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Charge, cartum e grafite agora são manifestações oficiais da cultura nacional

Lei deve jogar luz à imensa produção realizada no país desde os tempos do Império; acervo da FPA conta com importantes materiais de artes gráficas (Grafite em São Paulo, realizada pelo artista Felipe Yung Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Boletim Focus – O Segundo Reinado no Brasil, entre 1843 e 1889, é marcado pela reivindicação de uma identidade nacional. A história oficial do país, antes restrita aos interesses do imperador dom Pedro II, passou a ganhar outra versão com o surgimento de publicações jornalísticas com viés revolucionário.

Os textos eram escritos por republicanos, abolicionistas, escritores, intelectuais e, para dar cara às incendiárias publicações da época, uma inovadora geração de desenhistas inaugurou, sem saber, a arte gráfica do país.

Entre eles estava o ítalo-brasileiro Ângelo Agostini, que pintou com caneta bico de pena e nanquim os principais capítulos do período. Da luta pela abolição aos costumes nada ortodoxos da elite nacional, o artista ajudou a formatar a charge e o cartum brasileiro mesmo sem reconhecimento à altura.

De lá para cá, muitos outros nomes se consagraram, ainda que sob a sombra permanente da marginalidade que, de certa forma, ainda resiste no setor. Quase um século e meio depois, pelas mãos de Luiz Inácio Lula da Silva, a arte gráfica feita por aqui foi colocada, enfim, no lugar em que sempre mereceu estar.

Agora é lei

No dia 15 de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei que reconhece a charge, a caricatura, o cartum e o grafite como manifestações da cultura nacional.

A medida é resultado do Projeto de Lei Nº 24/2020, aprovado pelo Senado Federal em

setembro passado “Aprovamos aqui a questão dos grafites, do cartum, que poderia ser uma lei tranquilamente homenageando o nosso querido Henfil, homenageando o nosso querido Ziraldo, que já se foi, e tantos outros cartunistas e companheiros que tiveram um trabalho extraordinário”, afirmou o presidente Lula durante a sanção.

Lula não citou Henfil (1944/1988) por acaso. Considerado por muitos como o mais célebre “herdeiro” de Agostini, o artista despontou em todo o país não só pela qualidade de seus desenhos, mas principalmente pelo forte viés político de suas mensagens. Sua trajetória está ligada diretamente às lutas contra a Ditadura Militar, por direitos sociais e trabalhistas e, claro, pela redemocratização no país.

Parte do trabalho feito por Henfil pode ser encontrado no acervo da Fundação Perseu Abramo, por meio do trabalho feito pelo Centro de Documentação e Memória Sérgio Buarque de Holanda. Além de fotografias de Henfil com Lula ou em atos realizados pelo Partido dos Trabalhadores, há também inúmeras “tirinhas” feitas por ele para publicações progressistas que marcaram época.

Na extinta revista Mulheres, por exemplo, o talento do cartunista mineiro aparece de maneira arrebatadora para tratar de diversos temas, mas sempre tendo a liberdade de expressão como fio condutor.

No acervo da FPA também conta com outro nome importante da arte gráfica brasileira e, de quebra, escancara outro problema social: a invisibilidade das mulheres no setor. O trabalho da cartunista paulistana Ciça, embora reconhecido pelos amantes do cartum, ainda é pouco celebrado pelo grande público.

Cecília Vicente de Azevedo Alves Pinto é uma das poucas mulheres cartunistas na história brasileira, e tem como marca registrada as tirinhas com animais politizados como O Pato. Seu trabalho também fez parte da revista Mulheres.

Para a senadora Teresa Leitão, a lei aprovada por Lula deve fazer com que o trabalho de artistas como Henfil e Ciça ganham ainda mais projeção, além de fazer com que novos nomes possam surgir no país. Isso, claro, sem contar no impacto social causado por esse tipo de arte – que ainda conta com a potência do grafite brasileiro, cada vez reconhecido mundialmente.

“Primeiramente, há o fortalecimento da identidade cultural brasileira ao reconhecer oficialmente expressões que são profundamente enraizadas no cotidiano das cidades e nas práticas culturais populares. E oferecem novas oportunidades para artistas, promovendo a inclusão social e o desenvolvimento econômico em comunidades marginalizadas. O reconhecimento legal também pode contribuir para o combate ao preconceito e a criminalização dessas expressões, particularmente o grafite que muitas vezes é, erroneamente, associado a vandalismo”, afirmou a senadora, durante a cerimônia de aprovação da lei.

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