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“Geografia da fome” 75 anos depois

Por Luiz Eduardo Neves dos Santos, geógrafo e prof. Adjunto I da UFMA

Em 1946, quando Josué de Castro publicou Geografia da Fome, o Brasil tinha 41 milhões de habitantes e padecia de graves problemas: a esperança de vida era de 45 anos, a taxa de mortalidade infantil era de 147 óbitos a cada mil nascidos vivos, 56% da população acima dos 10 anos de idade era analfabeta e 69% vivia no campo. A obra pode ser considerada a mais relevante pesquisa socioespacial sobre o tema da fome já feita no país até hoje, primeiro pelo seu pioneirismo, segundo pelo rigor científico em abordagem qualitativa, feito em uma escala de análise espacial ampla e complexa, baseada no método geográfico interpretativo, e em terceiro lugar pela força e coragem da denúncia de um tema quase proibido na época.

Josué de Castro fez um mapa de áreas alimentares no país, dividindo-o em três tipologias, a saber: 1. Áreas de fome endêmica; 2. Áreas de epidemias de fome; e 3. Áreas de Subnutrição e a parte final do livro é dedicada ao Estudo do Conjunto Brasileiro. Traçou um perfil dos hábitos alimentares no Brasil como um todo, identificando carências específicas na Amazônia, no nordeste açucareiro e também no Centro-Sul.

Mas foi no território do Sertão Nordestino que o médico e geógrafo pernambucano mais concentrou seus esforços de análise, não por acaso, a região era castigada por episódios de fome severa, devido a estiagem cíclica. Baseado teórica e metodologicamente em geógrafos franceses como Pierre Deffontaines e Vidal de la Blache, discutindo o tema da fome com naturalistas como Euclides da Cunha e Rodolfo Teófilo, se utilizando da riqueza semântica, poética e narrativa de romancistas como Rachel de Queiroz e José Américo de Almeida, travando duros debates com Gilberto Freyre e citando os importantes estudos sobre alimentação do médico Orlando Parahim, Josué de Castro elaborou uma profícua análise da fome no sertão. No entanto, foi muito além das causas ambientais e climáticas, algo impregnado na consciência nacional da época. Constatou que o problema da miséria e da fome na região era estrutural, explicado por questões históricas, fundiárias e políticas.

Ao analisar o Brasil, Castro fez duras críticas ao pensamento dominante daquele tempo, que colocava a industrialização como a única via para o desenvolvimento do país. Chamou atenção para que o governo investisse também na economia agrícola, por isso o “dilema” descrito no subtítulo da obra: “pão ou aço”, alimentação ou industrialização? A resolução, segundo ele, seria compatibilizar pão e aço segundo a imposição das circunstâncias sociais e da disponibilidade econômica existente. O principal caminho seria a instauração de uma ampla reforma agrária, sendo preciso superar o obstáculo jurídico da propriedade privada mediante “justo valor” a ser pago pelo Estado.

No decorrer destes 75 anos da 1ª edição de Geografia da Fome, o Brasil passou por transformações substanciais, resolveu o problema do abastecimento alimentar, aumentou e diversificou a produção agrícola, e de um modo geral sanou problemas mais específicos de carências alimentares, comuns nos anos 1940. Mas desde o início do 2º mandato de Dilma Roussef, momento do aprofundamento de uma agenda neoliberal, de ajuste fiscal e de seu impeachment em 2016, houve uma maior expansão das desigualdades sociais no país, resultado do baixo crescimento econômico, da redução drástica dos investimentos públicos, da flexibilização no mercado de trabalho, da turbulência política e da retração dos gastos com políticas sociais. 

Atualmente, em meio a mais grave pandemia em cem anos, a fome atingiu cerca de 19 milhões de brasileiros em 2020 de acordo com o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, produzido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (PENSSAN), um documento de 66 páginas que atesta ainda que 116,8 milhões de pessoas no país convivem com algum tipo de insegurança alimentar em seu cotidiano.

O mais é revoltante é constatar que, a despeito das transferências de renda em 2020 e 2021, destinadas a famílias vulnerabilizadas, o governo federal não demonstra preocupação com a calamidade da fome em território nacional, visto que não há qualquer agenda política de estímulo a implantação de programas sociais para tratar o problema. Por outro lado, é possível observar uma postura governamental que contribui para os desmatamentos, a grilagem de terras e os garimpos ilegais na Amazônia, além do incentivo ao agronegócio, ao latifúndio e às monoculturas, ocasionando ameaças às comunidades tradicionais, suscetíveis à destruição de seus territórios e seus modos de vida pela sanha de megaprojetos mineiros, agropecuários e industriais.

