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Índios, farinha e os franceses nos primórdios de São Luís

Ed Wilson Araújo

As origens de São Luís são contadas por duas narrativas. Uma parte dos historiadores sustenta a tese da fundação e colonização portuguesa. Outros estudiosos argumentam a primazia dos franceses.

Na minha condição de simples jornalista eu não me atrevo a opinar sobre as duas versões nem tenho conhecimento teórico para aderir a nenhuma delas.

Meu interesse pontual nesse texto é apenas resenhar a importância da farinha na relação entre os franceses e os índios do Maranhão, quando da tentativa de implantar aqui a França Equinocial, no início do século XVII.

Os relatos estão presentes na obra “Os papagaios amarelos”, de Maurice Pianzola, uma das referências bibliográficas para entender, em parte, a fundação da cidade.

Pianzola fundamenta seu relato baseado em cartas, documentos e registros dos conquistadores, entre eles o monge Yves d’Évreux, o padre Claude d’Abbeville, o cavaleiro (tenente-coronel) François de Razilly, o tenente-general Daniel de La Touche (senhor de La Ravardière) e o nobre Charles de Voux, entre outros.

Um dos trechos da obra de Pianzola faz referência à farinha como ingrediente essencial da guerra, que incluía também a habilidade dos índios na fabricação de canoas para o deslocamento entre os rios.

“Delibera-se, e é para constatar que resta justo o suficiente de farinha para a viagem de volta ao Maranhão. É preciso dar marcha à ré com todo o exército, deixando apenas uma antena composta de dois escravos tabajaras munidos de farinha para um mês…” (p. 72)

Ao discorrer sobre o deslocamento dos franceses no reconhecimento do território e na conquista dos povos indígenas, Maurice Pianzola diz:

“Trata-se realmente de uma expedição guerreira, posto que se propõe a ir mais além dos territórios ocupados pelos tupinambás, aliados tradicionais dos franceses.

A partir desse momento, nosso capuchinho não mais sairá da praça da aldeia. Quer ver tudo com os próprios olhos e compreender tudo. Passa horas entre as mulheres e as moças que enchem cofos de farinha de mandioca depois de terem-na torrado mais tempo do que normalmente, e misturam-na com especiarias para conservá-la. Prova a farinha fazendo careta, em meio aos risos, pois acha-a menos saborosa do que a farinha fresca, mas sem dúvida alguma de mais leve digestão.” (p. 74)

No tópico “Da partida dos franceses para ir ao Amazonas”, o autor descreve a expedição comandada por Daniel de La Touche, citando uma carta do capuchinho Yves d’Évreux:

“No ano, pois, de mil seiscentos e treze, no mês de julho no oitavo dia, o senhor de La Ravardière partiu do porto de Santa Maria do Maranhão, saudado por vários canhoneiros e mosquetaços disparados do forte de São Luís, como é hábito entre a gente de guerra, levando consigo quarenta bons soldados e dez marinheiros.”

Leva também, à guisa de reféns e segundo o costume nunca se sabe o que pode acontecer, vinte dos “principais selvagens”, e sua lancha, escoltada por algumas canoas indígenas, margeia prudentemente a costa e mete-se entre um rosário de ilhas e arrecifes. Arriba primeiro em Cumá, onde esperam por ele várias canoas carregadas de guerreiros e farinha, e depois chega aos Caietés, onde estão agrupadas vinte aldeias tupinambás.” (p. 76)

Como se pode observar, a farinha originária da cultura alimentar indígena está presente na segurança nutricional do povo Maranhense desde os primórdios da colonização, sendo um mantimento indispensável para abastecer as aldeias e os conquistadores nos processos de luta, dominação e resistência.

REFERÊNCIA

PIANZOLA, Maurice. Os papagaios amarelos. Brasília: Senado Federal, 2008

Imagem destacada / ilustração da chegada dos franceses em São Luís

2 respostas em “Índios, farinha e os franceses nos primórdios de São Luís”

Então Wilson Araújo, acho importante rever essa narrativa. As tribos indígenas do Maranhão conhecem a mandioca há milénios, e quando você coloca que “a farinha originária da cultura alimentar indígena está presente na segurança nutricional do povo Maranhense desde os primórdios da colonização”, você está anulando a relação que essa população tem com a mandioca muito antes dos portugueses chegarem aqui. Outra coisa, tomar cuidado com a linguagem. Quando você afirma: “As origens de São Luís são contadas por duas narrativas.” – você tem que deixar claro que essa fundação foi feita com muito sangue de povos originários e negros/as escravizados/as, coisa essa romantizada em tantos artigos e livros. As pessoas que podem narrar a história do território de São Luís não são os colonizadores, e sim quem já estava lá muito antes das navegações. Sei que você transcreveu o que leu e que não é a sua área, mas acho importante todas/os nós nos atentarmos a como contamos a história desse território nomeado Brasil.

Eu jamais iria reforçar a narrativa dos dominadores. Tenho plena clareza de que os indígenas são os povos originários massacrados pelos colonizadores que cometeram vários tipos de genocídios sobre os povos indígenas e que esse processo segue em curso hoje de maneira mais cruel ainda.

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