Texto e fotos: Ed Wilson Araújo e Marizélia Ribeiro, professores pesquisadores da Universidade Federal do Maranhão
Joana Terezinha de Freitas foi internada na Colônia do Bonfim em 1972 e deu à luz Manoel de Jesus Freitas, separado da mãe e entregue aos cuidados do Educandário Santo Antônio (Sociedade Eunice Weaver do Maranhão), em São Luis.
Em 1973 a criança foi dada como morta, mas a família nunca recebeu a certidão de nascimento nem o atestado de óbito. Até hoje, não há informações sobre internação hospitalar e o local onde o corpo teria sido enterrado.
O Ministério Público Federal (MPF), através do Inquérito Civil nº 1.19.000.000620/2024-05, está apurando o caso.
A reportagem mostra o envolvimento de presidentes do Educandário Santo Antônio (ESA) em duas adoções de bebês internados na instituição em 1972 e 1977.
Era 17 de outubro de 1972 quando um jipe azul e preto chegou à casa de Joana Terezinha de Freitas, em Miranda, na época um povoado do município de Itapecuru, a 137 quilômetros de São Luís (MA). Ao ver o carro, a vizinhança, temerosa, fechou as portas. Joana Freitas, diagnosticada com “lepra lepromatosa” quando estava grávida do seu décimo filho, aos 40 anos de idade, foi transportada para o leprosário Colônia do Bonfim (depois Hospital Aquiles Lisboa), lugar onde ficavam confinados os hansenianos do Maranhão.


