Eloy Melonio *
“(…) e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou.” (Ec 3.1-2)
Pela primeira vez, elas passaram a tarde brincando de montar a nossa árvore de Natal. Terminada a brincadeira, festejaram como se fosse uma obra de arte. A árvore logo estava repousando sobre uma mesinha no canto da sala. E as duas, felizes, sorriam como quem acaba de ganhar o presente de seus sonhos.
As personagens referidas são minha esposa e nossa netinha de 8 anos. E é com seu entusiasmo que quero ilustrar o assunto deste ensaio: a vida se dá em ciclos.
Tudo isso porque dezembro é o tempo das “festas natalinas”. Em cena, a árvore de Natal, o Papai Noel, brinquedos, confraternizações e a ceia em família.
Os ciclos são a repetição de fenômenos e acontecimentos culturais ou sociais que se sucedem numa ordem determinada, como um aniversário. Com eles a vida segue sua rotina virtuosa, reafirmando e celebrando épocas, datas, momentos. Sejam de ordem cívica, social, cultural, religiosa… Sempre ligados entre si.
Nas sociedades primitivas, as luas, as colheitas, as festas religiosas ditavam o ritmo da vida. No mundo contemporâneo, tudo o que se possa imaginar. Até uma tal de Black Friday!
Enquanto escrevia os parágrafos anteriores, sentado à frente da tevê, ouvi essa frase mais de vinte vezes. Acho que só funerária e cemitério ainda não usam essa promoção, ― como quase tudo que diz respeito ao marketing ― criada pelos americanos. Mas quem garante que no próximo ano isso já não esteja acontecendo! Principalmente hoje quando os custos de um funeral estão pela hora da morte.
Por falar em marketing, o comércio depende essencialmente das datas comemorativas: Dia das mães, dos pais, das crianças, dos namorados. E agora, mais uma novidade: o “mensário”. E o que é isso?! Uma festinha em que os pais celebram o nascimento do bebê a cada mês até a data oficial do aniversário de um ano.
O certo é que os ciclos nos mantêm vivos, revigorados, esperançosos. O principal exemplo é o ano do nosso calendário que marca a passagem do tempo, e cujo apogeu é a “virada”. E assim, o ano-novo começa no último dia do ano velho, e o ano velho termina no primeiro dia do ano-novo. Nesse embalo muita gente vive intensamente os dois momentos: as últimas horas de um (realizações) e as primeiras do outro (resoluções).
Entre o início e o fim de um ano, muitas datas para celebrar. Termina uma, e já sonhamos com a próxima. Depois do Reveillon, o Carnaval. E logo em seguida, a Semana Santa, o São João. Tenho uma amiga que sonha com o Halloween desde agosto. Outra, mal termina o Carnaval, já está com o pé no São João. E, dessa forma, os interesses e os apegos diferem de pessoa para pessoa, de cultura para cultura.
No meio desse fluxo não se pode esquecer as campanhas de saúde pública. Todo ano, as fachadas de alguns prédios públicos e também os profissionais (e ativistas) vestem-se de cor-de-rosa (outubro) e azul (novembro) para lembrar a necessidade de exames preventivos do câncer da mama e da próstata, respectivamente. Inesquecível, e até mesmo incômodo, é o ciclo menstrual que se repete a cada quatro semanas na rotina das mulheres.
Vale lembrar os eventos de cunho político-partidário, religioso, ideológico. Nesse cenário, destacam-se a Parada Gay (ou “do orgulho LGBT”), a Marcha para Cristo, Dia da Consciência Negra (um feriado novo em alguns estados do Brasil), entre outros.
Convenhamos: é no passar e repassar dos ciclos que o nosso espírito gregário se fortalece. Afinal, a beleza da vida está nesse vaivém dos momentos memoráveis. Quanto mais ciclos em nosso currículo de vida, mais sábios, mais felizes, e mais conscientes de nossa condição humana.
Dito isso, só tenho uma dúvida: não sei se minha netinha virá ajudar a vovó quando chegar o dia de desmontar a árvore de Natal.
*Eloy Melonio é professor, escritor, poeta e compositor.