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Neurototalitarismo e a bolsonarização do Brasil

Luiz Eduardo Neves dos Santos

Doutor em Geografia e professor da UFMA

O filósofo italiano Franco Berardi tem se dedicado a entender o fenômeno do semiocapitalismo, uma transformação radical na esfera da linguagem e da comunicação, oriunda da inteligência artificial de autômatos que influem nas relações sociais, escravizando indivíduos no mundo virtual, tornando-os submissos ao poder da financeirização econômica.

A simulação da realidade via infosfera torna potente o mundo da abstração, uma dependência das máquinas, que segundo Berardi em sua obra Asfixia, provoca um efeito colateral, isto é, a reação à abstração, um retorno à vitalidade do corpo e a reafirmação agressiva de identidades, sejam elas nacionais, raciais ou religiosas, o que provoca o alastramento do ódio, do rancor e da perversidade fascista. Afirma Berardi: “perdida toda fé na universalidade da razão, negado o acesso à esfera da tomada de decisões, as pessoas se agarram a identidades imaginárias baseadas na nação, na raça e na religião”. O que Bifo quer dizer é que o excesso de automação e controle da vida social se metamorfoseia em uma forma de neurototalitarismo como ordem, provocando caos político e mental no cotidiano.

Impossível não lembrar de Berardi ao olhar para o 1º turno das eleições do Brasil ocorrido no último domingo. Pouco mais de 50 milhões de pessoas,  acorrentadas aos seus smartphones e engolidas pelo poder do semiocapitalismo, votaram no presidente Jair Bolsonaro, alguém que nos últimos 45 meses tem feito uma administração desastrosa, mas que se notabilizou por utilizar o método da linguagem neurototalitária, produzindo uma consistente guerra cultural no mundo virtual, se comunicando com grupos reacionários, conservadores, fundamentalistas e racistas, um verdadeiro barril de pólvora fascista.

Tais grupos sociais não se importam com a história de vida pública de Bolsonaro, alguém que nunca gostou muito de trabalhar, que em quase 3 décadas como parlamentar foi medíocre, que enriqueceu – e ensinou seus filhos – roubando dinheiro dos próprios assessores, nomeando funcionários fantasmas em seu gabinete, além de fraudar notas fiscais na Câmara dos Deputados. Tampouco ligam para o fato de seu presidente ser ligado a grupos de extermínio da polícia carioca, hoje conhecidos como milícias ou ainda assumir posturas misóginas, racistas, lgbtfóbicas e aporofóbicas contra milhões de brasileiros.

No mundo simulado e paralelo em que essas pessoas vivem, o “mito” não possui responsabilidade alguma sobre os escândalos de corrupção de seu governo, nem no alastramento da fome, não tem nada a ver com a absoluta ausência de programas nas áreas da Educação, Saúde, Habitação e Segurança Pública, nos juros altíssimos, na elevada inflação que o país vive e nos recordes de desmatamento na floresta amazônica e cerrado. Frequentemente terceirizam as culpas e as responsabilidades pelo fracasso do governo, inclusive na pandemia, em que morreram quase 700 mil pessoas, intervalo de tempo em que o chefe do Executivo insistiu em tratamentos ineficazes, duvidou da Ciência, das vacinas, demorou a comprá-las, debochou dos enfermos que morriam por asfixia e nunca se consternou e/ou se solidarizou com as famílias diante do morticínio de brasileiros pela doença.

Pelo exposto, se instaurou no Brasil a partir de 2018 uma ditadura da ignorância, para usar outra expressão de Berardi, em que se naturalizou e se banalizou todo tipo de perversidade, reforçando a vocação brasileira de país violento, racista e desigual. Aceitam e disseminam absurdos e infâmias concretas e discursivas: afirmam que o governo é honesto e ético, que 33 milhões de pessoas em situação de grave insegurança alimentar é mentira, que a Esquerda e o PT vão instalar uma ditadura comunista, além de fechar templos e igrejas, dizem ainda que eles representam o bem e que o processo eleitoral e as urnas eletrônicas não são confiáveis. Falam ainda em globalismo e em marxismo cultural a fim de chamar atenção para um plano global comunista e cruel.

