Thais Reis Oliveira, editora executiva online de Carta Capital
A bonita cerimônia de posse de Lula, no domingo passado, parecia anunciar a bonança. Nos dias seguintes, Bolsonaro se manteve calado e o quórum dos famigerados acampamentos golpistas minguava.
Uma semana depois, porém, tudo mudou.
Na manhã do último domingo, ônibus vindos dos quatro cantos do país chegaram a Brasília apinhados de bolsonaristas radicais. Em poucas horas, milhares deles tomaram as sedes do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal.
O que se seguiu foi terrorismo. Dentro dos prédios, obras de arte foram destruídas, móveis e objetos foram quebrados, fezes e urina foi espalhadas pelo cômodos. Do lado de fora, jornalistas, policiais e até animais foram ameaçados e agredidos.
Os amplos gramados que cercam os Três Poderes dificultam qualquer ação furtiva. Lúcio Costa concebeu a Esplanada como um espaço de manifestação cívica e democrática. Até aqui, tudo leva a acreditar que tamanha monstruosidade só ocorreu graças à omissão ou anuência das forças de segurança e de autoridades.
O governo Lula, o Legislativo, o Supremo e a comunidade internacional têm respondido à altura, punindo os envolvidos e condenando publicamente os atos. Apenas disso, contudo, não é o suficiente.
Embora uma tomada de poder esteja fora de questão, é grave que o bolsonarismo golpista tenha conseguido produzir uma imagem de força tão marcante. Como resumiu o professor Francisco Teixeira, da UFRJ, a CartaCapital, o Capitólio à brasileira é fruto de um triplo apagão: de segurança, de inteligência e tático. Só não foi pior porque nenhuma autoridade teve a vida ameaçada – e porque Bolsonaro está fora do poder e do Brasil.
Os acampamentos golpistas estão, finalmente, sendo desmontados. Mas não a estrutura psíquica que originou esse movimento.
Por não se verem como terroristas, e sim como ‘patriotas’, os bolsonaristas que invadiram os Três Poderes produziram até provas contra si mesmos.
Também chama atenção, entre os detidos e presos identificados até aqui, a quantidade de moradores de pequenas cidades do interior do Brasil – repletos dos chamados ‘deserto de notícias’, lugares onde não há imprensa local independente.
Envenenados por mentiras e teorias conspiratórias que circulam livremente em apps de mensagem e acobertados por uma robusta estrutura financiada por empresários, esses terroristas habitam um mundo paralelo, um delírio coletivo do qual será difícil despertá-los.
O caminho para a verdadeira reconstrução democrática será longo e tortuoso. A boa informação, o estímulo ao pensamento crítico e o respeito à verdade serão ainda mais fundamentais.