A sétima filha da família, Maria das Dores Freitas Marinho, a Dorinha Marinho, nunca esqueceu a cena da despedida. Ela e os irmãos se abraçaram, chorando, enquanto o pai, Ângelo Elesbão Marinho, preparava uma grande fogueira no quintal para queimar a cama, o colchão, as roupas e os outros objetos pessoais da esposa, atendendo à política de desinfecção dos doentes.
Naquela época, a lepra já não era mais doença de isolamento compulsório, segundo o Decreto nº 968, de 7 de maio de 1962, mas no Maranhão ainda imperava a política sanitária de desinfecção e isolamento dos doentes imposta pela Lei nº 610, de 13 de janeiro de 1949, do governo Eurico Gaspar Dutra.
Joana Freitas morou cerca de cinco anos na “cidade” dos hansenianos de São Luís, construída na Ponta do Bonfim, em 1937. Era um local ermo, de difícil acesso e bem vigiado, como determinava a política sanitária de isolamento social vigente. A Colônia do Bonfim tinha administração semelhante a uma prefeitura e sediava um convento para as freiras da Ordem Vicentina. As vicentinas faziam a conexão entre a Colônia do Bonfim e o Educandário Santo Antônio (Sociedade Eunice Weaver do Maranhão) sobre a transferência dos recém-nascidos, o fluxo das visitas e as informações sobre os filhos separados.
O nascimento e a suposta morte de Manoel
Lúcida, hoje aos 92 anos de idade, Joana Freitas lembra o parto e a única vez que viu seu filho Manoel de Jesus Freitas, sem poder tocá-lo, em 19 de dezembro de 1972, antes de a criança ser levada ao Educandário Santo Antônio.
“Quando eu senti as dores, mandaram buscar uma parteira, de nome Gilda, que morava do outro lado da praia do Bonfim. Passei a noite com dor e uma hora da madrugada tive o menino. A parteira perguntou se eu queria ver a criança. Eu disse que sim. Aí, ela veio com o menino todo enrolado em um pano e descobriu apenas o rosto. Então eu vi que ele tinha um sinal no meio da testa. Vários filhos meus têm esse sinal entre os olhos”, enfatiza.
A maior preocupação de Joana Freitas, durante a sua internação, era saber como estavam seus filhos. Nos breves encontros com o marido, autorizados pela administração da Colônia do Bonfim, ela recebia notícias dos que haviam ficado em Miranda. Sobre Manoel, era sempre informada pelas freiras vicentinas Maria Pinto e Maria Silva (in memoriam): “a criança era bonita e estava bem”.
Em abril de 1973, quando Manoel tinha aproximadamente quatro meses de idade, Joana Freitas recebeu a visita de uma estrangeira que se comunicava através da freira canadense Rejeanne S.G.M (falecida em 09/12/2018), da Ordem Irmãs de Caridade de Montreal. “Ela tinha visto Manoel no Educandário Santo Antônio e desejava adotá-lo e levar meu filho para a Holanda. Eu disse que não doaria, ainda mais sem a permissão do pai. A estrangeira insistiu na adoção e chegou a falar com meu marido, mas ele também negou a adoção”, detalha. Após esse episódio, Joana Freitas conta que o pai tentou resgatar o filho no Educandário Santo Antônio, mas não lhe foi permitido ver a criança.
Joana Freitas lembra que, no mês seguinte, próximo ao Dia das Mães, ao não ver Manoel no grupo de crianças do Educandário Santo Antônio que foram visitar suas mães na Colônia do Bonfim, perguntou a uma funcionária daquela instituição pelo filho e recebeu como resposta que o menino estava bem, era muito parecido com ela, tinha o apelido de ‘Careca’ e estaria dormindo.
Em setembro de 1973, passados três meses da proposta de adoção de Manoel pela estrangeira, José Romão Freitas (in memoriam), também hanseniano e internado na Colônia do Bonfim, contou à sua irmã Joana Freitas do falecimento do sobrinho. O óbito lhe foi informado pela freira vicentina Maria Silva. “Por que a freira não deu a notícia diretamente para minha mãe?”, questiona Dorinha Marinho.
O comunicado seco da morte causou um novo trauma em Joana Freitas e deixou-a inerte. O marido, morando no interior do Maranhão e cuidando dos outros nove filhos, também acreditou na notícia do falecimento de Manoel. Naquele tempo, eles preferiram esquecer o novo trauma.
Denaide foi “desenterrada”
Desde 2007, a família Freitas, liderada por Dorinha Marinho, faz uma busca incansável para obter informações sobre o destino de Manoel. “Queremos saber onde está meu irmão. Ele foi dado como morto e nunca tivemos qualquer documento que comprove o óbito ou o enterro. O Educandário Santo Antônio nos deve explicações porque meu irmão vivia lá e está desaparecido”, enfatiza Marinho.
A dúvida sobre o óbito de Manoel Freitas só aflorou em 2007, 35 anos depois da notícia de sua morte, quando as famílias de ex-hansenianos submetidos a isolamento e internação compulsórios em hospitais-colônia começaram a se organizar para receberem o pagamento da pensão especial mensal e vitalícia (Lei nº 11.520/2007). Naquela ocasião, Dorinha Marinho conheceu a ex-hanseniana Ângela Maria de Jesus Melo, que relatou ter passado por experiência semelhante com sua filha Denaide Maria Melo Carvalho, também nascida na maternidade da Colônia do Bonfim, em 18 de agosto de 1978 e dada como morta/enterrada.
Diferente de Joana Freitas, Ângela Melo diz ter “travado uma guerra” para obter informações do Educandário Santo Antônio. “Em nenhum momento me deram documento. Aí, eu disse: ‘Podem fazer comigo o que quiserem, mas não vão me impedir de saber onde está minha filha’. Eu ameacei fazer greve de fome e denunciar na imprensa. Eu tinha um parente na Polícia Militar, que me deu todo apoio”, declara. Na sua saga para “desenterrar” a filha, as idas à portaria do Educandário Santo Antônio foram constantes. “Depois de muita insistência, desde as primeiras horas da manhã, eu consegui entrar um dia às três da tarde. Então, eu vi a minha filha”, revela.
Denaide Carvalho mora atualmente com o marido e seus filhos no município de Raposa, na região metropolitana de São Luis.
Inquérito no MPF
Ao tomar conhecimento do caso de Ângela e da filha Denaide, e como não obtinha respostas sobre eventual adoecimento, internação em hospital, morte e destino do corpo pelo Educandário Santo Antônio durante mais de 10 anos, Dorinha Marinho apresentou denúncia à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF) em 2024.
O procurador Marcelo Santos Correa instaurou a Notícia de Fato nº 1.19.000.000620/2024-05, convertida em Inquérito Civil em 14 de agosto de 2024. Nos autos, Dorinha Marinho apresentou o batistério de Manoel de Jesus Freitas e duas listas de registro da internação da criança no Educandário Santo Antônio.
“Fui várias vezes ao Educandário Santo Antônio em busca de informações e documentos que comprovassem a morte de meu irmão. Depois de muito argumentar e avisar que eu pediria judicialmente as informações, lá pela quarta visita eu recebi um documento que mostrava que Manoel esteve vivo no berçário até 15 de março de 1973”, assevera Marinho.
Na relação de internos do berçário, assinada pela então presidente do Educandário Santo Antônio, Maria Inês Saboya, consta o nome de Manoel com o sobrenome Freire (e não Freitas), então com dois meses de idade. Em outra folha, logo abaixo do nome da criança, estão os nomes dos pais Ângelo Elesbão e Joana Teresinha, mostrando que Manoel de Jesus Freitas e Manoel de Jesus Freire eram a mesma criança.