O fato é que os apoiadores de Bolsonaro são incapazes de fazer uma defesa honesta do governo, só sabem vociferar a ladainha moralista, eivada de preconceito, de que Lula é ladrão e ex-presidiário, mas se esquecem que seu “mito” não possui prerrogativa de foro eterna e que brevemente as suas chances de ser processado e preso são altas. Muitos deturpam o Evangelho de Cristo, a exemplo de um pastor-coach que vi recentemente nas redes. Ao expor 5 motivos para não votar na Esquerda, fez uma defesa contumaz da propriedade privada, citando Locke, colocando-a como sagrada à luz da Palavra de Deus, mas omitindo que Jesus é partilha e não segregação.

A bolsonarização do Brasil se assemelha muito ao que Adorno e Horkheimer, em sua Dialética do Esclarecimento, chamaram de nova barbárie, em que os indivíduos se encontram completamente anulados pelos poderes econômicos e cada vez mais distantes de valores verdadeiramente humanos, só que agora aparecem controlados e adestrados pela inteligência artificial, que comandam suas subjetividades, emoções e comportamentos. Por isso são inimigos da reflexão e da crítica, não costumam pensar, não dialogam, pois são condicionados para o desejo do consumo, da desinformação, do supérfluo, para a fé cega no lucro, para a crença num “deus bolsonarista” e suas pautas morais/de costumes e para a disseminação potente do ódio racial e de classe.

Nossa tarefa é lutar permanentemente contra todas as coisas horríveis e repugnantes que esses grupos defendem e representam, e nem precisa ser do campo progressista não, basta ter bom senso e tolerância, combater injustiças sociais, saber dialogar, ser antirracista, ter humanidade e amar o próximo.

Imagem destacada / Jair Bolsonaro na barbearia / Foto capturada aqui

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42° Festival Maranhense de Coros abre inscrições

Fonte: Portal Padrão / UFMA

e outubro a novembro deste ano, em São Luís, será realizada a 42ª edição do Festival Maranhense de Coros-FEMACO, que ocorrerá em duas modalidades. Nos dias 18 a 20 de outubro, ocorrerá de forma presencial; e de 8 a 11 de novembro, de forma virtual. As inscrições são gratuitas e seguem abertas até o dia 30 de setembro para os grupos de participação presencial e até o dia 7 de outubro para os de participação virtual.

Os grupos interessados devem preencher o formulário on-line com os seus dados, e anexos deverão ser encaminhados para o e-mail dac.daal.proec@ufma.br, contendo as fotografias digitais, com boa resolução, do grupo e do regente; histórico resumido do grupo e dados biográficos do regente; e vídeos, no caso dos grupos que participarão virtualmente.

O festival é realizado pela Universidade Federal do Maranhão, por meio da Diretoria de Assuntos Culturais (DAC) da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (Proec). O evento não será de cunho competitivo e poderão participar grupos corais adultos de vozes mistas ou iguais, corais infantis e infantojuvenis do Maranhão, do Brasil e de outros países.

O evento reúne grupos de canto coral infantil, infantojuvenil e adulto de São Luís e demais municípios maranhenses, além de vários estados brasileiros e outros países para apresentação ou exibição de recitais e concertos. O festival tem por objetivo estimular e difundir a prática do canto coral e promover o intercâmbio cultural e o congraçamento entre a UFMA, os grupos corais participantes e as comunidades locais, regionais e internacionais.

Confira o regulamento completo

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Apesar de você

Chico Buarque

Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão

Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia
Como vai proibir
Quando o galo insistir
Em cantar
Água nova brotando
E a gente se amando
Sem parar

Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar

Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Inda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença
E eu vou morrer de rir
Que esse dia há de vir
Antes do que você pensa

Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear
De repente, impunemente
Como vai abafar
Nosso coro a cantar
Na sua frente

Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai se dar mal
Etc. e tal

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Igreja Católica enquadra Kelmon: “não é sacerdote”

A incômoda, desrespeitosa e preocupante presença de Kelmon no debate entre os presidenciáveis, na TV Globo, foi um dos assuntos de maior repercussão durante e após o evento.