Pelo exposto, é inadiável que se resgate e coloque em prática o legado de Josué de Castro. Sua Geografia da Fome nos mostra ainda hoje que os interesses mercantis de acumulação, materializados pela aliança entre elite nacional e grande capital financeiro, continuam sendo os principais responsáveis pela concentração de riqueza, pelo racismo ambiental e expropriação de camponeses, pela opressão às comunidades indígenas e quilombolas, extermínio de populações pretas nas cidades e pela destruição de biomas e ecossistemas no país. As consequências deste processo são o alastramento do desemprego, da miséria e da fome, ratificando o nosso persistente subdesenvolvimento, algo que só começará a ser superado, como o próprio Josué preconizou décadas atrás, com a definitiva emancipação alimentar do povo.

Artigo publicado em O Imparcial, dia 7 de junho de 2021

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No Maranhão, Arraial da Vacinação encerra com 5 mil doses aplicadas

O Governo do Maranhão promoveu o primeiro Arraial da Vacinação com 28 horas de atendimento ininterrupto no drive-thru do estacionamento do Pátio Norte Shopping, neste sábado (5) e domingo (6). No total, 5 mil pessoas da Grande Ilha de São Luís participaram da grande mobilização para vacinar contra a Covid-19.

O governador Flávio Dino compareceu à ação durante a noite do sábado e anunciou que vai repetir a estratégia em outras cidades do estado. “Este modelo é vitorioso, por isso vamos levar o Arraial da Vacinação para a cidade de Timon”, disse.

Enquanto esperavam a vez, os moradores da Grande Ilha de carro, moto ou bicicleta receberam mingau de milho e assistiam a apresentações de atrações culturais tradicionais deste período junino. O último carro deixou o Arraial da Vacinação um pouco antes das 13h deste domingo.

O Arraial da Vacinação foi realizado pela Secretaria de Estado da Saúde (SES), em apoio aos municípios da Grande Ilha, para acelerar a vacinação contra a Covid-19. “A gente vai manter este ritmo. A ideia é esgotar as 300 mil doses da Grande Ilha e avançar com as estratégias de vacinação no interior do estado. Até o momento, o Maranhão vacinou 20% da população com a primeira dose e vamos fazer a busca ativa das pessoas que precisam receber a segunda dose para completar o esquema de vacinação”, explicou o secretário Carlos Lula.

A Secretaria de Estado da Cultura (Secma) colocou mais de 20 atrações para entreter a população durante as 28 horas de Arraial, dentre elas, Tambor de Crioula e Cacuriá de Dona Teté.

Drive da Vacinação

Nesta segunda-feira (7), a vacinação para moradores de Paço do Lumiar ou São José de Ribamar continua no drive-thru do estacionamento do Pátio Norte Shopping. 

É necessário ter idade a partir de 38 anos, apresentar documento com foto, comprovante de residência, cartão de vacinação e cartão do SUS. O serviço funciona de segunda a sexta, das 8h às 16h, e aos sábados, das 8h às 12h.

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Bolsonaro não é burro. Ele tem uma estratégia e sabe onde quer chegar

Ed Wilson Araújo

Pelo menos três vezes por dia Jair Bolsonaro e seus filhos soltam uma verborragia para alimentar as redes sociais.

E nós?!

Passamos horas e horas em longas réplicas e tréplicas, travando extenuantes debates com a torcida organizada bolsonarista.

Eles são profissionais nesse ramo.

E nós?! Movidos pela ânsia de refutar as aberrações, vamos entrando no labirinto da irracionalidade. Às vezes sem perceber.

Nenhum discurso iluminista, baseado na Ciência ou na razão, vai mudar o pensamento de um bolsonarista fanático.

Mal respiramos dos palavreados chulos vomitados no café da manhã da família Bolsonaro e já estamos envolvidos em novas polêmicas provocadas por alguma declaração, gesto ou medida esdrúxula.

Assim, ele nos condiciona ao envolvimento na bolha da sua própria agenda e dita a pauta, enquanto passa a boiada no parlamento e nas ações executivas.

