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Fim a era do respeito aos direitos humanos?

José Reinaldo Martins, jornalista, mestre em Comunicação pela ECA-USP

O tempo em que o estado do bem-estar social era modelo de sociedade ideal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos o princípio norteador dos povos e nações pode estar sendo totalmente enterrado neste início de século XXI (já caminhando para meados deste século). Esse modelo de sociedade surgiu com o fim da II Guerra Mundial, em contraposição aos horrores de bombardeios, como os atômicos a Hiroshima e Nagasaki, no Japão, e genocídios, como o Holocausto Judeu.

Evidente que, no tempo do chamado pós-guerra, aconteceram tragédias e, principalmente, ‘silêncios’ inexplicáveis. Entre os ‘silêncios’, chama a atenção o tempo de duração do Apartheid, regime de segregação racial que vigou na África do Sul, de 1948 a 1994 e da Ditadura do fascista Francisco Franco, na Espanha, que durou 36 anos, desde a guerra, adentrando, sem problemas, o pós-guerra.

Isso, sem fala nas ditaduras militares na América Latina (de 1954 a década de 1980), Guerra do Vietnã, conflitos nos Balcãs, o massacre de 1951 na Coreia etc.

Só que, em grande parte, esses conflitos e regimes de exceção tinham como pano de fundo a Guerra Fria, entre os EUA e a União Soviética e seis respectivos aliados. E, também, pouco afetava as estáveis democracias ocidentais pautadas no estado do bem-estar social e ideais humanitários, o que permitiu avanços, como conquistas de direitos civis a negros, mulheres e gays.

Behring Breivik faz a saudação nazista

Hoje, a ascensão de governos visivelmente de tendência racista em países ‘centrais’, como o de Trump, nos EUA e o afloramento de movimentos de ódios a imigrantes que resultaram na instituição de partidos como o ‘Alternativa para a Alemanha’, fundando em 2013, não tem mais relação com a Guerra Fria e, ao que indicam, não serem casos isolados.

Outro detalhe é que a ocorrência de fenômenos, como a fortificação de um partido de tendência nazista na Alemanha, parecia totalmente improvável, até o ano 2000, por ai, quando ainda se respirava os velhos tempos pós-guerra, do bem-estar social e culto aos Direitos Humanos. O ‘Alternativa para a Alemanha’, obteve, nas eleições de 2017, 94 dos 709 assentos no parlamento, sendo o terceiro maior partido alemão na atualidade.

Esse avanço de forças contra imigrantes podem tá indicando duas tendências: são variantes possíveis, dentro de um mundo democrático, ou estão decretando o fim da vida democrática Era Pós-Guerra e anunciando um novo tempo.

A avaliação mais contundente, no momento, é que fenômenos como Governo Trump e ‘Alternativa para a Alemanha’, entre outros, são passageiros e normais no mundo democrático de respeito à alternância no poder. Seriam tendências que vão sucumbir, em breve, por meio das vias democráticas, em sucessivas eleições nas quais se alternarão no poder ao lado de sociais democratas, trabalhistas, verdes etc., mas não prevalecerão como fenômeno que indica uma nova mentalidade de época. Uma nova versão do ‘pós-guerra’ prevalecerá.

Só que fatos com o Governo Trump e o avanço do partido ‘Alternativa para a Alemanha’, entre outros, também, podem não ser somente acidentes possível e normal dentro das regras democráticas.

Esses fatos podem estar indicando uma nova possibilidade de relações sócias, diferentes das vigentes no pós-guerra. Até agora, essa possibilidade é apenas uma especulação.

O que se pode afirmar, no memento, é que as violações aos direitos humanos não causa mais tanta indignação como era há 20 anos.

Um marco simbólico dessa mentalidade onde predomina, cada vez mais, a indiferença a atos de intolerância a imigrantes, a torturas e situações de miséria foi os atentados na Noruega, em 22 de julho de 2011. Esse ato foi praticado por uma pessoa, mas parece ter atendido aos anseios de uma, até então, silenciosa camada da população contrária a imigração, as liberdades democráticas, ao respeito aos direitos das minorias, ao pensamento plural e aos direitos humanos, em geral.

A impressão é que ‘essa gente’, e suas aspirações, sempre existiram, mas permaneceram adormecidas, esperando o momento propício para vir a tona. Do fim da II Guerra até o ano 2000, por ai, foram sufocadas e, agora, aprimoradas e atualizadas, ganham espaço de expressão pública, por meio de práticas de intolerância e ódio.