Fantasiado de padre, Kelmon tumultou o debate e não escondeu que estava ali como laranja de Jair Bolsonaro.

Durante a transmissão, este jornalista se manifestou no Twitter cobrando uma posição da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) sobre a vinculação do impostor Kelmon com expressões tradicionalmente vinculadas ao catolicismo.

A resposta da Igreja Católica veio hoje. Em nota, a CNBB diz:

Em atenção aos fiéis que enviaram perguntas à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), esclarecemos:

1 – O senhor Kelmon Luís da Silva Souza, candidato que se apresenta como “padre Kelmon”, não é sacerdote da Igreja Católica Apostólica Romana, sem qualquer vínculo com a Igreja sob o magistério do Papa Francisco.

2 – Oportuno ressaltar que, conforme vigência na Lei Canônica, os padres da Igreja Católica, em pleno exercício do ministério sacerdotal, não disputam cargos políticos, nem se vinculam a partidos.

Embora não tenha qualquer vínculo com a Igreja Católica Apostólica Romana, o homem fantasiado de padre ganhou uma visibilidade além do normal, o que provocou a minha reação nas redes sociais.

Mas, o problema maior nem é a fantasia. É o discurso. O fariseu estava ali representando Roberto Jeferson, um homem que anda armado até os dentes ameaçando a democracia.

Kelmon é ventríloco do que existe de pior no esgoto da política: de Roberto Jeferson a Jair Bolsonaro.

Temos pleno conhecimento de que ele não é padre, mas estamos vivendo um cenário de desinformação e obscurantismo que provoca dúvida, distorções e maus entendidos.

É muito bem vinda a nota da CNBB. Quanto mais informação confiável, melhor!

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Marconi Rezende e convidados realizam show em prol da democracia

“Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré, se tornou um hino contra a ditadura militar brasileira inaugurada pelo golpe de 1964. O clássico é lembrado até hoje em momentos de enfrentamento, por exemplo, greves de trabalhadores reivindicando direitos.

A canção dá título ao show que Marconi Rezende e convidados apresentam – “em prol da democracia”, frisa o artista anfitrião –, na próxima sexta-feira (30 de setembro), às 21h, no Soul Lounge (Av. Litorânea).

O show terá repertório autoral e clássicos da música popular brasileira, com especial atenção às chamadas canções de protesto, numa tomada de posição coletiva, pública e, sobretudo, musical.

Além de Marconi Rezende, sobem ao palco Emanuelle Paz, Joãozinho Ribeiro, Josias Sobrinho, Luciana Pinheiro, Milla Camões, Tássia Campos e Tutuca.

O cenário de autoritarismo e violência no Brasil de 2022 é bastante parecido com o da ditadura. E é contra essa barbárie que estes artistas irão cantar.

O couvert artístico custa apenas 20 reais e pode ser pago antecipadamente pelo pix (98) 99111-9493.

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Impressões sobre o debate na TV Mirante

1 – Está em curso uma batalha pela posição de segundo turno para enfrentar o governador Carlos Brandão;

2 – Nessa batalha, o ex-prefeito de São Luís, Edivaldo Holanda Junior, tenta crescer. Para isso, bateu forte em Weverton Rocha e Lahesio Bonfim;

3 – O estilo agressivo do ex-prefeito destoa do seu tom natural de não querer briga com ninguém. O Edivaldo Jr brigão tem motivo: ele foi prefeito do maior colégio eleitoral do Maranhão (São Luís) por oito anos e corre o risco de ficar abaixo de Lahesio Bonfim, prefeito de uma cidade minúscula no sul do estado – São Pedro dos Crentes;

4 – Mas, pode ser também que o ex-prefeito tenha sido “escalado” para bater em Weverton Rocha com a pergunta sobre o ginásio Costa Rodrigues;

