“Screvo meu livro à beira-mágua.
Meu coração não tem que Ter.
Tenho meus olhos quentes de água.
Só tu, Senhor, me dás viver.
Só te sentir e te pensar
Meus dias vácuos enche a doura
Mas quando quererás voltar?
Quando é o Rei? Quando é a Hora?
Quando virás a ser o Christo
De a quem morreu o falso Deus,
E a despertar do mal que existo
A Nova Terra e os Novos Céus?
Quando virás, ó Encoberto?
Sonho das eras portuguez,
Tornar-me mais que o sopro incerto
De um grande anceio que Deus fez?
Ah, quando quererás, voltando,
Fazer minha esperança amor?
Da nevoa e da saudade quando?
Quando, meu sonho e meu Senhor?”
(Mensagem, de Fernando Pessoa)
O Rei e o Touro Encantado ou
Quem acertar-lhe a testa trará azar que nem presta
Autor: Carlos Agostinho Couto
Desde pequeno entronado
Pra história ficaria
Seja por seu reinado
Ou pelo que um dia viria
Do Sebastião decantado
Muito se saberia
……..
Seu passamento ligeiro
Foi coisa mais que histórica
Abalou um povo inteiro
E, na aventura despótica
Precipitou um sendero
A tal União Ibérica
……..
Em lampejo triunfante
Planejou uma cruzada
Não vacilou um instante
Sem temer encruzilhada
O mar cruzaria rompante
E levaria a sua armada
…….
Da grande conquista suposta
Não saberia o devir
Marrocos entrou pela costa
Na luta de Alcácer-Quibir
Dura derrota imposta
Sumiria sem mais vir
………
Virou herói na terrinha
Numa história sem igual
Seja em prece ou ladainha
Voltaria triunfal
Com a espada em bainha
Pra redimir Portugal
……..
Se de navio ou pensamento
Não se sabe afirmar
Não sossegou um momento
Seu nome atravessou o mar
Pra no Brasil criar assento
E o Rio de Janeiro batizar
………
Mas andou por outros cantos
Num país de muito chão
Virou também um encanto
E com muita inspiração
Acabou um quase-santo
Aqui pelo Maranhão
………..
Aterrissou nos lençóis
Não no parque oriental
Mas na ilha de muitos sóis
Pós Baixada Ocidental
Terra de pesca e anzóis
É querido, temido e tal
………..
De rei a herói e lenda
Sebastião foi por lá ficando
Pra aquele povo sem renda
Mas que vive imaginando
Traria, como uma prenda
Esperança contra o desmando
……….
Está em baixo da areia
Na duna mais que formosa
Como em canto de sereia
Atitude majestosa
A escuridão incendeia
Venerado em verso e prosa
………
Nas noites de muita lua
Grande touro se traveste
Na praia deserta e nua
Sem avisar e sem teste
Celebra a dança só sua
Quem tem medo lhe empreste
…………
Mas a sina do encantado
Não acabará em festa
Afundará a ilha e o reinado
Da capital imodesta
Se um dia for flechado
Em sua estrela na testa
(Carlos Agostinho Couto, São Luís/MA – Março de 2024)
Imagem destacada / Vista das dunas na Ilha dos Lençóis / Fonte: Pinterest
2 respostas em “O Rei e o Touro Encantado ou Quem acertar-lhe a testa trará azar que nem presta”
Guto que o “encantamento” da forma poema seja sempre um encontro da mais fina humanização de nossa amizade.
lá onde reina dom sebastião
o povo não roça mas tem zangaria
a terra é mãe boa e nos dá o pão
seu riba espera maré lá no rancho
e gente na frente da televisão
lá onde reina dom sebastião
de boca em boca a memória resiste
contando as estórias da encantaria
e não é só lenda também é história
cultura do povo e sabedoria
lá onde reina dom sebastião
a chuva caindo lá vira lagoa
pintando a paisagem de verde e azul
a noite é do rei quando a lua tá cheia
e o vento cantando de norte a sul
lá onde reina dom sebastião
tem o festejo nomês de janeiro
terreiro de mina e bumba meu boi
toadas de dunga e seu piedade
e xengo do brega para quem não foi
trabalho cachaça e vadiação
trabalho puteiro e baseadão
trabalho (e o dinheiro)
quem ganha é o patrão