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Apenas 3% dos presos provisórios pôde votar no 1º turno

Fonte: Brasil de Fato / José Coutinho Júnior e Isabela Menedim

As presas e presos provisórios podem exercer o direito constitucional de votar, e irão fazê-lo novamente no dia 30, durante o segundo turno; no entanto, a quantidade de pessoas que votam em relação à população presa que, em tese, poderia votar, ainda é muito limitada.   

O direito a voto para as presas e presos provisórios está previsto na Constituição de 1988, mas só foi viabilizado em março de 2010, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) regulamentou a instalação de urnas em presídios e unidades de internação

Segundo dados do TSE, 12.693 presas e presos provisórios em todo país estão com sua inscrição eleitoral regularizada, podendo assim votar. Um levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revela que, até o dia 30/09/2022, havia 909.061 pessoas presas. Desse total, 44,5% são presos provisórios.

Ou seja, de uma população de cerca de 404.452 presas e presos provisórios, apenas 3,13% desse total pôde exercer o seu direito ao voto nestas eleições.

Para Mayra Balan, advogada da Pastoral Carcerária Nacional, isso acontece porque não há interesse do Estado em garantir este direito. 

“O Estado, aliado ao senso comum que este mesmo produz, entende que o que é de interesse de pessoas presas é diametralmente oposto ao interesse das ‘pessoas de bem’. Por isso, há a racionalidade punitiva de que pessoas presas – ainda que sem condenação, como é o caso dos presos provisórios – não podem votar”. 

Ela acredita que a dificuldade do exercício deste direito é uma espécie de boicote, motivado por um sentimento de vingança por parte do Estado. 

“O boicote consiste numa política genocida de Estado da população pobre, indígena, negra e periférica. Não basta apenas jogar estes corpos indesejáveis nos depósitos humanos que são as prisões: tem também que matá-las em vida, retirando delas todo e qualquer direito”. 

Os presos já sentenciados têm seus direitos políticos suspensos, não podendo votar; da mesma forma, os sobreviventes do sistema que saem da prisão endividados por conta da pena de multa não podem votar enquanto não quitarem a dívida.  

“O Art. 15, inciso III da Constituição Federal prevê a suspensão dos direitos políticos enquanto durarem os efeitos de condenação criminal transitada em julgado. A pena de multa é um desses efeitos. No caso do tráfico de drogas – crime que mais afeta a população prisional brasileira, especialmente as mulheres – a menor pena de multa prevista é de 500 ‘dias-multa’, que é a unidade usada para designar de 1/30 avos até 5 vezes o salário mínimo vigente na data do crime” – explica Mayra. 

Ela afirma que muitas pessoas condenadas ficam anos sem votar, já que devem ao Estado quantidades exorbitantes de dinheiro que são impossíveis de serem quitadas. “A pessoa, além de sair com o estigma de sobrevivente do sistema prisional, tem também de lidar com a dívida imposta pelo Estado.”

Essa exclusão deliberada e racista praticada pelo Estado Democrático para retirar as pessoas presas do processo eleitoral é uma ferramenta cruel de negação da cidadania.  

Sem o exercício do voto, os direitos fundamentais dessas pessoas são ignorados ou reduzidos pelos programas políticos dos candidatos e candidatas. E, assim, a máquina carcerária vai moendo e moendo cada vez mais as pessoas presas.

Testemunho de uma mesária

A agente da Pastoral Carcerária e assessora da Justiça Restaurativa Nacional, Vera Dalzotto, foi mesária no Presídio Regional de Passo Fundo (RS), e comenta a importância dos eleitores privados de liberdade poderem votar nos políticos que irão representá-los, e ressalta a esperança de ver mais projetos direcionados à população carcerária que ampliem esse direito. 

Confira seu depoimento: 

“Neste domingo, dia 2 de outubro, ocorreram as eleições a nível nacional no Brasil. Neste contexto foram disponibilizadas urnas dentro de presídios que tinham no mínimo 20 eleitores, apenados de maneira provisória, aptos ao voto.  

No Rio Grande do Sul são 11 casas prisionais que terão uma urna eletrônica domingo, dentre elas o Presídio Regional de Passo Fundo. Neste presídio eu me coloquei à disposição e fui presidente de mesa.  

Testemunho que foi uma experiência muito gratificante por vários motivos, porém para mim o mais importante foi ver e sentir a alegria dos eleitores privados de liberdade de exercer um direito que há muitos anos não presenciávamos: escolher seus representantes políticos. 

Momento de democracia, mas também de esperança que com a garantia do voto no regime fechado dos provisórios, possamos ver mais projetos direcionados a esta população. 

O desencarceramento é o nosso objetivo, iremos alcançar um mundo sem cárceres e o voto é um dos caminhos.  

Fiquei dez horas dentro da unidade e saí agradecida ao bom Deus pela oportunidade de agradecer a cada um e uma por sua presença neste momento tão importante para todos e todas nós em nosso país”. 

José Coutinho Júnior e Isabela Menedim são membros da comunicação da Pastoral Carcerária Nacional 

Edição: Glauco Faria

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