Nelson Werneck Sodré levou 30 anos para escrever e publicar um dos livros mais importantes para compreendermos como a gênese e o desenvolvimento da Imprensa no Brasil estão diretamente relacionados à dinâmica das forças produtivas e às nossas marcas culturais.
Um dos tópicos, logo na abertura do livro, trata da censura. Desde o suposto descobrimento em 1500 até 1808 no Brasil era proibida a impressão ou circulação de livros e jornais.
A censura e o atraso caminham de mãos dadas desde o século XVI, quando Portugal, sob domínio da Inquisição, reproduziu na então colônia brasileira as práticas mais agressivas contra um projeto de nação.
O colonialismo não estava sustentado apenas na exploração dos nossos recursos naturais e nem na pilhagem generalizada do Brasil. Esse tipo de dominação estendia-se também na perspectiva cultural, ou seja, na construção de barreiras para impedir o acesso da população a um bem fundamental para o desenvolvimento humano – o livro.
Na “História da Imprensa no Brasil” Nelson Werneck Sodré detalha como a dominação colonial portuguesa travou uma verdadeira guerra contra a impressão e circulação de publicações no Brasil.
Somada à escravidão, a censura foi responsável por um atraso de mais de três séculos na formação do povo brasileiro. Proibindo a impressão de livros e jornais, não havia motivação nem vontade política para alfabetizar a população.
A ignorância, em todos os sentidos, era uma condição para manter o Brasil sob o jugo colonial.
De acordo com Nelson Werneck Sodré (1999, p. 9-10): “Estavam, em Portugal, sujeitos os livros a três tipos de censuras: a episcopal, ou do Ordinário; a da Inquisição; e a Régia, exercida pelo Desembargo do Paço, desde 1576, cuja superioridade firmava-se nas Ordenações Filipinas, que proibiam a impressão de qualquer obra “sem primeiro ser vista e examinada pelos desembargadores do Paço, depois de vista e aprovada pelos oficiais do Santo Ofício da Inquisição”. A partir de 1624, os livros dependiam das autoridades civis para serem impressos, isto é, das autoridades reconhecidas pelo Estado, entre as quais, para esse fim, estavam as da Igreja; mas dependiam ainda, para circularem, da Cúria romana.”
A proibição era tão rigorosa que as tentativas de instalar pequenas tipografias foram reprimidas com violência: “Em 1706, sob os auspícios do governador Francisco de Castro Morais, instalou-se no Recife pequena tipografia para impressão de letras de câmbio e orações devotas. A Carta Régia de 8 de junho do mesmo ano, entretanto, liquidou a tentativa. Determinada que se devia “sequestrar as letras impressas e notificar os donos delas e os oficiais de tipografia que não imprimissem nem consentissem que imprimissem livros ou papéis avulsos.” (SODRÉ, 1999, p. 17)
A censura só finda, entre aspas, em 1808, quando a Corte portuguesa aportou no Brasil e instalou aqui a Imprensa Régia e o jornal chapa branca “Gazeta do Rio de Janeiro”.
Mas, como nem todo controle é absoluto, circulava também naquela época, de forma clandestina, o jornal “Correio Braziliense”, editado em Londres por Hipólito José da Costa e enviado às escondidas nos porões dos navios para as terras brasileiras.
E assim surgiu a Imprensa no Brasil, com uma dupla caricatura do atraso: censura e violência.
Esse atraso está presente nos dias de hoje. Em pleno século 21, a extrema direita ressuscita os fantasmas do passado escravocrata e colonialista.
Dória, Damaris e Weitraub, liderados pela besta fera do obscurantismo, desencadeiam uma guerra contra o conhecimento e a expressão artística.
Proibição de livros didáticos, censura e violência contra jornalistas e os meios de comunicação, além das restrições ao financiamento de peças de teatro e filmes, sob o argumento de combater “ideologia de gênero”, é o retorno à barbárie.