “higienização” do tecido urbano já em meados do século 19, traduzida na hipótese de uma cidade supostamente mais saudável aos seus moradores.

Novamente, a promessa de São Luís “moderna” desfila no terreno da ficção.

Afinal, quando seremos Paris?

Leia mais sobre a promessa de modernidade em São Luís.

Imagem destacada / cemitério do Gavião / Gaudêncio Cunha.

Categorias
notícia

Abraji e mais 59 organizações questionam a MP de Bolsonaro sobre a Lei de Acesso a Informação

Só venceremos a pandemia com transparência

Fonte: Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)

As organizações e os especialistas abaixo manifestam seu repúdio às alterações nos procedimentos de acesso à informação feitas pela Medida Provisória (MP) Nº 928. O texto, publicado no último 23.março.2020, ataca gravemente os mecanismos de acesso à informação e de transparência pública. Pelos motivos apresentados abaixo, exigimos a revogação do trecho que inclui o artigo 6º-B na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

1. Não há exposição de motivos para a inclusão do artigo. Esse item, que normalmente acompanha uma MP, é fundamental para a sociedade compreender a finalidade da medida e os critérios usados pela administração pública para adotá-la.

2. O texto é vago, prejudicando o procedimento de acesso a informações. O art. 6º-B determina a priorização de respostas a pedidos relacionados às medidas de enfrentamento da pandemia, mas não especifica como isso ocorreria, se o prazo para resposta seria menor e quais os critérios para essa priorização. O texto não explicita se a priorização afeta apenas informações sobre saúde ou também alcança assuntos igualmente importantes que tangenciam o combate à covid-19 – como economia, geração de renda e condições de compras públicas em situação de emergência. Ao não apontar como seria a priorização dos pedidos, não deixa clara a necessidade de solicitantes exporem os motivos pelos quais seu pedido se relaciona com a pandemia – o que contraria ao art. 10, § 3º, da própria Lei de Acesso à Informação (LAI).

3. O texto é contraditório e abre brecha para omissões indevidas a pedidos de informação. O caput do novo art. 6º-B da Lei nº 13.979/2020 indica que serão priorizados os pedidos relacionados com as medidas de enfrentamento da pandemia. Mas o inciso II do §1º determina a suspensão do prazo determinado pela LAI justamente quando a resposta ao pedido necessitar de envolvimento de agentes públicos ou setores dedicados às medidas de enfrentamento. Na prática, os prazos para o atendimento de pedidos relacionados com as ações de combate ao coronavírus estariam suspensos sob uma retórica de priorização. É de fundamental importância que o governo federal e especialmente o órgão coordenador da política de acesso à informação, a Controladoria Geral da União, garantam condições para que os servidores possam, em segurança, atender a tais demandas – sejam os que estão no combate direto, sejam os que estão executando as funções administrativas em teletrabalho.

4. Exclui a possibilidade de recurso, impedindo que as pessoas questionem negativas a informações ou não atendimento a pedidos. Somada à falta de critérios claros de aplicabilidade da nova norma, o fato de a MP estabelecer que não serão sequer avaliados os recursos contra negativas ou omissões de informação nas condições do artigo 6º-B sepulta as chances de acesso a informações pois possibilita constantes, injustificadas e impunes negativas do governo, contrariando a determinação da LAI, que garante a apresentação de recursos como um direito.

5. Impõe a todas as pessoas a obrigação de buscar a transparência que deveria ser fornecida pelo poder público. Ao estabelecer que os pedidos não respondidos no prazo devem ser reiterados em até dez dias passada a calamidade, possibilita que todas as solicitações feitas no período sejam ignoradas, a menos que a pessoa se lembre de refazê-la, findo o decreto de emergência – quando a informação poderá deixar de ser útil e estar desatualizada.

6. A MP foi construída e imposta sem transparência ou diálogo com a sociedade civil. A CGU conta com um Conselho de Transparência, cujo propósito é justamente discutir esse tipo de medida com a sociedade civil e garantir a participação social, mas nem o colegiado, nem outras instâncias de participação foram consultados. 

7. A medida vai na contramão das iniciativas de governo aberto que estão sendo adotadas por diversos países. As ações – disponíveis aqui – são incentivadas pela Open Government Partnership (OGP), parceria internacional de governo aberto da qual o Brasil faz parte. Com essa ação, o país também contraria o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16 presente na Agenda 2030 das Nações Unidas. 

