Fonte: Blog Buliçoso
O evento, a ser promovido pela Agência Tambor, com o tema “Comunicação, Democracia e Desigualdade Social”, no dia 12 de setembro, terá a participação na mesa de debates da comunicadora popular Cristiane Furtado, ativista lésbica e feminista, que atualmente desenvolve pesquisa para um doutorado sobre a história do feminismo na Imprensa carioca.
Cristiane, que possui no currículo formação no Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), referência no Brasil na área de comunicação popular e sindical, é uma das fundadoras da revista Brejeiras, publicação direcionada ao público lésbico. A revista é trimestral, produzida por cinco mulheres, ativistas das causas feministas e lésbicas: Camila Marins, Cristiane Furtado, Laila Maria, Luísa Tapajós e Roberta Cassiano. A Brejeiras já trouxe uma entrevista com Neusa das Dores, uma das organizadoras do 1º Seminário Nacional de Lésbicas, que deu origem ao Dia da Visibilidade Lésbica, celebrado oficialmente em 29 de agosto.
A segunda edição também estampou na capa a arquiteta Mônica Benício, viúva da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ), executada covardemente em março, no Rio de Janeiro, com repercussão no mundo inteiro. Em depoimento sobre a revista, a viúva de Marielle declarou: “Fundamental ter um veículo de comunicação desse tipo. Quando eu tinha 19 anos e estava apaixonada por uma mulher, senti medo. Se existisse uma revista dessa, talvez eu não tivesse sofrido tanto”.
Cristiane falou com exclusividade ao blog Buliçoso, um dos apoiadores da iniciativa, sobre sua participação no evento articulado pela Agência Tambor. Confira abaixo:
O Brasil vive um momento escatológico, em que direitos assegurados pela ordem jurídica vigente são defecados e segmentos populacionais como negros, mulheres, indígenas e LGBTs achincalhados e negados pela maior autoridade da República. Qual a contribuição que a Brejeiras tem a dar na atual conjuntura?
A Revista Brejeiras é uma publicação impressa, feita por e para mulheres lésbicas, que busca em suas páginas ampliar imaginários, no quais, a construção do amor entre mulheres, o amar mulheres torna-se central. Num mundo patriarcal, machista e misógino, afirmar amar mulheres é revolucionário. Somos parte de um movimento de resistência, que se opõe a normatividade e a universalidade da história única há muitos séculos. Vivemos sim um momento difícil politicamente, de tempos sombrios, onde os discursos de ódio estão sendo bradados de forma direta e explícitos nas políticas brancas, racistas, machistas, LGBTfóbicas coloniais e neoliberais, sem as máscaras de uma modernidade progressista. Obviamente, não estou dizendo que todos os discursos e relações com o Estado são iguais, pois não são. O que quero dizer é que esse discurso violento que nos choca, sempre esteve presente, sempre esteve no poder, ocupando e executando um projeto de extermínio desses segmentos da população. Os personagens dos capitães, coronéis, generais, que hoje voltam a ocupar os lugares centrais nas terras do planalto, nunca de fato saíram das esferas de poder e decisão em nossa democracia, mesmo nos momentos de governos mais progressistas. Como disse a ativista lésbica Virgínia Figueiredo em entrevista para a 3ª edição da Revista Brejeiras – #ElasSim, Lésbicas na política – “após a ditadura as forças conservadoras continuaram lá e nós ainda não conseguimos colocar as nossas”. É importante destacar a ideia de continuidade que a fala de Virgínia traz, pois esta não aponta apenas para as desigualdades proporcionais dos cargos ocupados pelo voto direto, que é enorme, mas destaca a permanência do conservadorismo em todos os setores estruturais do poder. Nesse sentido, Brejeiras é movimento, é a construção de um espaço de liberdade, de opinião, de multidão, onde reunimos vozes de mulheres lésbicas e juntas confabulamos e nos organizamos para afirmar que continuaremos sendo resistência nas mais diferentes formas, pois é em nossos corpos (mulheres lésbicas, negras, travestis, transexuais, indígenas) que se inscrevem as lutas por distribuição de renda , moradia, meios de produção, memória e poder político.
O Maranhão possui o maior número de pessoas vivendo em situação de pobreza, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com 54,1% dos maranhenses vivendo com menos de R$ 406 por mês. Temos um alto índice de feminicídio e outros graves problemas. evento sobre Comunicação, Democracia e Desigualdade Social aqui no topo do mapa do Brasil, distante das grandes metrópoles?