“Não há dúvidas de que o meu irmão esteve lá desde o dia do nascimento, em 19 de dezembro de 1972, até a data da assinatura da então presidente Maria Inês Saboya, em 15 de março de 1973. Manoel de Jesus Freitas estava com dois meses de idade, quase completando três meses”, calcula Marinho.
A reportagem solicitou entrevista com a direção do Educandário Santo Antônio, presidido atualmente por Fátima Maria Bezerra Sabóia, mas ela não quis falar sobre o desaparecimento da criança. A instituição se manifestou no inquérito do MPF em 19 de agosto de 2024, respondendo os questionamentos do procurador.
Sobre a direção da entidade, o ESA informa que a gestão de Maria Inês Saboya encerrou em 1997, quando ela faleceu. Desde então, a presidente é Fátima Maria Bezerra Sabóia, em uma administração composta por 23 membros, não havendo mais “qualquer relação com a Colônia do Bonfim, nem mesmo com internos advindos da Colônia.”
O ESA reconhece que as crianças “advindas do Bonfim eram entregues pelas freiras da Colônia”; no entanto, “as freiras não participavam da rotina ou atividade do Educandário e nem o Educandário tinha vínculo com as Freiras.”
A instituição registra que desconhece qualquer negativa de contato de pais ou familiares com crianças internas. No mesmo documento, apensado ao inquérito, o ESA afirma desconhecer o fato relatado por Ângela Melo sobre a filha Denaide Carvalho dada como morta e enterrada.
Outra justificativa no inquérito diz não haver pedidos formais de documentos sobre Manoel. “Não há nenhum registro na Instituição de qualquer familiar ou pessoa com pedido de informações do então menor à época de nome Manoel de Jesus Freitas. Não houve qualquer pedido de documentos ou informação, nem verbal, nem por telefone, nem por escrito e nem judicialmente”, justifica.
Segundo o ESA, “em buscas pelos arquivos, não foi encontrado nenhum documento com o nome de Manoel de Jesus Freitas. O único documento encontrado em nossos arquivos são fichas do berçário que consta como nome de Manoel de Jesus Freire, com 2 meses, ou seja, nascido em janeiro de 1973, já que o documento é datado de 15 de março de 1973. Pelas informações encontradas não parece se tratar da mesma criança mencionada na notícia de fato.”
Adoções sob suspeita
A vulnerabilidade de crianças nascidas de mães hansenianas na Colônia do Bonfim, nos anos 1970, provocou desdobramentos inusitados e até adoções sem processo judicial. O Canadá era um dos principais destinos dessas crianças, algumas delas intermediadas pelas freiras da Ordem Irmãs de Caridade de Montreal.
Um dos casos apurados pela reportagem foi a adoção de Claudiomar da Conceição Ribeiro, filho biológico de Antonio Soares Ribeiro e Maria de Lourdes Conceição Ribeiro, dois ex-hansenianos já falecidos.
Claudiomar da Conceição Ribeiro nasceu na Colônia do Bonfim em 14 de fevereiro de 1976, mas só foi registrado em 17 de março de 1977, um dia antes de sua adoção pelo casal canadense Yves Denis Aubin e Rachel Bessette Aubin, passando a chamar-se Claudiomar Pascal Aubin.
A participação direta do Educandário Santo Antônio na adoção de Claudiomar Ribeiro se deu através da sua presidente na época, Adelaide Álvares de Carvalho, que foi declarante na certidão de nascimento e procuradora do pai da criança na escritura pública de adoção.


