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O voto e a saudade

Eloy Melonio é professor, escritor, letrista e poeta.

Oi, pessoal!

Saudações a todas, todos, e todos os outros todos.

Eu sou José Eleitorino, um eleitor com muitas eleições nas costas, igualzinho a tantos outros que vocês veem por aí.

Mesmo não sendo mais obrigado a votar, não deixo de exercer esse direito fundamental. Para mim, o voto é sagrado. Gostem ou não das minhas escolhas, não abro mão delas. Já ganhei e já perdi muitas vezes nessa dança democrática.

Nestas eleições, os candidatos são os grandes artistas. Quase não ouço mais falar de Lulu Santos, Fernanda Montenegro, Tony Ramos & companhia. Ligo o rádio, e lá estão eles, falando. Na tevê: antes, depois e no meio das novelas. Dia desses sonhei conversando com o meu candidato. E confesso que já estou com saudade da campanha eleitoral que está acabando hoje — sexta-feira, 28.

São 19h30. Quero aproveitar tudo da propaganda na tevê. Cada informação, cada declaração. Ah, e eu não posso perder as últimas invocações ao Ser supremo (nada a ver com aquele sediado em Brasília). Porque — “nunca antes numa campanha” — Deus esteve acima de tudo e de todos. Ainda bem que Ele está lá em cima, não é mesmo? Sem contato direto com os candidatos aqui embaixo. É que — nessa confusão polarizada — a coisa não tá pra qualquer santinho não.

Depois dessa eleição, só daqui a dois anos. Se Deus quiser! E Ele vai querer, sim, porque — querendo ou não — já é personagem dessa comédia há um bom tempo.

Foram dias ricos de teatralização: lágrimas, olhares e sorrisos carinhosos, acenos com uma ou as duas mãos. E “vozes” prometendo mundos e fundos. 

A campanha eleitoral é tudo de bom. E, diferente da poesia do coletivo, é todo mundo “junto e separado”. Mesmo assim, como diz o roqueiro, “A gente se dá bem e não desejamos mal a quase ninguém”. Isso é que é sinceridade, atitude rara na política.

Nesta campanha, o Oscar vai para a dupla “falar/dizer”: Tu falaste. Eu não disse. Eles dizem que falaram. Está dizendo que vai falar. Por que você não fala e diz a verdade?

E, assim, a política se faz e se refaz com o espírito expressivo da palavra. Falar é dizer. Dizer o que é, o que não é. Porque “falar” é a cara dos políticos, não é verdade? E tem tudo a ver com o sentido enigmático da promessa e a roupa fantasiosa da esperança. Falar é cantar como vai ser o samba do nosso destino, dizer que vão pintar um novo céu com o azul da bandeira. Coisas da cena política, como dizia meu pai.

Mas “falar ou dizer” nem sempre significa “afirmar”. Muitas vezes é apenas falar, apenas dizer. O não-dito esconde uma mentira; o dito pode ser calúnia, injúria. Entre um e outro, “fico com a resposta das crianças”. Mas crianças não votam! Ah, que pena! Então, esquece.  

Na letra do samba-enredo político, o destaque da campanha foram (e sempre serão) os pobres. “Olha eles aí, gente!” Sem os pobres, a disputa não teria a graça de sempre. Nunca os pobrezinhos foram tão prestigiados. Abraços e mais abraços. Beijos nos velhinhos e nas criancinhas.

Empobrerados, tiveram espaço e voz em todos os momentos. Nunca vi tanto pobre falando na tevê. Acho até que alguns ganham um cachêzinho. Isso não é chiquérrimo?! E necessário, porque quanto mais pobres na roça, melhor a colheita.

Nessa enxurrada de pobres, todos são bem-vindos: os antigos, os novos, os que ainda vão entrar nas estatísticas. De sua história, o ponto positivo é que eles acreditam piamente nas promessas. 

Sempre achei que o pobre é um ser diferenciado. Mesmo com a mesa e o bolso vazios, não perde a esperança. E olha que essa palavrinha mágica cai bem na barriga do faminto, do sem-teto, do sem-nada. E nas intenções dos candidatos.

Que tal uma vezinha para a fome? Porque pobre e fome dão samba. Aonde um vai, o outro vai atrás. A fome alimentou a campanha e esquentou o debate. Porque é com a fome de muitos que enchem suas sacolas.

Tão antiga quanto a fome e os pobres é a política do “pão e circo”, ainda viva nestes tempos paradoxais. Enquanto a fome sobrevive, os pobres sofrem para sair do gueto da vergonha nacional.

Outra coisa extremamente pobre nesta campanha é que tudo pode e tudo serve. Amigos trocando insultos nas redes sociais. Muita gente acordando com essa ansiedade de compartilhar o último post de cunho político-ofensivo. Frases de efeito para atingir o outro. Material quentinho, cozido nos porões da campanha, é repassado a cada hora. Isso porque cada um acha que o seu candidato é o mais santo, o menos corrupto — se é que isso existe. E, nesse fluxo, o outro sempre é isso e aquilo.

A campanha revela quem são os parceiro da hora. Aliados do bem e do mal. Porque são a prova de que reconciliação e paz é possível na política. Mesmo que isso possa parecer uma grande farra.

E, para coroar a festa da democracia, o debate. Só acho que esse capítulo deveria ficar nos intervalos da novela. Porque há momentos em que ficção e realidade parecem falar a mesma língua, pois a política também é uma “travessia”.

22h45. Preciso parar por aqui, pois o debate já vai começar. Não sem antes dizer que já estou pensando na campanha de 2024.

9 respostas em “O voto e a saudade”

gratidão pela crônica meu
caro elói e meus parabéns

tu és um magno cronista
porque autor inteligente
escreves sem os sofismas
que faz últil a subgente
a leitura da gente qualifica
como pão que me alimente

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