5 – Por outro lado, Lahésio Bonfim sentiu a desconstrução. Ele viu arranhada a sua imagem publicitária de santo e probo. Edivaldo Jr fez duras acusações de corrupção contra o ex-prefeito de São Pedro dos Crentes;

6 – Quando percebeu as pancadas, Lhaesio Bonfim construiu uma retórica da vitimização, dizendo-se alvo de um “consórcio” de candidatos contra ele;

7 – Só as pesquisas qualitativas que estão em curso podem dizer se Lahesio Bonfim saiu do debate como vítima ou corrupto;

8 – Em posição confortável, o governador Carlos Brandão assistiu à batalha dos crentes e de Weverton Rocha com tranquilidade. Chegou a ser incomodado apenas quando mencionaram a presença do seu sobrinho na cena do crime que levou à morte um cobrador de propinas que estaria envolto nas relações com o vereador de São Luís Beto Castro;

9 – Como o foco da batalha nesse momento é para decidir quem vai ao segundo turno, o governador foi poupado, apenas por enquanto;

10 – Na minha humilde impressão, o agendamento (positivo e negativo) de Lahesio Bonfim ajuda a impulsionar o nome dele. E isso já preocupa Weverton Rocha. Esse é o ponto de tensão após o debate.

Lahesio tenta esconder Bolsonaro

11 – O debate desvinculou as candidaturas presidenciais. A polaridade Lula x Bolsonaro não entrou na pauta. Ponto positivo para o bolsonarista Lahesio, que tenta esconder o seu candidato a presidente Jair Bolsonaro;

12 – Menos importante, a estética de alguns candidatos chamou atenção: implantes capilares são muito perceptíveis. Deve ser porque os candidatos precisam ficar com os cabelos em pé;

13 – Faça o L.

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Sair disso… JÁ!

Flávio Reis

Texto original publicado no site da Editora Passagens

Bolsonaro chegou à Presidência da República num contexto muito particular. Militar reformado por indisciplina, tornou-se vereador e logo deputado por longos anos no Congresso Nacional. Uma figura politicamente irrelevante, que aparecia aqui e ali pelo comportamento agressivo, as falas disparatadas, um prato feito para programas considerados politicamente incorretos, que carnavalizavam o grotesco. E foi construindo sua carreira política assim, entre “rachadinhas”, condecorações a milicianos, alinhamento com o Centrão, defesa dos interesses corporativos de militares e policiais, elogio da ditadura e da tortura. Uma excrescência política, que, no entanto, expressava ruidosamente preconceitos e posições reacionárias existentes de forma mais ou menos dispersa em setores da sociedade brasileira.

A conjuntura estava marcada pela Lava Jato, pela prisão de Lula e uma indignação avolumada na grande mídia, além do cortejo infindável de deturpações e mentiras espalhadas pelas redes sociais. A receita perfeita para os lobos aparecerem travestidos de salvadores da pátria. Assim como aconteceu na eleição de Collor, a lorota deu certo e o velho militar arruaceiro, deputado improdutivo, foi alçado à posição mais alta do país. Muitos apostaram na boçalidade como via de resolução. Uma saída que não é incomum em tempos de crise política e social. Em outras partes do mundo ocorria o mesmo.

Como era de se esperar, o resultado foi um desastre ainda maior que o de Collor. Sem nenhuma visão, seja das questões estratégicas ou dos problemas emergenciais, Bolsonaro montou um time voltado para a destruição dos alicerces da Constituição de 88. Muito barulho, promessas ocas e grosserias a granel, enquanto áreas importantes do governo iam se desmantelando, notadamente os setores da educação, saúde e seguridade social, meio ambiente e cultura. Um misto de intenção e incompetência. Assim, entramos numa fase de desarranjo institucional, com atritos constantes entre os poderes, mensagens e ameaças golpistas recorrentes a partir do Executivo, desmantelamento de organismos de fiscalização, destruição ambiental, isolamento internacional do Brasil, sucateamento das universidades públicas e de seus programas de pós-graduação, ataques à cultura brasileira, posturas recorrentes de desprezo e violência em relação a mulheres e várias minorias e uma utilização da religião a partir do conluio com pastores devotados à manipulação de seus rebanhos.