O eixo central da liderança estratégica de Jair Bolsonaro é nos manter presos ao círculo de debates infrutíferos que ele próprio traça com um pedaço de giz. Em torno dele, da sua verborreia incontrolada, gravitam os partidos, a mídia e as lideranças políticas, incluindo a oposição.

Nesse aspecto, ele busca se diferenciar do político tradicional ou da velha política onde fez carreira e enfiou os filhos.

Esse tipo de hipocrisia movimenta o jogo: afirmar e depois negar ou fazer algo que condena e posteriormente se aproveitar da situação.

Qual presidente ficou tanto tempo sem partido durante o exercício do cargo? A negação das legendas faz parte das táticas. Ele não precisa de siglas para governar, tanto é que usou outros critérios para lotear a gestão entre militares, evangélicos e ruralistas.

Houve a tentativa de criar um partido para chamar de seu – o Aliança pelo Brasil – mas o redemoinho da conjuntura alterou a tática para algo menos trabalhoso e mais pragmático: comprar o Centrão.

Jair Bolsonaro não enganou ninguém. A representação da sua liderança junto ao público cativo, no sentido rigoroso do termo (para designar o escravo preso no cativeiro), decorre de uma absurda sinceridade.

Ele é o que é e ponto final: homofóbico, racista, armamentista, genocida, macho hétero e indiferente ao sofrimento das outras pessoas. Pouco importa se o Brasil foi transformado em necrotério…

O presidente tem um canal direto com o seu eleitorado. Não precisa de intermediários da mídia de mercado. Os conglomerados são periféricos na estratégia da extrema-direita. Servem apenas para repercutir a agenda produzida intencionalmente pelo modo bolsonarista de governar.

Esse processo de repulsa aos meios convencionais fez uma parte da audiência deixar de assistir às instituições sagradas da televisão como o Jornal Nacional e o Fantástico, ambos da Rede Globo, para aderir à aberração Silvio Santos.

O eleitor da extrema direita é fiel sob qualquer cenário ou circunstância. Ele recebe e distribui conteúdo diariamente nas redes sociais. É um trabalhador da mentira, engajado no fanatismo, discípulo da crença, adepto do “mito”.

Durante décadas a academia e os jornalistas críticos escreveram variados livros, dissertações e teses fundamentadas sobre o caráter manipulador e golpista dos grandes meios de comunicação, celebrando o conceito de coronelismo eletrônico.

Bolsonaro conseguiu desmascarar a mídia convencional de forma enviesada, simplificando o discurso com uma hastag: #GloboLixo.

É claro que outros ingredientes estão associados a esse processo, como a poderosa indústria de desinformação utilizada nas eleições de 2018, na vitória de Donald Trump e no Brexit.

Montado no cavalo da insanidade, Jair Bolsonaro vai tangendo o gado.

Com uma só chicotada, ele se desfez da suposta seriedade da mídia lavajatista e da enganosa austeridade de Sergio Moro. Espertamente, o bolsonarismo surfou na onda do jornalismo lavajateiro e do morismo para depois jogá-los no abismo da desconfiança.

E ainda põe na arena os constantes ataques à Justiça, focados no STF, e ao Jornalismo, preferencialmente a Rede Globo, cavalgando sobre os mortos no cemitério da covid19 com o discurso de defensor dos trabalhadores contra as medidas restritivas.

Para o eleitor fanático, a agressividade do presidente funciona como uma espécie de defesa. Ele se comporta como “vítima do sistema da velha política” que não deixa fazer as mudanças.

A vitimização opera tanto quanto a transferência de culpa, atribuída ao “sistema”, “aos políticos”. No caso da pandemia, a culpa é dos governadores e prefeitos.

O eleitorado “fechado com Bolsonaro” representa uma aliança sólida, independente do que puder acontecer de pior: mortes, violência, quebra da economia, desemprego e miséria.

Toda a agenda negativa do governo é refutada pela poderosa indústria da desinformação que abastece diariamente os seguidores da extrema direita com uma gigantesca carga de dúvida sobre os meios de comunicação convencionais.

TVs, jornais, sites e emissoras de rádio são desprezados pelo presidente em sua live semanal, onde ele se comunica diretamente com o seu público.