Acredito na luta pela democratização da comunicação, pois como afirma a jornalista e editora da Revista Brejeiras, Camila Marins, a comunicação é um direito humano. A Revista Brejeiras é composta por cinco editoras que vem de diferentes lugares do Brasil, Luísa Tapajós é de Santarém (PA), Laila Maria é de Salvador (BA), Camila Marins é mineira de Santa Rita (MG), Roberta Cassiano é do Rio de Janeiro (RJ) e eu, Cris Furtado, sou de Porto Alegre (RS). Essa mistura de experiências de diferentes lugares marcam a construção da revista que procura em todas as edições trazer em suas páginas as alianças e articulações feitas com coletivas das diferentes regiões do Brasil. Há, entre nós, consciência e vivência da centralidade sudestina na distribuição de poder e dinheiro que governa o Brasil desde os tempos do Império, mas também dos processos de resistência e disputas à essa centralização. Falo de um projeto de poder que privilegia o eixo sul-sudeste, construído a ferro e fogo juntamente com o dispositivo de racialização colonial, um processo violento que aparece nos índices de precarização das vidas e distribuição de rendas. A mídia hegemônica reproduz com naturalidade hipócrita o foco sul-sudeste para representar o Brasil e isso é facilmente notável nos sotaques, corpos e cores que aparecem nas novelas, jornais ou em qualquer programação que pretenda ser nacional. Minha esposa, Luísa Tapajós, ficou chocada com o fato de que nesse momento em que o mundo grita e pede socorro para as queimadas na Amazônia, o que ganhou as manchetes da grande mídia sobre essa questão foi que “o céu de São Paulo escureceu”. Participar desse evento no Maranhão é estratégico, pois ao deslocar o olhar universalizante das metrópoles é possível compartilhar táticas, saberes e alianças que dialogam com diferentes realidades e firmar compromissos para o combate as desigualdades, a feminização da pobreza e as diferentes formas de opressão, além de tornar possível pensarmos e desejarmos juntos outras formas de comunicação e democracia. A feira de economia solidária Safeira, parceira da Revista Brejeiras desde a 2ª edição é um bom exemplo de como essas trocas de saberes e experiências são importantes. O combate à feminização da pobreza e o “acolhimento e resistência ao preconceito”, como elas descrevem , é feito através dessa estratégia de feira, onde as artesãs e artistas, mulheres lésbicas e bissexuais, podem expor seu trabalho, gerar alguma renda da venda de seus produtos e de suas apresentações e ainda ser uma espaço de encontro e acolhimento, um espaço seguro, de resistência ao preconceito. Essa estratégia compartilhada pela Safeira nos ensina a pensar formas de garantir que em nossas ocupações de militância, nas ruas e praças, em nossos eventos exista a preocupação em criar formas de gerar renda para mulheres lésbicas e criar espaços de segurança entre nós.
SERVIÇO
O quê? Comunicação, Democracia e Desigualdade Social
Quando? 12 de setembro
Onde? Auditório Central da UFMA
Horário? 17h
Inscrições: site www.agenciatambor.net.br
Contatos: (98) 98408 8580 ou (98) 98405 6689
Apoio: Afronte (coletivo estudantil), ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – Núcleo Maranhão), Abraço-MA (Associação Brasileira de Rádios Comunitárias do Maranhão), Apruma (Seção Sindical do Andes SN), Blog Buliçoso, Blog do Ed Wilson, Coletivo Célia Linhares, Coletivo de Mulheres Ufmistas, Coletivo Mães pela Diversidade, Coletivo Pinga Pinga, Conegro-Ufma, Comunidade Evangélica de Comissão Luterana em São Luís, Carabina Filmes, Caritas Brasileira Regional Nordeste-5, Comissão de Direitos Humanos da OAB-MA, Comissão Pastoral da Terra (CPT- -MA), Conselho Indigenista Missionário (CIMI-MA), CSP Conlutas, Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão – FETAEMA, Fóruns e Redes de Defesa dos Direitos da Cidadania do Estado do Maranhão, Fórum Maranhense de Mulheres, Grupo de Estudos Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA), Grupo de Estudos, Pesquisas e Extensão Lutas Sociais Igualdade e Diversidade – (LIDA/Uema), Grupo de Pesquisa História, Religião e Cultura Material (Rehcult), Igreja Cristã da Ilha, Igreja Evangélica Congregacional de São Luís, Movimento Articulado de Política Ativa (MAPA), Marcha Mundial das Mulheres, Movimento dos Quilombolas do Maranhão (Moquibom), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento Hip Hop Quilombo Urbano, Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), Movimento Reocupa, Najup Negro Cosme (UFMA), Núcleo de Mulheres Lésbicas, Núcleo de Estudos Rurais e Agrários da Universidade Federal do Maranhão (NERA/UFMA), Núcleo Marielle Franco, Observatório de Experiências Expandidas em Comunicação (ObEEC/UFMA), Sinasefe/Maracanã, Sinasefe/Monte Castelo, Sindicato dos Bancários do Maranhão, Sindicato dos Servidores da Assembleia Legislativa do Maranhão (Sindsalem), Sindicato dos Servidores Públicos Federais no Estado do Maranhão (Sindsep), Sindicato dos Urbanitários do Maranhão, Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos (SMDH), TV Comunidades, TV Quilombo.