Tudo sedimentado numa forma abertamente patrimonialista de exercício do poder, em grau desconhecido até nos padrões brasileiros. O poder é exercido pela “família Bolsonaro”, em inevitável proximidade com os códigos mafiosos ou milicianos. Os filhos igualmente abraçaram a carreira política, sendo Carlos, o vereador do Rio, o responsável pela estratégia de comunicação em redes sociais, que funcionou como alavanca poderosa da candidatura e marcou a forma de comunicação de Bolsonaro com sua base ideológica. Configurou uma “corrente de opinião” manipulada no próprio fluxo das redes, através de dados e máquinas. Seu núcleo ganhou a denominação de “gabinete do ódio”. O vereador desfilou no próprio carro presidencial no dia da posse, possui sala no Palácio do Alvorada, já frequentou reuniões ministeriais e integrou comitivas presidenciais em viagens. Na maior cara dura.

O governo de Bolsonaro não tem outro legado a não ser o da destruição. E seu maior signo foi o negacionismo, estampado no auge da pandemia da Covid-19, quando se colocou na contramão do resto do mundo e, irmanado ao seu ídolo Trump, trabalhou contra as restrições defendidas pelos organismos internacionais, falou e atuou contra vacinas e minimizou os sofrimentos do povo, dizendo que não passavam de “mi-mi-mi”. Fez uma intervenção branca no Ministério da Saúde, mantendo no comando um general trapalhão que não tinha nada a ver com medicina e saúde pública, durante a maior emergência sanitária vivenciada pelo mundo em um século. Será lembrado como um presidente genocida, alguém que provocou e estimulou a morte. A imagem já se cristalizou no mundo.

Diante desse quadro, as eleições de 2 de outubro ganham um tom de emergência nacional. Não constitui novidade que a nossa chamada transição democrática foi a mais negociada e conservadora no contexto dos países da América do Sul. O exército manteve uma série de prerrogativas, sobretudo na redação truncada do artigo 142, onde as Forças Armadas “destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Interpretações controversas à parte, numa democracia são os poderes constitucionais que garantem o funcionamento das Forças Armadas e não o inverso.

Na história da nossa democracia, no entanto, sabemos do papel do general Leônidas Pires Gonçalves “garantindo” a posse de Sarney, no nascedouro do novo regime, assim como o famoso tuite do general Villas Bôas em abril de 2018, na véspera do julgamento no STF de um habeas corpus pedido pela defesa de Lula contra a prisão com condenação em segunda instância, pressionando os integrantes do Tribunal e cujo resultado seria decisivo para barrar sua candidatura à Presidência. Em suma, o exército esteve longe de se manter fora dos embates políticos em momentos de crise mais aguda. Ainda assim, não era mais o centro de conspirações e preocupações política, que foi durante a chamada República Populista ou Segunda República, entre 1946 e 1964.

Não era, até Bolsonaro aparecer como ponto de junção para saudosos dos tempos de violência e arbítrio da ditadura, dentro e fora dos quartéis. Seu governo desastroso terminou não conseguindo unir os generais em torno das intenções golpistas, mas levou uma parte. Encheu a administração federal de militares, uma forma de reforçar os contracheques, e privilegiou o Ministério da Defesa, cercando de mimos os companheiros de farda.

Neste quadro de devastação institucional, social, cultural, educacional, ambiental e mais, não há dúvida de que as forças contrárias devem se unir com determinação. A sociedade brasileira, em sua pujante diversidade cultural e com os desafios históricos de amadurecimento institucional e combate às gritantes desigualdades sociais, tem forças para recusar esse destino nefasto de violência, intolerância e burrice, isso mesmo, burrice, que caracteriza esta triste quadra da nossa história.