A operação de guerra nas redes digitais ganha reforço nas ruas, convergindo o virtual e o real no movimento de construção da sua reeleição para completar o trabalho obstruído pelo “sistema”.

O bolsonarismo ainda posicionado na condição de um movimento (e não um regime) prega a liberdade sem limites contra a política, uma espécie de retorno ao estado de natureza ou guerra de todos contra todos, quando vigora o poder da força: os tratores, as motos, as armas…os impulsos.

A estratégia está clara. Ele veio para destruir tudo isso que está aí, eliminando os inimigos artificiais e os reais: os “pedófilos do comunismo”, o STF, o Jornalismo, a esquerda em geral, a Educação, a Ciência, a comunidade GLBT, indígenas, quilombolas e os povos da floresta.

Jair Bolsonaro atravessa a pandemia negando a doença, a Ciência e a vida. Apesar de tudo isso, infelizmente, pode ir ao segundo turno em 2022.

Quem vê no presidente um burro está redondamente enganado. Ele tem uma estratégia e sabe onde quer chegar.

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Maranhense radicado no Canadá, Rommel lança o EP “Bússola das Andorinhas”

Trabalho lançado nessa sexta-feira (4) reúne cinco faixas do artista, gravadas à distância, com músicos brasileiros e canadenses

Inteiramente gravado à distância, em atenção às normas de segurança sanitária por conta da pandemia de covid-19, “Bússola das andorinhas” tem a colaboração de músicos brasileiros e canadenses e letras em português, inglês e francês. O EP apresenta cinco faixas, quatro delas já lançadas como singles e a inédita faixa-título.

Rommel assina as canções em parcerias com Enrico Lima, Fernando Moreno, Antonio Marinho, João Bouhid e Damian Birbrier. O clima das canções é contemplativo, uma espécie de “quase meditação”, o que é traduzido na produção, arranjos e instrumentação de cada uma das canções.

A faixa-título é um ijexá leve e singelo, com combinações inusitadas de viola caipira e viola de arco em diálogo com piano, contrabaixo, guitarra e bateria. A interpretação de Rommel, que também toca violão na faixa, é firme e convincente. Em resumo: canta com paixão e entrega.

 “A ideia é levar leveza, delicadeza, afeto, compaixão e esperança em forma de música como uma resposta ao momento difícil e triste em que vivemos”, reflete Rommel.

Cantada em inglês e francês, “Ray on” é uma homenagem ao artista plástico Raymond Nylund, artista plástico de Montreal. A gravação conta com o a voz doce da cantora argentina Amparo Döm, contrastando com o canto lírico dos canadenses Jordan Zalis e Priya Shah.

“Escutando as estrelas” homenageia uma das grandes constelações do Brasil: a dos sanfoneiros. Especialmente o saudoso mestre Dominguinhos (1941-2013) e o maranhense Zé Américo Bastos. A faixa conta com a adesão de Mestrinho, um dos grandes nomes brasileiros do instrumento na atualidade.

Serviço: O EP “Bússola das andorinhas” estará disponível em todas as plataformas digitais dia 4 de junho (sexta-feira). Dia 5, em seu instagram, ele apresenta um show em formato live, para marcar o lançamento do trabalho. Dia 9, em seu canal no youtube, será lançado o videoclipe da faixa-título; e dia 16, o videoclipe de “Vicejar”.

 Siga Rommel nas redes sociais:

 Instagram e facebook: @rommelribeiromusic

Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCF1X4nRxe_2f1lGOKryH_Zg

Site: www.rommelribeiro.com

Veja o teaser de “Bússola das andorinhas”: https://www.youtube.com/watch?v=Q-7DmN8hXsQ

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A PM está perdendo o controle?

No conjunto dos trabalhadores da Segurança está fincada uma das principais bases do bolsonarismo. Essa ampla camada de brasileiros sente-se contemplada pelo espírito bélico e autoritário do presidente, alcançando desde guarda municipal até general.

O episódio do perdão ao ex-ministro e general Eduardo Pazuello é uma espécie de humilhação ao Exército.

Embora o conjunto das Forças Armadas não se coloque aos pés de Jair Bolsonaro, as instâncias média e baixa da área de Segurança estão “fechados” com a reeleição do presidente em 2022.