O autor dos atentados na Noruega, Anders Behring Breivik, condenado a 21 anos de prisão pelo massacre de 77 pessoas, demonstrou claramente, durante aparições em seus julgamentos, que não se arrependeu. Recusou-se ser considerado deficiente mental, o que abrandaria a sua culpa. Optou em demonstrar que e mentalmente saudável e, sem medo ou vergonha, fez questão de fazer a saudação nazista. E ficou assim: poucos indignados e muitos silenciosos e indiferentes.

Behring Breivik praticou explosões na zona de edifícios governamentais da capital, Oslo, com oito mortos, e tiroteio na ilha de Utøya, durante encontro organizado pela juventude do Partido Trabalhista Norueguês, com 69 mortos com tiros na testa, a maioria adolescente. Isso sem contar os que ficaram com sequelas, incluindo familiares dos mortos.

Ele disse considerar o Governo Noruega e membros do Partido Trabalhista ‘brancos traidores’ por serem amistosos com imigrantes islâmicos. Nesta manifestação delimitou uma fronteira política: passou a considerar os democratas, brancos, tão inimigos e ameaçadores quantos os imigrantes etc.

A partir daí, o que muitos chamando de ‘ultradireita’ passaram a ter coragem de desafiar a mentalidade vigente deste o pós-guerra. Não consigo identificar um nome para esse fenômeno, mas, ultradireita não atende mais como denominação exata, pois, entre eles, há o que vou chamar aqui de ‘contradições’.

Veja que o ‘Alternativa para a Alemanha’ é visivelmente a favor de total igualdade entre homens e mulheres. Por outro lado, setores ultraconservadores dos EUA, o homem é o ‘cabeça’ da família. Uns defendem o ateísmo; outros são cristãos praticantes e por ai vai.

O certo é que, hoje, o odioso Holocausto, que era o sinal a todos os povos, de que a legalidade de massacres e extermínios é impraticável, não causa mais tanta comoção. Temo que chegue o tempo que esse odioso descaso contra todo o SER HUMANO, no futuro, seja lembrado somente pelos judeus.

No Japão, a sociedade, neste momento, é simpática a revisão da Constituição de 1947, que instituiu, no pós-guerra, um Japão da paz, sem armas e amplas liberdades de religião, das mulheres etc.

O atual primeiro-ministro japonês, Abe Shinzô, foi enfático ao afirmar que é necessário estabelecer um novo “regime” no Japão. Ele afirmou que a Constituição de 1947 é “um ato de contrição por parte dos vencidos perante os vencedores”, e que este texto precisa, agora, ser “moldado pelas nossas próprias mãos” [dos japoneses]. Até por volta do ano 2000, um primeiro ministro japonês jamais teria a coragem de falar isso.

No Brasil, qualquer cidadão, hoje, nas ruas, ônibus, mercados, nos halls dos hotéis etc. culpa os que eles chamam de ‘direitos humanos’ pela violência no país. Não há mais comoção com a miséria, com o massacre de uma geração de jovens nas periferias das grandes cidades, de índios etc.

Na Índia, a direita nacionalista, que está no poder atualmente, faz vista grossa para ataques aos cristãos, a estupros coletivos de mulheres etc.

Na Russia, que vai sediar a Copa do Mundo deste ano, casos de demonstração de racismo contra jogadores negros estão recorrentes nos estádios. Em jogo no dia 27 de março deste ano, na tradicional São Petersburgo, segunda mais importante cidade do país, jogadores negros da Seleção da França foram hostilizados durante jogo contra a Seleção Russa. E a FIFA só se pronunciou com relação ao assunto porque foi pressionada.

É na mesma Russia, homossexuais não tem direito de expressão e o Presidente Vladimir Putin instituiu lei por meio da qual o homem tem liberdade, com limites, de bater na esposa e filhos.

No campo das relações de trabalho, o fim de direitos trabalhistas, resultantes do bem-estar social instituído depois da II Guerra Mundial, parecem que estão morrendo, também. Começa a ganhar corpo, em âmbito mundial a máxima da alta produtividade a preços de mão de obra a custos baixíssimos.

Enfim, há dois caminhos: a ascensão da ‘ultradireita’ e apenas uma possibilidade entre as várias dentro do mundo democrático ou é um indicativo de novos tempos.

O certo é que o tempo de bonança do pós-guerra está, cada vez, mais distante. A era da pintura de Pablo Picasso, da Hollywood de Marlene Dietrich, do balé clássico, da bossa nova, da Disney, de Pelé e Martin Luther king, do U2 e The Beatles e Bob Marley estão dizendo adeus entre algoritmos e rotatividade de aplicativos.

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