Pelos motivos expostos, a MP 928 é desproporcional e viola o direito constitucional de acesso a informações de interesse coletivo. Coloca a transparência e o controle social em um lugar secundário justamente quando a população sofre com a desinformação em meio a uma crise sem precedentes. Isso prejudica o direito das pessoas de ter informação sobre as ações governamentais de enfrentamento à epidemia. 

Em vez de estabelecer novos procedimentos que dificultam o acesso a informações, o governo federal deveria seguir o exemplo dos países que foram mais bem-sucedidos no combate à covid-19 (coronavírus) e ampliar a transparência, orientando estados e municípios a fazer o mesmo. 

A divulgação ampla de dados, especialmente em formato aberto (como boletins epidemiológicos; testes administrados e disponíveis; metodologia da coleta de dados; contratos e informações sobre compras públicas e orçamento; status de ocupação dos leitos nos hospitais, principalmente nas UTIs etc.), pode eliminar uma eventual sobrecarga de pedidos de informação e a necessidade de ajustes em prazos e procedimentos.

Dessa forma, repudiamos o artigo 6º-B da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, estabelecido pela MP 928 e defendemos enfaticamente sua revogação imediata. Além disso, esperamos medidas que visem ao aprimoramento da transparência ativa, bem como mecanismos e instrumentos necessários para que os servidores tenham plenas condições de cumprimento da lei sem comprometer sua segurança. Não se pode instituir um regime de operação paralelo à Lei de Acesso à Informação, nem tampouco retroceder nas conquistas sobre transparência alcançadas pela sociedade, especialmente em um momento de evidente crise.

Assinam a nota: 

Ação Educativa – Assessoria Pesquisa e Informação
Agência Mural
ANDI – Comunicação e Direitos
Associação Brasileira de Imprensa
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo
Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos – ABGLT
Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo – SBPJor
Associação Contas Abertas
Associação de Jornalistas de Educação – JEDUCA
Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo
Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida – Apremavi
ARTIGO 19
Campanha Nacional pelo Direito à Educação
Casa da Cultura Digital Porto Alegre
Casa Fluminense
CDDH Dom Tomás Balduíno de Marapé – ES
Centro de Estudos Legislativos (CEL DCP – UFMG)
Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais  (Cdh/UFMG)
Colaboradados 
Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduino
Conectas Direitos Humanos
Dado Capital
Derechos Digitales
Fiquem Sabendo
Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários – (FEBAB)
Fórum das Ong Aids do estado de São Paulo – FOAESP
Fórum Paraibano de Luta da Pessoa com Deficiência
Frente Favela Brasil
Fundação Avina
Fundação Grupo Esquel Brasil
Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero
Greenpeace Brasil
Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável (GTSC – A2030)
InPACTO
Instituto Akatu
Instituto Alana
Instituto Bem Estar Brasil
Instituto Beta: Internet & Democracia
Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM
Instituto Braudel
Instituto Centro de Vida (ICV)
Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS)
Instituto Educadigital
Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC)
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
Instituto de Governo Aberto (IGA)
Instituto de Inclusão Cultural e Tecnológica – Tecnoarte
Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola – IMAFLORA
Instituto Não Aceito Corrupção 
Instituto Nossa Ilhéus
Instituto Pro Bono
Instituto Observatório Político e Socioambiental (Instituto OPS) 
Instituto Oncoguia
Instituto Socioambiental (ISA)
Instituto Soma Brasil
Instituto Sou da Paz
Instituto Vladimir Herzog
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Justiça Global
Laboratório Analytics (Universidade Federal de Campina Grande)
Laboratório de Inovação em Políticas Públicas do Rio de Janeiro
Laboratório de Legislação & Políticas Públicas (LegisLab – UFMG)
Laboratório de Políticas de Comunicação (Universidade de Brasília)
Lagom Data
Livre.jor
Lobby Para Todos
Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
Missão Paz 
Observatório do Marajó
Observatório Social de Belém 
Observatório Social de Brasília
Observatório para a Qualidade da Lei (UFMG)
Open Knowledge Brasil
Operação Amazônia Nativa
Plataforma MROSC
Programa Cidades Sustentáveis
Rede Espaço Sem Fronteiras – ESF
Rede Nacional de Observatórios da Imprensa (RENOI)
Rede Nossa São Paulo
Repórter Brasil
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Terra de Direitos
Transparência Brasil
Transparência Partidária
WWF-Brasil