Alguns sinais precisam ser observados: 1 – A rebelião da PM no Ceará, naquele episódio em que o senador Cid Gomes (PDT) foi baleado; 2 – A repressão de um grupo de policiais, sem comando, contra manifestantes em Recife, durante o ato “fora Bolsonaro”; 3 – A detenção (pela PM de Goiânia) de um dirigente do PT, motivada por uma faixa estendida no capô do carro com a frase “fora Bolsonaro genocida”; 4 – A violência de um guarda municipal em Balneário Camboriú contra os organizadores de uma festa de rap.

O caso mais grave foi registrado em Recife, onde nem mesmo o governador de Pernambuco sabe de onde partiu a ordem para o ataque da PM contra os manifestantes, que resultou em um homem cego após ser atingido por um tiro de bala de borracha.

Os atos antidemocráticos e todo o conjunto de manifestações pró-ditadura sincronizam o bolsonarismo armamentista, militarista e fanático.

Não há motivos para generalização, mas as quatro situações mencionadas dizem respeito a algumas práticas não pertinentes às regras da área de Segurança, como quebra de hierarquia e ação sem comando.

Tudo isso serve para refletir sobre um possível cenário da eleição de 2022. Algumas avaliações projetam um alinhamento de Jair Bolsonaro com as ações de Donald Trump após a derrota na eleição presidencial dos EUA, quando ele se recusou a reconhecer o resultado e convocou seus adeptos fanáticos para uma tresloucada invasão do Capitólio.

Bolsonaro vem repetindo seguidamente que a urna eletrônica adotada pela Justiça Eleitoral do Brasil não é confiável. Ele prega a o retorno do voto impresso como forma de emoldurar o jogo da dúvida sobre a máquina de votar. Esses movimentos não estão ocorrendo por acaso.

Bolsonaro prepara terreno para um cenário tenebroso no próximo ano.

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Polícia Federal vai investigar a violação de sítios arqueológicos em comunidades quilombolas do Maranhão

O superintendente da Polícia Federal no Maranhão, Renato Madsen; e o delegado regional de Investigação e Combate ao Crime Organizado (DRCOR), Leandro Ribeiro, receberam hoje um dossiê contendo reportagens e vários documentos adicionais comprobatórios sobre a perfuração de subsolo e retirada ilegal de objetos arqueológicos das comunidades quilombolas de São Félix e Mutaca, em Bacuri, município localizado no litoral ocidental do Maranhão.

Entre os documentos contidos no dossiê está o despacho do Ministério Público Federal (MPF) encaminhado à Polícia Federal solicitando a instauração de inquérito visando apurar os fatos. Segundo o superintendente Renato Madsen, os relatos e os documentos apresentados vão subsidiar a investigação sobre os atos ilegais praticados contra as comunidades quilombolas.

A reunião para a entrega dos documentos foi mediada pelo advogado e presidente da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da OAB/MA, Erik Moraes, com a participação do jornalista e professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) Ed Wilson Araújo.

O assunto veio à tona em duas reportagens da série “A nova pirataria francesa em terras quilombolas no Maranhão”, publicadas no Blog do Ed Wilson, em 2019, uma delas vencedora do Prêmio de Jornalismo do Ministério Público (MP) do Maranhão.

As reportagens evidenciaram a perfuração ilegal de sítios arqueológicos, a retirada de objetos de valor histórico e cultural e o depósito das peças em uma casa localizada no povoado Portugal, em Bacuri, alugada para os autores das escavações irregulares: o francês François-Xavier Pelletier e a brasileira (paraense) Magnólia de Oliveira.

Os objetos arqueológicos foram descobertos na casa após o cumprimento de um mandado de busca e apreensão cumprido pela Polícia Civil, com apoio da Polícia Militar. Pelletier e Oliveira não estavam no local quando os policiais adentaram à residência.

A dupla franco-brasileira não tem formação em Arqueologia e nem autorização de órgãos federais como o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) para fazer perfurações ou retirada de objetos no subsolo brasileiro.

De acordo com o relatório apresentado pelo Iphan, houve várias irregularidades durante as escavações e o transporte ilegal dos objetos.

François-Xavier Pelletier e Magnólia de Oliveira prometeram aos moradores dos povoados que os objetos retirados seriam expostos em um museu a ser criado em Bacuri.

Após as reportagens do Blog do Ed Wilson e a repercussão em vários meios de comunicação, a dupla evadiu-se das áreas quilombolas e não foi mais localizada na sede do município.