Em uma procuração, datada de 18 de março de 1977, Antonio Soares Ribeiro, pai de Claudiomar, nomeia como sua procuradora Adelaide Álvares de Carvalho, então presidenta do Educandário Santo Antônio “[…] para os fins específicos de requerer junto à Secretaria da Receita Federal o seu CPF, bem como, assinar outros requerimentos e documentos quaisquer, relacionados com o outorgante, podendo praticar todos os atos, passar recibo, dar quitação, inerentes aos desempenhos dêste mandado, usar a cláusula ‘ad juditia’, inclusive subestabelecer”.

Essa “procuração CPF” não menciona a finalidade de adoção nem foi assinada pela mãe biológica de Claudiomar, Maria de Lourdes Conceição Ribeiro, que era contrária à adoção, mas foi utilizada para essa finalidade junto ao cartório Oswaldo Soares, como se a presidente do Educandário Santo Antônio representasse formalmente o pai e a mãe da criança.
Cartas revelam conexões
Em uma carta para seu filho Claudiomar, datada de 8 de junho de 1995, Antonio Soares Ribeiro menciona ter enfrentado uma “grande barreira” por parte da esposa e de um dos seus filhos para entregar Claudiomar a Yves Aubin e Rachel Bessette, que lhe deram o nome de Claudiomar Pascal Aubin.

É surpreendente que a adoção de Claudiomar Pascal Aubin e a autorização para a sua saída do Brasil tenham ocorrido sem processo judicial e encerradas em apenas cinco dias – de 17 de março de março de 1977, data da certidão de nascimento, até 21 de março de 1977, quando o então vice-cônsul da Embaixada do Canadá no Brasil atestou não haver qualquer impedimento para a saída de Claudiomar Aubin do Brasil.

A participação direta das Irmãs de Caridade de Montreal fica documentada através de cartas da freira canadense Thérèse Yergeau a Claudiomar Pascal, em fotos e dois documentos emitidos respectivamente pela Receita Federal (DAFF) e pelo Banco Central do Brasil, que indicam a rua Paulino de Sousa, nº 243, no bairro Monte Castelo, em São Luís/Maranhão, como endereço de referência de Claudiomar Aubin no Brasil. O endereço é a residência oficial da Ordem Irmãs de Caridade de Montreal, um dos locais de permanência da freira canadense Rejeanne S.G.M quando estava em São Luís.

Claudiomar Pascal Aubin retornou a São Luís em novembro de 2024 para visitar seus familiares biológicos. “Meus pais canadenses não tinham filhos. Um parente deles, que conhecia a irmã Thérèse Yergeau, sugeriu que eles adotassem uma criança no Brasil com a intermediação dela”, relatou.
Os pais canadenses de Pascal, Yves Denis Aubin e Rachel Bessette Aubin, também adotaram outra criança nascida em São Luis, Marie Julie Aubin, que teria ido na mesma viagem de Pascal Aubin, aos quatro meses de idade, segundo documento de imigração. Na data da viagem, Marie Julie Aubin tinha apenas cinco dias de vida (data de nascimento 19 de março de 1977). Pascal afirma que sua irmã só teria viajado posteriormente com o padre Marcel Laurent e a freira Rejeanne S.G.M.
Já a procura por Manuel Freitas prossegue. Dorinha Marinho fez buscas em dois cartórios de São Luís para tentar encontrar a certidão de nascimento de Manoel de Jesus Freitas ou eventual documentação de doação, mas não há registros nos chamados livros-índice.
Adoção na coluna social
Além da participação direta de Adelaide Álvares de Carvalho na adoção de Claudiomar da Conceição Ribeiro, na coluna Momento Social, publicada no jornal “O Imparcial”, em 16 de janeiro de1972, a colunista e presidente do Educandário Santo Antônio, Maria Inês Saboia, publicou a fotolegenda referente a uma adoção: “Esta criança, linda e loira, foi interna no Educandário Santo Antônio. Aos dois meses, encontrou outros pais boníssimos. Ela agora está com nove meses e manda foto para esta colunista com os seguintes dizeres: ‘Tia Maria Inês: você foi a melhor pessoa que conheci, pois, por seu intermédio ganhei um papai, uma mamãe e três irmãozinhos. Neste Natal desejo a você todas as felicidades do mundo e que no ano novo haja possibilidades de você fazer felizes outros companheiros meu. Meus pais enviam recomendações e votos de feliz Natal e próspero ano novo. Beijinhos do Daniel”’.