Guardo diferenças com o PT e seus anos na Presidência, mas tenho olhos também para as modificações positivas que inscreveram em nossa trajetória, mudando a forma como o Estado se coloca para aqueles que o saudoso Florestan Fernandes chamava de “os de baixo”. O Brasil precisa se reencontrar com seus sonhos e anseios, encontrar os caminhos em meio às divergências e diferenças e recusar resolutamente esse caminho falso, e até caricato, que é o bolsonarismo, com seu estilo fascistóide. Neste ponto, não há vacilação possível. A derrota inequívoca de Bolsonaro e de seus asseclas, que viraram todos candidatos, com suas mensagens de ódio e comportamentos violentos, é o único caminho a quem acredita que o convívio na diferença é possível e que política é dissenção, mas não aniquilamento dos adversários. Contra a intolerância do pensamento uniforme, a força da diversidade.

Este é o pano de fundo das eleições do dia 2 de outubro. Não é uma eleição normal, que comporte a lógica do segundo turno de maneira corriqueira.  Desgastado interna e externamente, cada vez mais isolado, restou a Bolsonaro o caminho que sempre trilhou, que é o de apostar no tumulto e na confusão. Com grupos privados armados e insuflados e policiais agindo de maneira quase descontrolada, é o arco mais amplo de uma vitória de Lula no primeiro turno que pode deter a escalada da barbárie que o bolsonarismo expressa.

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A onda vermelha cresce no interior do Nordeste

Um movimento espontâneo em centenas de cidades do Nordeste ganha as ruas em forma de caminhadas, passeatas, motocadas, carreatas e tantas outras manifestações de apoio a Lula.

No Maranhão, diversas cidades já realizaram eventos de rua. Clique no link abaixo e veja como foi em Santa Helena e Turilândia.

https://youtube.com/shorts/7mkWVbRPTMo

É 13 no primeiro turno.

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“Ói nóis aqui traveis”

Eloy Melonio

“Há tempo para todo propósito debaixo do céu.”

É assim que Eclesiastes ― quarto livro poético da Bíblia ― abre o capítulo 3. E diz mais: “tempo de estar calado, e tempo de falar”.

A citação serve para contextualizar o tema desta crônica. Porque é chegado o tempo do HORÁRIO ELEITORAL GRATUITO. E, com ele, a temporada do “palavreado” ― gente falando “sem moderação”. Acusações, ofensas pessoais, promessas vazias ― um emaranhado de palavras aos ouvidos incrédulos dos eleitores.

E não tem pra onde correr. Os “donos da palavra” estão por toda parte. Sorridentes, falam com todo mundo, beijam as velhinhas e as crianças, tiram selfies com os jovens. Aí o jeito é esperar o tempo passar. E, quando terminar, acho que muita gente vai gritar: Já vão tarde!

Esse “palavreado” começou em 26 de agosto, quando os candidatos cantaram triunfantes: “Ói nóis aqui traveis”.

É óbvio que não estou falando dos “Demônios da Garoa”, tradicional grupo musical de São Paulo (1943), que se popularizou com canções memoráveis, como “Trem das Onze” e “Eu sou o samba”. A atração é o“grupo dos candidatos”, mas o fundo musical bem que poderia ser a música do mais antigo conjunto do mundoem atividade (Guinness/1994):

“Se vocês pensam que nóis fumos embora / Nóis enganemos voceis / Fingimos que fumos e vortemos / Ói nóis aqui traveis”

E, assim, o tempo de que fala o livro bíblico chegou para os políticos nacionais. Para os candidatos, tempo de “falar”; para o povo, tempo de ouvir.

Nesse contexto, salvo raras exceções, o espírito de seu discurso é “falatório geral” ― algo que soa como “o sanatório geral”, na música “Vai Passar”, de Chico Buarque. E a nossa sala de estar vira palco de uma tresloucada retórica. O que importa, nessa caça ao eleitor, não é o que dizer, mas dizer, dizer, dizer.

Esse verbo ― seja qual for o tempo ou o modo, ou até mesmo com erros de português ― é a arma mais poderosa dos políticos. Entre eles, grandes comunicadores que, pela eloquência, firmam-se como líderes locais ou nacionais porque suas palavras seduzem e arrebatam multidões.