Imagem destacada / Superintendente da PF Renato Madsen, jornalista Ed Wilson Araújo, advogado Erik Moraes e o delegado Leando Ribeiro

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Luiz Pedro e a coragem de fazer a coisa certa

Guilherme Zagallo, advogado.

O ex-deputado estadual Luiz Pedro, que faleceu na madrugada de hoje, foi um político de posições corajosas. Gostaria de compartilhar um pouco desse histórico a partir de seu posicionamento de 2004 a 2007 contra a instalação de um grande empreendimento poluente na ilha de São Luís.

Luiz Pedro foi um dos poucos deputados estaduais que se posicionou contra a instalação do Polo Siderúrgico da Vale em São Luís no ano de 2004 (junto com Domingos Dutra e Helena Heluy). Na Câmara de Vereadores a situação não era diferente e somente Abdon Murad, Joberval Bertoldo e Marilia Mendonça se manifestaram contra a implantação do polo siderúrgico para produção anual de 22,5 milhões de toneladas de aço a menos de seis quilômetros do centro de São Luís.

Em discurso na Assembleia Legislativa em 13 de dezembro de 2004, quando o debate sobre o assunto estava apenas iniciando, afirmou que “ainda é tempo de salvar a nossa ilha, ao mesmo tempo que garantimos empregos e investimentos para o Maranhão, levando esses empreendimentos para a parte continental do Maranhão”.

Em 21 de fevereiro de 2005 ele explicou seu posicionamento, ao afirmar que “isso (a instalação do polo siderúrgico) não pode ser feito à custa do sofrimento, da qualidade de vida e da ameaça à saúde da população dos quatro municípios da Ilha”, para em seguida concluir que “a instalação desses empreendimentos no continente, onde não cause tanto impacto e onde a concentração populacional seja menor, mais rarefeita, é indispensável”.

Há uma frase sua de 10 de junho de 2005 em que declarou: “O que nos alegra é ver que no início éramos apenas um número reduzido de deputados nesta Casa [contrários à localização das usinas em São Luís] e foi crescendo, ganhando a simpatia de outros colegas”. Ele foi um dos motores do convencimento de alguns dos colegas deputados, que posteriormente se manifestaram contra a implantação do polo siderúrgico em São Luís, como Aderson Lago, Carlos Braide, Julião Amin e Rubem Brito.

Em 2007, já como Chefe de Gabinete do Governador Jackson Lago, participou das tratativas que deixaram claro que se a empresa pretendia avançar com o projeto, deveria cogitar sua implantação no continente e não na ilha.

Esse posicionamento firme minimizou o avanço da poluição industrial em São Luís, hoje um dos seus principais problemas, com a emissão de 48 mil toneladas anuais de poluentes tóxicos, inclusive com a ultrapassagem dos padrões legais vigentes, além da contaminação de águas superficiais e subterrâneas, e de peixes por metais pesados. A soma desses efeitos negativos da industrialização faz com que São Luís seja uma das cidades mais poluídas do Brasil, com claros e danosos efeitos sobre a saúde e vida de sua população.

Assim, no momento de sua partida devemos saudar a coragem de fazer a coisa certa quando isso era difícil e gerava críticas dos meios de comunicação, afirmando em alto e bom som: Luiz Pedro, presente!!

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Nem uma vírgula!

Eloy Melonio é professor, escritor, poeta e compositor

Muito usados em quase todas as línguas, os sinais de pontuação facilitam a vida dos profissionais da escrita (escritores, jornalistas, redatores) e de todo aquele que precisa escrever textos (relatórios, cartas, e-mails). Até nossos amigos das redes sociais entram nesse grupo. Parece algo sem importância, mas, quando malcolocados ou não usados, causam sérios problemas à clareza da comunicação.

Entre eles, a nossa tão necessária “vírgula” é o mais violado. Usá-la ou não é um dilema que deixa atônitos os produtores de textos em geral. O manual de redação de um grande jornal lembra: “Quando bem-empregadas, contribuem para dar clareza, precisão e elegância às suas frases. Em excesso, provocam confusão e cansaço”. Num outro, um recado valioso: “Frase cheia de vírgulas está pedindo um ponto”.

