A serpente acordou, diz a lenda! Na vida real um bicho de
várias cabeças brotou por toda a cidade em forma de água, lama e crateras,
árvores caídas, condomínios alagados, muros caídos e os bairros pobres mais
afetados.
Sejamos justos. Qualquer cidade que recebesse a quantidade
de chuva desabando sobre a capital nestas águas de março de 2019 sentiria o impacto.
Foi algo fora do normal.
Porém, o conjunto dos transtornos é preocupante se pensarmos
no que está previsto para a revisão do Plano Diretor (PD) de São Luís.
A cidade está sendo loteada para as empreiteiras e ficando
refém da lógica da expansão portuária e industrial.
Para atender a esses interesses, segundo a proposta de revisão do PD, a zona rural será reduzida em 40% (leia aqui).
Quem mora no Centro e nos condomínios pode não perceber no
médio prazo, mas a zona rural é de suma importância para a vida urbana. É nas
áreas com menor adensamento populacional que ocorre a absorção das águas para a
manutenção dos lençóis freáticos, fundamentais ao abastecimento de água na
capital.
Mas a zona rural é, acima de tudo, o lugar de vida e
sobrevivência de milhares de famílias, ambiente da produção agrícola e
extrativismo, sociabilidade e vida fora da lógica do lucro desenfreado.
Se não houver um Plano Diretor adequado ao desenvolvimento
sustentável, São Luís pode ficar pior. Basta observar que até no regime normal
de chuvas a cidade tranca.
Em nome da especulação imobiliária desenfreada, as
empreiteiras ergueram muralhas tapando os rios, aterraram os brejos, mataram as
nascentes. Somados, esses atos vão bloqueando a cidade, fechando os canais por
onde transitam os mananciais e se alimentam as antigas fontes.
Uma perversidade domina e engenharia em certas construções. Na
sua maioria, os condomínios não têm árvores. O terreno é todo impermeabilizado
com asfalto ou concreto, sem condições de vazão da água.
O impulso demográfico ergueu a máxima dos condomínios
fechados até mesmo na zona rural, cercando os territórios e exterminando os
bairros.
Assim, a cidade vira um amontoado de paredões com prédios
chiques e condomínio de todos os tipos. Essas muralhas de concreto, que todos
nós buscamos em nome da segurança, mostram suas contradições.
Com as chuvas intensas, os próprios condomínios são vítimas
do fechamento. E as outras pessoas, ricas ou pobres, ficam ilhadas na cidade.
O que faz a Prefeitura de São Luís diante disso?
Conduz uma das piores visões de futuro para a cidade – a
proposta de revisão do Plano Diretor nociva aos interesses da coletividade.
Visando atender à ganância e interesse dos grandes grupos
imobililários, a gestão municipal está funcionando como lobista das
empreiteiras para aniquilar o sentido de cidade.
Apenas para ficarmos em um exemplo: os rios que
transbordaram neste fim de semana estarão mortos em breve porque eles próprios
arrastam para os seus leitos o entulho que a cidade produz: lixo, desmatamento,
extermínio das matas ciliares e violação das áreas protegidas por leis
ambientais.
30 anos e mais quantos?
Em 1988 o médico Jackson Lago disputou e ganhou a Prefeitura
de São Luís. São inegáveis as melhorias da sua gestão, assim como a aparência
de uma cidade limpa e de buracos tapados na administração de Tadeu Palácio.
Passados 30 anos, há um cansaço das gestões do campo maior
do PDT na capital. Se houve avanços, são mínimos comparados aos fracassos.
Com a reeleição do prefeito Edivaldo Holanda Junior temos
uma década perdida em rotinas eleitoreiras: reforma de praças, operações
tapa-buracos, capina do matagal, pintura dos meios-fios etc
A caminho de 2020, qualquer candidatura séria à Prefeitura
de São Luís precisa pensar a cidade do futuro. Se o PD for aprovado da forma
que a gestão atual quer, vamos assinar um atestado de óbito da cidade.
Precisamos de medidas concretas para planejar a cidade do
futuro com o mínimo de condições civilizatórias. Não temos sequer faixa de
pedestre decente em São Luís, à exceção daquela em frente ao shopping Tropical.
Queremos um prefeito católico que abrace os pais e mães de
santo e os evangélicos, ou vice-versa. A cidade precisa de uma candidatura de
fato enraizada no campo democrático-popular, capaz de dialogar com a população
e estabelecer uma gestão antenada em ciência e tecnologia.
Por mais que tenha intenção de parceria, o governador Flávio
Dino (PCdoB) é uma ferrari e o prefeito Edivaldo Holanda Junior, um fusca. Esse
descompasso precisa mudar.
A Prefeitura se recusou a debater o Plano Diretor até na
Câmara Municipal, mesmo após a cobrança de alguns vereadores.
Temos previsão de mais chuva. Como diz a música, são as águas
de março fechando o verão.
Esperemos que as correntezas encerrem um ciclo político e abram promessa de vida em nossos corações e mentes na eleição de 2020.
Imagem destacada retirada neste site