No inquérito do MPF, o ESA enfatiza que não era gerido por freiras e refuta tanto a participação em adoções quanto a presença de estrangeiros nas suas instalações. “A Instituição desconhece qualquer pedido de adoção ou presença de estrangeiros em suas dependências, ao contrário, qualquer pedido de adoção sempre obedeceu estritamente a lei e somente ocorreu com autorização e acompanhamento da justiça através de processo judicial. Não há nenhum achado de registro sobre adoção estrangeira, bem como a presença de estrangeiros nas dependências do ESA”, afirma a instituição.
Outro anúncio de morte sem corpo
A reportagem ouviu ainda o relato de Lindalva Soares Lopes, hoje com 60 anos de idade, sobre o desaparecimento da sua irmã Claudeci Cutrim Soares, nascida em 1967 da mãe hanseniana Benedita Cutrim Soares e de Benedito Soares. Mãe e filha, conta Lindalva, foram separadas pela política de isolamento. “Papai, na época, viajou para morar no interior do Maranhão”, recorda.
Segundo a certidão de batismo da paróquia sediada na Colônia do Bonfim, Claudeci Cutrim Soares nasceu em 10 de junho de 1967, mas não há nenhum registro de que foi encaminhada para o Educandário Santo Antônio.

nunca teve informações sobre o seu desaparecimento
Lindalva Soares Lopes explica que a sua mãe, falecida em 1988, morreu sem saber informações da filha separada.
“Nas buscas que eu estou fazendo para ter informações sobre a minha irmã, os relatos que eu tenho são de pedidos insistentes para doar a criança. A minha mãe negou e Claudeci foi dada como morta sem nenhuma comprovação. Eu queria pelo menos descobrir se a minha irmã vive ou se realmente veio a óbito, coisa que minha mãe nunca conseguiu saber e viveu a vida toda com essa incerteza, essa angústia”, enfatizou.
Em suas memórias, Lindalva lembra que quando era criança guarda a imagem da sua mãe chorando, com um papel nas mãos, que seria um comunicado sobre a morte de Claudeci.
Reparação extensiva aos filhos separados
As conseqüências da desagregação de famílias, incluindo os casos de crianças desaparecidas, dadas como mortas ou doadas, motivaram nos anos 1980 a criação do Morhan (Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase), entidade que orienta e acompanha ex-internos de colônias e filhos separados a buscarem as reparações de danos sofridos pela política de segregação.
Desde 2007 a lei indenizatória nº 11.520 garante pensão especial para os pais e as mães afetadas pelo isolamento. Outra lei, nº 14.736/2023 (regulamentada pelo decreto nº 12.312/2024), estabelece a indenização aos filhos de hansenianos isolados em colônias e também aqueles segregados em domicílios ou seringais na região Norte do Brasil.
Segundo o voluntário do Morhan e assessor do gabinete da Secretaria de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Artur Custódio Moreira de Sousa, a política pública indenizatória é uma conquista importante, mas apenas parte da reparação dos danos causados pela segregação. “Tem aparecido casos de localização de filhos e mães e sentimos necessidade de fazer um programa de reencontros de pessoas desaparecidas. Há uma projeção de 20 mil filhos separados que estariam vivos hoje”, pontua.
Ele acrescenta que está em curso o funcionamento da Comissão de Memória e Verdade da Hanseníase, que inclui uma série de iniciativas para apoiar as famílias desagregadas pela política de isolamento compulsório.
Enquanto isso, a nonagenária Joana Freitas espera notícias sobre o seu filho Manoel. Se ele estiver vivo, completou 52 anos de idade em dezembro de 2024.