Nunca me esqueci de um livro de bolso que ganhei de um amigo americano, intitulado COMMAS ARE OUR BEST FRIENDS (As vírgulas são as nossas melhores amigas). Foi ele (o livro) que me fez abrir os olhos e me apaixonar por esse sinalzinho tão precioso. Desde então, …

Sem dúvida, a vírgula é o sinal gráfico mais presente em nossos textos. Não se escreve bem sem se recorrer aos seus préstimos. Mas como é aviltada! Como sofre nas mãos dos que não sabem fazer uso de suas propriedades! Imagine alguém lhe pedindo para fazer algo que não é do seu ofício?! Pois é isso o que acontece com a pobrezinha. Usam e abusam de sua disponibilidade. É jogada de um lado para o outro sem o menor critério. E o pior é quando é esquecida, menosprezada, mandada para onde não gostaria de ir.

No fundo, a vírgula reclama de duas coisas: do abuso e do descaso. Essa confusão sempre me incomodou. E, assim, passei a refletir sobre o problema e decidi sair em sua defesa. Porque — verdade seja dita — ela é generosa e confiável, sempre disponível para o que der e vier. Por isso não entendo por que as pessoas a fazem de “otária” ou “burro de carga”.

Sua suposta insignificância chega ao cúmulo da insensatez gramatical quando alguém se atreve a tirar sarro com a sua cara. Um dia desses ouvi uma personagem de telenovela enfaticamente esbravejar: “E fique sabendo que eu não tiro uma vírgula do que já disse”.

Tanta coisa envolvendo uma criatura aparentemente inofensiva seria maldição ou o calcanhar-de-aquiles de muitos escritores?

Para escrever esta crônica, por exemplo, precisei fazer várias consultas e revisões. Principalmente — perdoem-me a sinceridade! —, por causa dessa “danadinha”.

Uma coisa é certa: não dá para viver sem ela. Abro o jornal, lá está ela metida com política, economia e criminalidade. Vou para os livros, encontro-a geralmente bem-comportada. Nos anúncios publicitários, esquecida. Nas redes sociais, em precário estado de lucidez. Até no “guia do estudante” da minha faculdade, fizeram-na passar vexame, sujando a beleza gráfica do livrete. E — pasmem! — notáveis figuras de nossas letras também escorregam na casca da vírgula.

Já imaginou se um dia ela se revolta e deixa de comparecer aos nossos textos? Que seria dos aficionados pela arte de escrever? Suas ideias teriam o mesmo sentido? E os leitores? Poderiam ler como se estivessem ouvindo a voz do escritor?

Nem pensar! Sem ela, nossos textos não teriam o mesmo sentido, a mesma poesia. Por isso é dever de todo escritor valorizar “a vírgula nossa de cada dia”. Preciso tanto dela que, antes de começar a escrever, sempre tenho à mão uma folha com as regras para o seu uso. E vejo-me, a todo instante, pescando as dicas para empregá-la corretamente. Vez por outra, deparo-me com erros, vaciladas. E penso: Como pude cometer esse erro? E aí descubro quanto tenho de trabalhar minha intimidade com essa figura emblemática de nossa boa e velha “flor do Lácio”.

Desencantada, a pobre vírgula, espera ser mais respeitada.

“Epa!”, minha “vírgula-da-guarda” me cutuca, mostrando que acabei de meter a coitadinha numa encrenca. Cometi o tal “erro crasso”, um gravíssimo delito gramatical. Usei-a para separar o sujeito do predicado, exatamente o cochilo que mais me incomoda.

“Tá bom, vou consertar”, prometo, decepcionado. “Não”, replica a angelical entidade gráfica. “Deixe-o aí, para alertar os desatentos e despreparados. Quem sabe um dia aprendam a evitar o mais elementar dos erros.”

Que alívio! Ainda bem que a vírgula é “gente fina” e aguenta bem essas agressões. Já pensou se ela resolve reagir tal qual minha querida conterrânea Alcione Nazaré: Não sei se vou aturar esses seus abusos / Não sei se vou suportar esses seus absurdos. Felizmente, a vírgula já provou ser tolerante, paciente e compreensiva.

Muitas são as sacadas inspiradoras iluminando nossa personagem. Mas nenhuma se compara à irreverente citação do advogado e político carioca Tenório Cavalcanti (1906-1987) sobre sua inquestionável importância: Não, estou bem. Mas se tirar a vírgula eu fico mal.

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Imprensa no Maranhão nasceu áulica. E hoje, como está?

