Quando Fernando Haddad e Jair Bolsonaro disputaram a presidência, em 2018, uma certa claque profetizou nas redes sociais o discurso “eles não”. Esse bordão era compartilhado por gentes finas, elegantes e sinceras, alguns até frequentadores dos ambientes “cult” de São Luís.
Diferentemente do bolsonarista raiz, que vai logo disparando os xingamentos “Lula ladrão” ou “A culpa é do PT”, o eleitor cool da direita é sofisticado, circula nos ambientes alternativos, transita no meio cultural da esquerda e até pisa em algum bar descolado da Praia Grande.
Esses eleitores refinados têm seus representantes e ocupam lugares estratégicos nos cargos de gestão, nas elites administrativas do Estado, nos empreendimentos das marcas de sucesso, nas comunidades científicas, nos púlpitos das igrejas e, sobretudo, nos três poderes onde as coisas são decididas.
“Eles não”, em tradução direta, significa igualar um professor universitário civilizado a um ser ignóbil, homofóbico, misógino, racista e elogiador de torturadores, entre outros adjetivos não pronunciáveis.
O raciocínio é mais ou menos esse: tornar os diferentes iguais (“eles não”) para justificar a opção pelo degenerado, sem macular a escolha. É o disfarce perfeito.
Trata-se de algo diferente do bolsonarista cego de ódio, que não apresenta sequer um argumento, a não ser a sua crença de que “a culpa é do PT”
Para os analistas do discurso, “Eles não” é uma forma camuflada de opção pela direita sem pronunciar o discurso raivoso.
Entre esses bolsonaristas existem aqueles que odeiam o setor público, mas adoram um cargo arranjado no esquema clientelista, ganhando muito para não trabalhar. Mas, sempre mantendo a pose elegante.
Às vezes é aquela pessoa muito bem vestida, polida, sorridente, limpa, galante, bondosa; enfim, educada.
Parte desse eleitorado, adepto do lavajatismo, “evoluiu” para o bolsonarismo e está sempre armada para repetir que o desastre do atual governo não é bem assim…
Já o bolsonarista grosseiro, fácil de identificar, você bate o olho, apura o ouvido e reconhece logo. Ele grita “fora PT” e cruza o sinal vermelho, não respeita a faixa de pedestre, ocupa a vaga do deficiente ou do idoso no estacionamento, fura a fila do banco, burla o fisco e joga lixo na rua.
O outro, aquele tipo sofisticado que postou nas redes sociais “eles não”, é bem mais refinado. Fala baixo, costuma respeitar as regras básicas da civilização e tem bom convívio social.
São tipos diferentes no comportamento, mas iguais na opção.
“Eles não” vai sempre torcer o nariz para qualquer governo humanista com o mínimo de intencionalidade voltada para a justiça social.
É um tipo de gente que topa qualquer coisa (até mesmo Bolsonaro!), menos Lula, o PT, o protagonismo dos pretos, dos índios, das mulheres, da Bolsa Família, da comunidade gay e dos pobres em geral.
A velha aristocracia escravocrata está no meio de nós e, às vezes, nem percebemos.
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