E nós não somos tão diferentes. Tem gente que ainda vota por sugestão de um amigo, pressão ou submissão. Diante dos lobos, ainda somos presa fácil. O ideal seria “estudar” as propostas para escolher os mais sérios e competentes. Afinal, eles são eleitos para exercer uma função legislativa ou executiva em nosso nome. Dia desses, um amigo me deu esta lição de cidadania: “Já tenho meus candidatos: cidadãos competentes, com propostas objetivas, que defendem nossos direitos, o bem-estar e a dignidade humana”.

Um adágio diz que “tudo o que é bom dura pouco”. Para o HORÁRIO ELEITORAL, seria melhor “ruim” em vez de “bom”. Talvez essa coisa da propaganda gratuita já tivesse ido “pros quintos (do inferno)”! Não quero ser categórico, mas esse é um desejo antigo de muita gente, que já está “pê-da-vida” com essa novela da vida real.

O pior de tudo é que não inovam. Os programas são iguais (ou piores)aos da eleição passada. Excetuando-se os “peixes grandes”, o resto é tudo igual. Em vez de informar e esclarecer, o que fazem é “nadar em águas passadas”. Um partido sai de cena, entra outro; depois, voltar o anterior, com outros candidatos. Num mesmo programa, um candidato entra e sai várias vezes. Todo mundo junto e misturado, “gatos pardos” no mesmo saco.

Dito isso, pensei numa breve simulação desse palavreado.Antes, sugiro que limpe os ouvidos para ouvir direitinho o que nossos amigos têm a dizer:

“Boa noite! Sou Ana Desconhecida. E sempre estive ao lado do povo”;

“Sou Manuel Oportuno. Não sou desses que só aparecem de quatro em quatro anos”;

“Sou Tomé, da Vila Boa Esperança. Vocês sabem que sou um homem de fé”;

“Sou Ana Alfabeta. Investir em educação é investir no futuro”.

“Sou João Pacífico. Não votem nos candidatos do time do ódio. Votem em mim pra gente acabar com eles”;

“Sou Aurélio Palavra Fácil. Chega de escolher o menos pior”;

“Sou Dalila. Concorro ao meu quarto mandato. Dê uma chance ao novo!”;

A última personagem, ansiosa por seus sete segundinhos, fala em voz mansa e pausada: “Amados, sou o irmão José Maria Verdade da Cruz. Que Deus nos abençoe!”

O pobrezinho não teve tempo de dizer “Amém!” nem “Vote em mim!”. Tomara que ― na próxima campanha ― ele fique mais atento ao relógio.

Afinal, nem sempre há “tempo pra tudo” na disputa eleitoral.

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Eloy Melonio é contista, cronista, letrista e poeta.

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Ciro Gomes faz um caminho sem volta

A pretexto de adotar uma posição de combate a Lula e Bolsonaro, tentando se colocar como alternativa à polarização óbvia que tomou conta do Brasil desde 2018, Ciro Gomes começa a fazer uma despedida definitiva da vida pública, pelo menos como candidato ao maior cargo da República.

Uma eventual vitória de Lula vai consolidar o lulismo como herança política que terá vários pretendentes ao legado e à memória do petista.

Por outro lado, mesmo derrotado, o bolsonarismo ficará vivo e latindo.

Não precisa ter bola de cristal para perceber que Lula, mesmo depois de morto, será um eleitor dos seus herdeiros políticos.

Guardadas as devidas proporções e diferenças, o lulismo, o peronismo, o varguismo etc são marcas políticas e eleitorais que atravessaram e seguem influenciando as disputas no Brasil e na Argentina.

E Ciro Gomes, um homem tão inteligente, parece um amador.

Para não dizer algo pior, ele está servindo de linha auxiliar do campo político mais reacionário do Brasil nas últimas décadas.

Nesse momento, a eleição é vida ou morte.

Mas Ciro prefere uma suposta neutralidade.

Para ele recomendamos a leitura do Apocalipse 3:15-16

Conheço as suas obras, sei que você não é frio nem quente. Melhor seria que você fosse frio ou quente!

Assim, porque você é morno, não é frio nem quente, estou a ponto de vomitá-lo da minha boca.