Criado em 1821, o jornal “O Conciliador do Maranhão” é a principal referência histórica para demarcar o surgimento da Imprensa no Maranhão. Em abril daquele ano o periódico começou a circular manuscrito e posteriormente, em novembro, com a implantação da tipografia, passou a ser impresso.

O jornal era controlado pelo governador Pinto da Fonseca, que escolheu a dedo os redatores da sua maior confiança para servir aos interesses oficiais. Era uma publicação áulica, bajulatória.

Nos ruidosos anos 20 do século XIX, “O Conciliador” esteve no centro das polêmicas e contendas políticas locais, incluindo a disputa que resultou na adesão do Maranhão à Independência do Brasil.

Pinto da Fonseca tinha total controle sobre o jornal e governava com mão de ferro no tratamento dos seus adversários.

200 anos depois a Imprensa no Maranhão segue influenciada pelo poder político e econômico do Palácio dos Leões, sede do Governo do Estado; e do vizinho Palácio La Ravardière, onde está localizada a Prefeitura de São Luís.

A razão é simples. Os dois palácios manejam as verbas publicitárias que abastecem os meios de comunicação e, consequentemente, orientam as linhas editoriais dos veículos. O Governo do Maranhão e a Prefeitura de São Luís são os maiores anunciantes da mídia no estado.

O surgimento e a gestão de “O Conciliador” servem como parâmetro para observar o alinhamento dos meios de comunicação no Maranhão aos governadores(as) e aos prefeitos(as) da capital ao longo do tempo.

Na atual gestão do governador Flávio Dino (PCdoB) há uma conciliação geral do Palácio dos Leões com as grandes empresas de comunicação detentoras das maiores audiências, além do alinhamento governamental das médias e pequenas emissoras de rádio e televisão, com raras exceções.

Até mesmo o Sistema Mirante de Comunicação, sob o controle da família liderada por José Sarney, está relativamente conciliada ao Palácio dos Leões.

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Cidade quente: calor e o Plano Diretor de São Luís

O calor excessivo nas duas últimas semanas em São Luís tem uma explicação científica do Núcleo de Meteorologia da Universidade Estadual do Maranhão (Uema). Trata-se de um fenômeno denominado veranico, caracterizado por um período de estiagem dentro da estação chuvosa, quando ocorre alta incidência de radiação solar e pouca nebulosidade.

Embora o calor exagerado decorrente do veranico tenha fundamento na Meteorologia, as temperaturas elevadas em São Luís são perceptíveis em outras épocas do ano.

Nesse contexto, é importante observar as mudanças projetadas na legislação urbanística. Recentemente o vereador Astro de Ogum (PCdoB) anunciou que vai retomar o processo de revisão do Plano Diretor de São Luís.

O núcleo duro da proposta, concebida nos dois mandatos do prefeito Edivaldo Holanda Junior (2012-2020), é converter a cidade em um formato portuário e industrial. Para alcançar esse objetivo uma das metas visa eliminar 40% da zona rural de São Luís.

As consequências imediatas da redução desse território serão a eliminação da cobertura vegetal, redução da área de absorção das águas das chuvas e deslocamento dos moradores para outros bairros.

Toda a ilha de São Luís será afetada por essas mudanças, que terão impacto no fornecimento de água potável e nas temperaturas: menos vegetação, mais calor e diminuição das áreas de recarga de aquíferos.

O sítio Santa Eulália e as dunas também podem ser afetados. “Dentre as principais alterações propostas estão a redução de 8.643 hectares na zona rural do município, que passaria de 20.820 hectares para 12.177 hectares, a redução de 11,5 hectares da área de dunas, a diminuição das áreas de recarga de aquíferos e a redução parcial da área protegida no Sítio Santa Eulália”, pontua o advogado Guilherme Zagallo, em artigo publicado neste blog.

A revisão se arrasta desde 2016 e foi adiada por força da mobilização dos movimentos sociais que demandaram o Ministério Público, a Câmara dos Vereadores e a Prefeitura de São Luís para incluir na alteração da legislação urbanística alguns componentes fundamentais – a participação da população nas audiências públicas, ampla divulgação e transparência nas etapas.

Vamos aguardar e conferir a nova tentativa de mudar a legislação urbanística de São Luís.

O debate será quente.

Imagem capturada no site imirante.com